01/07/2013 14h34 - Atualizado em 01/07/2013 14h34

Cresce número de estrangeiros em cursos de português no Rio

Demanda é grande por conta dos estrangeiros da indústria de óleo e gás.
Empresas oferecem o ensino do idioma a seus profissionais expatriados.

Lilian QuainoDo G1, no Rio

Alunos estrangeiros do curso Plan num passeio à Pedra Bonita (Foto: Divulgação/Curso Plan)Alunos estrangeiros do curso Plan num passeio à Pedra Bonita (Foto: Divulgação/Curso Plan)

O apagão de mão de obra, citado por diferentes segmentos da indústria, tem levado as empresas à importação de profissionais estrangeiros, situação que, por sua vez, impacta outra ponta dessa cadeia produtiva: a demanda por aulas de português para estrangeiros aumenta, exigindo cada vez mais professores para ensinar aos expatriados o idioma português e o modo de vida brasileiro.

Ângela Branco, diretora do Plan Idiomas Direcionados, curso criado em 1986 direcionado para o segmento profissional corporativo, afirma que tem 15 vagas para professores de português par estrangeiros para preencher. O curso tem mais de 500 alunos estrangeiros aprendendo português e 50 professores, uma média de 10 alunos por professor. No total, incluindo outros idiomas, o curso tem 120 professores.

Segundo Ângela, em dez anos a demanda pelo curso de português para estrangeiros aumentou mais de 100% e o nosso idioma é hoje o segundo mais procurado na empresa.

“Atualmente português é o segundo idioma mais procurado, perdendo apenas para o inglês, o idioma universal do mundo dos negócios. Essa grande demanda é resultado da grande demanda de mão de obra qualificada. As empresa, quando contratam o profissional estrangeiro,  oferecem no pacote de benefícios o ensino do idioma para ele e sua família”, diz Ângela.

Segundo a diretora, o professor de português para estrangeiros tem que ter flexibilidade de horários, porque as aulas são individuas, na empresa ou na casa do profissional. E também tem que personalizar as aulas, respeitando as diferenças culturais do aluno.

“Português representava 10%, no máximo, 15% da nossa procura. Hoje é o segundo. Com o crescimento da demanda, passamos a ter dificuldade de preencher nossa necessidade de profissionais porque exigimos que tenham qualificação técnica, e damos preferência por que tem experiência em lidar com adultos”, explicou.

Os estrangeiros acham tudo no Rio muito caro e as esposas sempre pedem dicas de lugares para fazerem compras mais em conta"
Ângela Branco

Ela ressalta que o professor tem que ter bagagem cultural grande, pois não vai apenas ensinar o idioma, mas ambientar os estrangeiros na cultura brasileira considerando as diferenças culturais.

Segundo disse, os alunos são na maioria da América do Sul (Venezuela, Colômbia e Argentina), americanos, ingleses, asiáticos e africanos.

“É bem variado. Temos duas áreas de ensino: português para hispânicos e para anglo-saxões, com desenvolvimento diferenciado”, explicou.

Ela explica que, em geral, as empresas contratantes oferecem ao profissional aulas de português que vão de 70 a 200 horas. Com 70 horas, o aluno já consegue se comunicar e interagir.

O curso oferece aulas de vivência do idioma, em que o professor acompanha o aluno, ou a aluna, em situações do dia a dia.

“As esposas dos profissionais adoram ir à Saara para comprar mais barato.Em geral, os estrangeiros acham tudo no Rio muito caro e as esposas sempre pedem dicas de lugares para fazerem compras mais em conta”, conta Ângela.

Para ela, que tem entre seus clientes empresas como Schlumberger, Chevron, Texaco, Glaxo, Petrobras, Sheraton, Marriott  e Windsor, o boom do português para estrangeiros é a grande oportunidade para os profissionais qualificados.

