Economia

Editorial do ‘Financial Times’ diz que escolha de brasileiro para a OMC ‘não parece promissora’

Jornal britânico questiona se Roberto Azevêdo pensará por conta própria e diz que Brasil deu passos rumo ao protecionismo

O brasileiro Roberto Azevêdo conquistou o apoio da maioria dos membros do OMC, mas não do ‘FT’
Foto: FABRICE COFFRINI/AFP
O brasileiro Roberto Azevêdo conquistou o apoio da maioria dos membros do OMC, mas não do ‘FT’ Foto: FABRICE COFFRINI/AFP

RIO - O editorial do jornal britânico “Financial Times” publicado nesta quinta-feira questionou e criticou a escolha de Roberto Azevêdo para o posto mais alto da Organização Mundial do Comércio (OMC). O texto destaca que a vitória foi um reconhecimento do trabalho da diplomacia brasileira em tentar firmar a reputação do Brasil como mediador internacional. A escolha de Azevêdo veio em sequência da de outro brasileiro, José Graziano da Silva, para o cargo de diretor geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês).

O “FT” questiona, no entanto, se a escolha de Azevêdo poderá efetivamente fazer com que a OMC recupere a influência que já teve no mundo. Vale lembrar que União Europeia e Estados Unidos adotam na OMC uma postura protecionista quanto à agricultura e concedem amplos subsídios ao campo, posição combatida por países emergentes como o Brasil. O Reino Unido foi apontado como um dos países que não só votou no candidato mexicano, Herminio Blanco, que concorria pela vaga com Azevêdo, como fez campanha contra o brasileiro. A publicação chega a criticar o resultado da disputa:

“À primeira vista, o posicionamento de um brasileiro no comando da OMC não parece promissor”, diz o editorial.

Para o jornal, o Mercosul falhou em seus objetivos. E o fato de o Brasil ter recorrido à OMC contra países que adotaram políticas de afrouxamento monetário, segundo o “FT”, configuraria um passo rumo ao protecionismo. O jornal diz que Azevêdo terá a missão de provar que “pensa por conta própria”. O forte apoio que ele possui entre os países em desenvolvimento, que ajudaram a elegê-lo, no entanto, tornaria Azevêdo a pessoa apropriada para lidar com as divisões Norte-Sul que impediram tantos acordos multilaterais, reconhece o jornal.

Hoje, a organização continua a ter seu papel de monitorar acordos comerciais e disputas arbitrais reconhecido e respeitado, mas os desentendimentos profundos entre nações sobre temas-chave do comércio internacional mostram que o organismo tem falhado em ser ambiente de negociação de acordos multilaterais. A Rodada de Doha, que foi lançada em 2001 e não concluída, por exemplo, está praticamente morta.

Segundo o texto, a OMC se mostra omissa justo quando a economia global precisa de sua administração. O comércio mundial cresceu apenas 2% em 2012, a segunda pior performance desde que os registros começaram a ser feitos em 1981, abaixo do crescimento econômico mundial. E a ameaça do protecionismo cresce, lembra o “Financial Times”. Mais economias estão recorrendo a acordos bilaterais e plurilaterais.

Para o “FT”, Roberto Azevêdo terá de ser pragmático, começar com pacotes menos ambiciosos para facilitar o comércio global e ter “mente aberta” para lidar com acordos bilaterais, que podem ser “plataformas eficientes para construir acordos multilaterais”, postura que iria ao encontro dos interesses dos países desenvolvidos.

O primeiro teste de Azevêdo, segundo o “FT” será a conferência da OMC, marcada para dezembro em Bali. Uma falha nessa negociação poderia lançar sérias dúvidas sobre o futuro da OMC como órgão negociador.