Economia

Fundos exclusivos de medalhões do governo FH chegaram a render mais de 30% no ano passado

Ex-membros da equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso comandam hoje R$ 25,2 bilhões em recursos

Arminio Fraga, da Gávea Investimentos, está no time dos grandes nomes da economia com fundos que ofereceram alta rentabilidade em 2012
Foto: Fábio Rossi/05-10-2011
Arminio Fraga, da Gávea Investimentos, está no time dos grandes nomes da economia com fundos que ofereceram alta rentabilidade em 2012 Foto: Fábio Rossi/05-10-2011

RIO – Eles deixaram o governo há mais ou menos dez anos, quando o PT ascendeu ao poder em 2003 e, um a um, se afastaram de suas funções no Banco Central (BC) e ministérios. Com um estilo casual e “low profile”, abriram gestoras de recursos entre Rio e São Paulo e, em pouco tempo, conseguiram atrair clientes endinheirados, insatisfeitos com seus resultados em grandes bancos e dispostos a aplicar bem mais de R$ 100 mil. São nomes como Arminio Fraga, da Gávea Investimentos; Gustavo Franco, da Rio Bravo; Luiz Carlos Mendonça de Barros, da Quest Investimentos; e Luiz Fernando Figueiredo, da Mauá Sekular. Depois de uma década longe do poder, os ex-membros do governo Fernando Henrique Cardoso comandam atualmente R$ 25,2 bilhões em recursos. E mostram, ano a ano, que não apenas de nome, mas também de resultados vivem suas gestoras.

Num ano marcado pela queda dos juros básicos, a Taxa Selic, e de fraco desempenho da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), as butiques financeiras comandadas pelos conhecidos nomes do mercado conseguiram arrancar desempenhos invejáveis de seus fundos de investimento, principalmente os de ações e multimercados (que investem em diferentes ativos, como Bolsa, câmbio e juros). Os desempenhos chegaram mesmo a superar os 30% no ano, o que representa seis anos de rendimento da caderneta de poupança.

Fundada pelo ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, a Gávea Investimentos, por exemplo, conseguiu no ano passado um retorno de 33,59% no fundo Gávea Ações, um dos melhores desempenhos do mercado. O Ibovespa, índice de referência da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), apresentou uma alta bem menor no período, de 7,40%. Ex-economista do banco Garantia e operador do megainvestidor internacional George Soros, Arminio era um nome conhecido no mercado antes de entrar no governo. A Gávea surgiu, no entanto, em agosto de 2003, no Leblon, após quatro anos do economista na autoridade monetária. Hoje a Gávea tem sob gestão um patrimônio de R$ 13,9 bilhões e conta com a presença do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em seu conselho consultivo. Em 2010, a Gávea atraiu o interesse do Highbridge Capital Management, empresa de gestão do gigante americano J.P.Morgan, que adquiriu seu controle.

No comando do fundo de ações da boutique, está Thomás de Mello e Souza, ex-dono da gestora paulista Águasclaras, adquirida pela Gávea em 2011. Segundo ele, o bom retorno está ligado ao desempenho de ações de empresas como Klabin, Suzano, Auto Metal e Arteris (antiga OHL), selecionadas a dedo pela equipe de analistas, que classifica como pequena, mas experiente.

— Os investidores precisam entender que o Ibovespa não é a Bolsa. O Índice não reflete o Brasil que está dando certo por causa do peso de ações de Petrobras e outras empresas que sofrem com a interferência governamental, além do cenário internacional. Por isso, fundos ativos, com o nosso, que não busca acompanhar o desempenho do Ibovespa, acabam tendo um desempenho melhor — afirma Mello e Souza.

Na Gávea, o processo de investimento que caracteriza a gestão dos fundos multimercado e de private equity é conduzido por Arminio e Luiz Henrique Fraga, primo de Arminio, além das equipes. Nos fundos de ação, a escolha dos papéis – o chamado “stock picking”, em inglês – é delegado para o gestor do fundo, que fica sediado em São Paulo. Mas com outros economistas da Gávea, Arminio contribui na avaliação dos cenários macroeconômicos que baseiam os fundos.

— Em ações, ele delega. A gente troca ideia em cenários, questões macros. É um valor enorme essa troca e ter ele ao lado afirma o gestor.