“Antes, só restava seguir a carreira acadêmica, no estado ou o município. Hoje o professor pode preencher 100% de seu horário ensinando português para estrangeiros. E a tendência é aumentar nos próximos anos, pela demanda da área de petróleo e gás. Vai ter um fluxo muito grande de estrangeiros”, disse.

Língua complexa
O gerente de Marketing do Berlitz Brasil, Luis Simões, também registrou aumento na demanda por aulas de português. De 2011 para 2012, a procura cresceu 40%, e, segundo disse, deve dobrar em 2013.

“O português para estrangeiros já é o segundo idioma mais ensinado no Berlitz entre os mais de 40 lecionados nas nossas unidades no Brasil, passando à frente do espanhol e do francês e ficando atrás apenas do Inglês. Em 2012, o ensino de português para estrangeiros representou cerca de 26 mil aulas no Brasil, superando as 18 mil lecionadas nos Estados Unidos”, disse o executivo.

Segundo Luis Simões, o português, de forma geral, é uma língua complexa devido a todas as variáveis em acentuação, pontuação, pronomes e tempos verbais.

“Mas a natureza comunicativa da nossa metodologia facilita o aprendizado para a utilização do idioma em situações cotidianas e da vida real. Os alunos que falam espanhol, obviamente, apresentam uma dificuldade menor de aprendizado, mas, no geral, todos obtêm os mesmos bons resultados”, disse.

O gerente afirmou que no momento o curso não vivencia a falta de professores.

“O Berlitz possui professores treinados em sua própria metodologia de mais de 135 anos para o ensino de português para estrangeiros da mesma forma que para o ensino de outros idiomas. Todos passam por um detalhado processo de seleção, treinamento e avaliação para que iniciem suas atividades conosco. São profissionais diferenciados, com experiência em suas carreiras e também de vivência no exterior”, disse.

Curso à distância
Carolina Almeida, dona do Quiz Languages, que também atende ao mercado corporativo, confirmou o aumento da demanda por curso de português para estrangeiros: em quatro anos, a procura aumentou 70%. Em seu site, o curso anuncia vagas para professores.

Ela anunciou para ainda este ano o lançamento da plataforma online de seu curso de português para estrangeiros para aprendizado à distância. Segundo disse, são videoaulas com bateria de exercícios e fóruns semanais para tirar dúvidas. Desse modo, quando o profissional estrangeiro chegar ao Brasil, já terá uma noção básica do idioma.

O curso atende a 22 multinacionais, entre elas a Wärtsilä, empresa de origem finlandesa de fornecimento de motores, prestação de serviços para navios e usinas termeléricas, e de equipamentos e soluções de energia para embarcações e aplicações offshore. A empresa, no Rio, tem no momento 18 estrangeiros, que aprendem português no curso de Carolina.

Funcionários estrangeiros da Wärtsilä (Foto: Lilian Quaino/G1)Trinadha Rao, Santeri Lähdesmäki, Carolina Almeida, Timothy Braganza e Christie Rodrigues
(Foto: Lilian Quaino/G1)

"Tranquilo; demorô"
Os indianos Timothy Braganza, Christie Rodrigues, e Trinadha Rao, juntamente com o finlandês Santeri Lähdesmäki são alguns dos funcionários que estão tendo aulas de português há poucos meses. Por conta de avós naturais de Goa, antiga colônia portuguesa na Índia, Timothy e Christie conhecem algumas palavras em português, mas Trinadha jamais tivera contato com o idioma.  Já Santeri, aluno dedicado, comprou um dicionário fonético para treinar e tem boa fluência.

Para todos, a grande dificuldade é a conjugação de verbos e os gêneros de objetos – eles têm dificuldades de diferenciar objetos masculinos e femininos. E, para Carolina, um desafio: fazê-los pronunciar o ão.

“Os sons nasais são muito difíceis para eles, mas vamos conseguir”, disse.

