Política

Barroso diz que julgamento do mensalão foi ‘ponto fora da curva’

Senado aprovou indicação do advogado para ser o 11º ministro do STF

Luis Roberto Barroso durante sua exposição na comissão do Senado entre Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidente da OAB, e o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB)
Foto: Ailton de Freitas / O Globo
Luis Roberto Barroso durante sua exposição na comissão do Senado entre Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidente da OAB, e o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) Foto: Ailton de Freitas / O Globo

BRASÍLIA — O Senado aprovou ontem, por 59 votos a 6, a indicação do advogado Luís Roberto Barroso para uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele substituirá no Supremo o ex-presidente Carlos Ayres Britto, que se aposentou em 2012. Na sabatina que enfrentou na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Barroso disse que o Supremo foi muito duro no julgamento do mensalão. Chegou a afirmar que foi um “ponto fora da curva” em relação aos julgamentos anteriores da Corte. Barroso disse que não vai se considerar impedido de votar no julgamento dos recursos do mensalão.

— Em 2012, pesquisei precedentes do STF em matéria de corrupção e lavagem de dinheiro. Pensei que fosse chegar à conclusão de que o Supremo endureceu em matéria penal. Mas cheguei a posição tradicionalmente garantista. Endureceu no caso do mensalão. O mensalão foi um ponto fora da curva. Não houve um endurecimento geral, mas, naquele caso específico, sim — disse Barroso.

Depois, em entrevista, o novo ministro do STF voltou a tocar no assunto:

— O Supremo teve uma posição mais dura em matéria penal no mensalão. Em outros casos, o tribunal foi mais libertário e garantista.

Depois de dizer que não se sente impedido de julgar os recursos do mensalão, Barroso afirmou que não podia falar de detalhes do processo porque ainda não estudou os autos.

— Nesse processo, vou começar do zero — afirmou ele.

Barroso disse, ainda, que sua importância no julgamento dos embargos será de menor relevância que a do ministro Teori Zavascki.

— Quem vai fazer a diferença é o ministro Teori Zavascki. E não eu. As questões pendentes estão 5 a 4. Eu só voto se ele empatar. Terei a responsabilidade de desempatar. Mas, se ele não empatar e aderir à posição majoritária, minha participação não fará diferença alguma — disse Barroso.

Na verdade, Barroso, como ministro menos antigo no STF, terá que votar antes de Teori.

— Não me sinto impedido de votar. Não tenho opinião formada. A questão processual desses casos envolve embargo infringente, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Preciso ter conhecimento desses três temas. Vou estudar as questões. Com minha consciência, sei que não terei como agradar a todos. Há divergências sobre a matéria — disse Barroso, que afirmou não ser pautado por ninguém.

A cobrança sobre a posição do sabatinado sobre o processo do mensalão veio da oposição. O senador tucano Álvaro Dias (PR) foi o primeiro:

— Gostaria que o senhor desse aqui uma prévia de como será sua atuação no mensalão. É porque o senhor já entendeu que o Supremo endureceu neste julgamento se comparado com outros. Pergunto isso porque o ministro Dias Toffolli, quando foi sabatinado aqui, nos garantiu que iria se considerar impedido no caso do mensalão. E não foi isso que vimos.

— Sou advogado feliz e realizado. Sou muito feliz onde estava. Não preciso sair de onde estava para fazer mau papel em lugar nenhum. Portanto, vou fazer o que acho certo. O que meu coração me disser que é certo. Ninguém me pauta. Nem governo, nem imprensa, nem opinião pública, nem acusados. Farei o que achar certo — disse Barroso.

Em seu discurso inicial, Barroso disse também que o Judiciário não deve se sobrepor a uma lei aprovada pelo Congresso:

— Quando o Legislativo toma uma decisão política, edita uma lei, como nos casos de pesquisa de células-tronco e ação afirmativa para vagas nas universidades, o papel do Judiciário é ser deferente com essa decisão. Neste caso, o Judiciário não pode e nem deve se sobrepor à decisão política, que cabe a quem foi eleito. Agora, se não há lei sobre um assunto, mas há problemas no mundo real, como caso da greve do serviço público, precisam ser remediados. Então, o STF precisou decidir estabelecendo critérios na lei que rege a greve do setor privado, até o Congresso legislar.

Barroso completou:

— Quando o Legislativo atua, o Judiciário deve recuar, a menos que haja afronta evidente à Constituição, que é a exceção, nunca é a regra. Quando o Legislativo não atua, mas existem interesses em jogo, o Judiciário deve atuar.

Na sabatina, Barroso afirmou que é a favor do aborto no caso de anencefalia, caso que passou pelo STF. Ele foi muito elogiado por todos, e encerrou a sabatina emocionado, com os olhos cheios de lágrimas e aplaudido por todos.

— Vossa Senhoria me obriga a fazer algo que não costumo fazer nesta tribuna: reconhecer que, desta vez, a presidenta Dilma acertou — confessou o tucano Aécio Neves (PSDB-MG).

O único momento de constrangimento foi no plenário. O senador Magno Malta (PR-ES) protestou pelas manifestações do futuro ministro sobre redução da maioridade penal e aborto.

— Ele vai para um tribunal superior e depois daquele tribunal só tem Deus — disse Malta.