Outra butique que saiu-se bem no ano passado foi a Quest Investimentos, capitaneada pelo economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações. Na gestora paulista, o fundo Quest Ações, conhecido no mercado pela consistência de resultados, acumulou um ganho de 20,44% no ano passado. Outro fundo da gestora, voltado para ações menos negociadas na Bolsa – as chamadas small cap – rendeu 48% em 2012. O fundo foi beneficiado pela alta de ações como Metal Leve, Kroton e Arteris. O gestor do Questa Ações, Alexandre Silvério, diz que a estratégia da gestora é analisar a fundo as empresas e seus resultados antes de comprar as ações. E que o contato direto com os empresários é uma vantagem.

— Temos uma equipe de cinco analistas com contato constante com empresas, consultores, autoridades, fornecedores de empresas, clientes — diz Silvério. — No cenário macroeconômico, temos o privilégio de termos um economista com vivência de mercado e vida pública, o que é um diferencial. Em 2011, isso foi importante para a leitura sobre a piora da crise europeia, o que passava inclusive por uma percepção da situação política. A escola das empresas, claro, passa pela profundo conhecimento das empresas e leva em conta como enxergamos o mundo e a economia. E a ajuda do LC é bem importante.

Um papel semelhante tem o ex-presidente do BC, Gustavo Franco, em sua Rio Bravo Investimentos, sediada em São Paulo e com escritório no Rio. Diretor de renda variável da gestora há quatro anos, Rafael Rodrigues diz que três apostas certeiras foram responsáveis pela valorização de 32,79% do fundo Rio Bravo Fundamental no ano passado: as ações da Valid (fabricante de documentos e chips), M.Dias Branco (alimentos) e Randon (fabricante de reboques e semi-reboques).

— Nós avaliamos as ações empresas de baixo para cima, ou seja, começamos avaliando os ativos das empresas e vamos abrindo o escopo para informações macroeconômicas — explica Rodrigues.

Na Rio Bravo, as decisões de compra e venda de ações são influenciadas por uma reunião semanal que os sócios chamam de “reunião estratégica”. Os gestores se reúnem para discutir suas apostas. Gustavo Franco não costuma “dar pitacos” sobre as melhores ações. Prefere discutir o cenário macroeconômico: juros, inflação, câmbio.

— Se estamos avaliando comprar ações de uma empresa que tenha um componente importante de exportação e ele tem visão positiva no câmbio, isso pode nos levar a ir a diante — explica Rodrigues.

Em comum, esses três fundos da Gávea, Rio Bravo e Quest têm elevado risco, o que é inevitável na renda variável. Quando aplicam nesses fundos, os investidores passam a deter cotas deles. Essas cotas podem perder valor, de acordo com o nível de acerto dos gestores. Também podem, no entanto, se valorizar e gerar ganhos. Essa relação entre o risco e retorno compensou em 2012. Em 2011, muitos fundos fecharam no vermelho. Por isso, especialistas em finanças sugerem aos investidores conhecerem a própria tolerância a perdas antes de investir.

Na Mauá Sekular, do ex-diretor de política monetária do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, o fundo Mauá Orion rendeu 24,70% no ano passado. Isso significa um desempenho de 294% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), uma das referências usadas pelo mercado para o resultado de aplicações financeiras. Neste caso, no entanto, a aplicação tem um perfil de investimento diferente da Gávea e Quest, ainda que também de elevado risco. Segundo Raphael Calil, sócio da área comercial da gestora, o fundo aproveita-se de “situações especiais” do mercado, como fechamentos de capital de empresas ou emissão de debêntures conversíveis em ação.

Logo no começo do ano, por exemplo, o fundo Mauá Orion participou do fechamento de capital da Confab, uma fabricante de tubos de aço soldados para a indústria energética brasileira. Segundo Calil, o fundo tinha ações da Confab e conseguiu convencer os controladores a fechar o capital da Bolsa, ou seja, tirá-la da Bolsa comprando as ações que pertenciam ao fundo e dos outros pequenos investidores. Na gestora, Luiz Fernando Figueiredo é responsável pela gestão macro e de renda variável.

— O Orion tem foco no lado microeconômico. É um fundo que olha para a árvore, e não para a floresta. Mas a perspectiva macro aguçada permite imputes. E ter uma pessoa com experiência longa de mercado, que conhece os presidentes das empresas é um fator importante. Isso ajuda a perceber que uma companhia vai fechar capital, antes de acontecer. Não é, claro, insider (informação privilegiada), mas deduzir dos contatos o que vai acontecer — diz Calil.