Timothy, engenheiro de manutenção, depois de uma temporada num hotel, de onde pouco saiu porque, segundo disse, lhe diziam que era muito perigoso sair às ruas, resolveu encarar o idioma de frente e foi morar numa casa em Icaraí, Niterói, na Região Metropolitana do Rio, para conhecer gente e soltar a língua. Mas nem sempre dá certo porque os vizinhos querem treinar o inglês com ele. A mulher de Timothy chega em outubro.

Já Christie, engenheiro de propulsão, assim como Trinadha, também da área de manutenção, mora no Bairro de Fátima, região central do Rio, e se esforça para se comunicar com muita simpatia. A família de Trinadha chega em 2014. O finlandês Santeri, gerente de estratégia, mora no Arpoador, em Ipanema, Zona Sul do Rio.

Com exceção de Trinadha, os demais acham que em seis meses estarão dominando o básico do idioma. Humilde, Trinadha acha que precisa de um ano para entender a nossa língua.

As diferenças culturais são tema de boas risadas. Santeri, como muitos estrangeiros, está tendo que aprender a conviver com a impontualidade dos cariocas. Um compromisso marcado para as 19h certamente acontecerá às 21h30, brinca ele.

“Carioca está sempre atrasado”, disse.

Para Christie, o que mais chama a atenção é a gesticulação dos cariocas.

“Eles falam: ‘tranquilo’ ou ‘demorô’ e fazem sinal de positivo, dão tapinhas nas costas”, conta.

Timothy fica espantado com os arroubos dos casais de namorados nas ruas.

“Eles abraçam e beijam durante muito tempo. Não sei como conseguem se controlar”, diz ele rindo.

Trinadha concorda: em sua terra não é comum abraços em público.

Mas uma unanimidade: todos adoram guaraná e arroz com feijão. Outro ponto em comum a todos: eles elogiam a amizade e a solicitude do povo carioca.

PUC tem pós-gradução
A Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) tem o único curso de pós-graduação em formação de professores de português para estrangeiros no Brasil, informa Adriana Albuquerque, uma das coordenadoras do curso, autora do livro “Português para estrangeiros: questões interculturais”, em parceria com a também coordenadora do curso Rosa Marina de Brito Meyer.

Assim como os cursos de português para estrangeiros ressaltam o aumento no número de alunos, também a pós-graduação na área tem atraído muitos candidatos.

Segundo Adriana, foi aberta uma turma em 2012 com 22 alunos e não havia planos para abrir outra este ano. Mas ela diz ter recebido tantos e-mails pedindo o curso que resolveu abrir uma nova turma com início em agosto e já tem 38 inscritos.

Não só os formados saem empregados como também são recrutados para ocuparem vagas no exterior.

“Estamos selecionando um professor para ir para a China. Timor Leste e Macau sempre procuram professores de português brasileiro. O Brasil tem centros culturais no mundo todo e o Itamaraty sempre seleciona professores”, explica ela, ressaltando o amplo campo de trabalho para os formados.

Adriana diz que as dificuldades para o aprendizado do português pelos estrangeiros são diferentes.

“Os hispânicos têm facilidade para se expressar, mas ficam no portunhol por muito tempo, pois a gramática é difícil. Alemães, holandeses finlandeses têm dificuldades de compreensão, mas vêm abertos para se adaptar a nossa cultura”, explicou.

E também existem as diferenças culturais, que o curso mostra para seus alunos. “Tem as questões de comportamento social como, por exemplo, o cliente chamar o garçon pelo nome, bater no ombro dele e até abraçá-lo. Para muitos estrangeiros, isso é inimaginável”, disse.

Segundo a professora, com base em sua prática com alunos estrangeiros de intercâmbio, em um mês já estão adaptados.

“Primeiro vem o deslumbramento com o Rio, depois o choque cultural, eles não entendem as nossas filas, mas na época de ir embora dizem que não vão se adaptar mais a seu país de origem”, conta ela.

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