BRASÍLIA - Após se reunir com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Thomas Shannon, lamentou a publicação das reportagens do GLOBO - que revelam que o país monitorou milhões de telefonemas e e-mails de cidadãos brasileiros -, mas afirmou que os EUA continuarão colaborando com o Brasil na área de Inteligência. A Comissão de Relações Exteriores do Senado se reuniu extraordinariamente nesta terça-feira para votar requerimentos convocando o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, e o embaixador. Ele se recusou, no entanto, a responder se havia ou não espionagem dos EUA no Brasil. Quando foi indagado sobre o assunto, entrou no carro oficial.
- Estamos respondendo as preocupações do governo do Brasil. Temos um excelente nível de cooperação com o Brasil na área de inteligência e também na área policial. Infelizmente os artigos do GLOBO apresentaram uma imagem de nosso programa que não é correta. Então, estamos trabalhando com os brasileiros para responder suas perguntas. Mas agradeço muito a colaboração do governo do Brasil e vamos seguir trabalhando com ele - disse o embaixador.
Shannon seguiu para reunião com o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, José Elito, onde ficou por 30 minutos e saiu sem dar entrevista. No domingo, à tarde, o embaixador já havia se reunido com a secretaria-geral do Itamaraty. Os senadores pedem explicações sobre uma base dos Estados Unidos de espionagem por satélite, em Brasília, revelada pelo O GLOBO.
Segundo documentos vazados pelo ex-agente da CIA Edward Snowden, equipes da Agência de Segurança Nacional (NSA, sigla em inglês) e da Agência Central de Inteligência (CIA) trabalharam em conjunto na capital federal coletando informações. Nesta segunda-feira, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que abriu investigação sobre o caso.
Após a reunião com Shannon, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, disse que o embaixador dos EUA no Brasil ,Thomas Shannon, negou que tenha havido espionagem no Brasil, a participação de empresas brasileiras na coleta de dados e o funcionamento de uma central em Brasília. Segundo Bernardo, o embaixador admitiu apenas que os Estados Unidos fazem um monitoramento de metadados, mas não no Brasil.
Em declarações, o ministro ressaltou que o Brasil tem boas relações com os EUA há mais de 200 anos, mas que isso não o impede de pedir explicações. De acordo com Bernardo, Shannon afirmou que considera a reportagem do O GLOBO “sensacionalizada” e que haveria um exagero na abordagem do tema.
Ao defender a necessidade de investigação, Paulo Bernardo disse que ainda não tem respostas e que isso será tarefa da Anatel e da Polícia Federal. Indagado se um contato telefônico ou por internet com o Brasil com os Estados Unidos seria monitorado pela rede de inteligência americana, ele disse:
- Eu chego à conclusão que sim.
O ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, também mostrou preocupação com as denúncias de espionagem americana. Em ação conjunta com o Ministério das Comunicações, o órgão vai interpelar as empresas de tecnologia que atuam no país, como Google e Facebook. Medidas para garantir mais segurança ao tráfego de dados também estão em estudo.
- Temos empresas internacionais que operam aqui, como o Google e o Facebook. Isso preocupa - afirmou Raupp, durante almoço nesta segunda-feira, na sede da Firjan.
A Embaixada dos Estados Unidos em Brasília informou, na manhã desta segunda-feira, que aguarda uma posição de Washington antes de tratar sobre o monitoramento de comunicações eletrônicas e telefônicas no Brasil.
Os senadores Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores, e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) também apresentaram requerimentos para convocação do ministro José Elito Siqueira (Gabinete de Segurança Institucional) e o diretor-geral da Abin, Roberto Trezza.
- Temos que debater a proteção do sigilo, do nosso sistema cibernético, a contratação dos satélites, tudo isso tem que ser discutido - disse Ferraço. - Com isso pretendemos obter as informações, saber das providências e até mesmo como o governo entende que a legislação precisa ser aperfeiçoada de modo a garantir a proteção do sigilo, intimidade, individualidade das pessoas físicas e jurídicas no Brasil.
O senador também cogita convidar o jornalista Glenn Greenwald, que recebeu os documentos secretos de Snowden. Nesta segunda-feira, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) informou que abriu investigação sobre o caso, com o objetivo de verificar se empresas violaram sigilos de dados e telefonemas. A agência irá cooperar com a Polícia Federal e demais órgãos do governo federal.
Os documentos a que O GLOBO teve acesso revelam que Brasília fez parte da rede de 16 bases dessa agência dedicadas a um programa de coleta de informações através de satélites de outros países. Um deles tem o título “Primary Fornsat Collection Operations” e destaca as bases da agência.
Há também um conjunto de documentos da NSA, de setembro de 2010, cuja leitura pode levar à conclusão de que escritórios da Embaixada do Brasil em Washington e da missão brasileira nas Nações Unidas, em Nova York, em algum momento teriam sido alvos da agência. Não foi possível confirmar a informação e nem se esse tipo de prática prossegue.
No domingo, O GLOBO mostrou que, na última década, a NSA espionou telefonemas e correspondência eletrônica de pessoas residentes ou em trânsito no Brasil, assim como empresas instaladas no país. Não há números precisos, mas em janeiro passado, por exemplo, o Brasil ficou pouco atrás dos Estados Unidos, que teve 2,3 bilhões de telefonemas e mensagens espionados. No mesmo dia, a presidente Dilma Rousseff se reuniu com seis ministros para discutir o tema.