Economia

Estudantes da USP criam sistema que reduz em 30% tempo de espera por mala em aeroportos

Projeto levou grupo à final de concurso mundial da fabricante de aviões Airbus
Imaginação. O professor Robinson Salata, com os estudantes da USP e seu invento: únicos representantes das Américas na final do concurso Foto: Marcos Alves
Imaginação. O professor Robinson Salata, com os estudantes da USP e seu invento: únicos representantes das Américas na final do concurso Foto: Marcos Alves

RIO — Eles têm entre 21 e 22 anos, gostam de ouvir música e são movidos pela ideologia de que podem contribuir para um mundo melhor. Até aí, não se diferenciam muito de outros jovens de sua geração. Mas o gosto pelos estudos, a mente fértil de ideias e a persistência fizeram a diferença. Marcos, Caio, Leonardo, Luis e Henrique são estudantes de Design da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP que desenvolveram um sistema rápido de carga e descarga para aviões, capaz de reduzir em 30% o tempo de espera dos passageiros nas esteiras de restituição de bagagens. O invento, que também reduz o esforço dos funcionários que trabalham colocando as malas nos porões das aeronaves, levou o grupo de jovens à final de um concorrido concurso da fabricante de aviões europeia Airbus, que busca promover soluções sustentáveis para a indústria da aviação. É a primeira vez que brasileiros estão na final.

O anúncio dos vencedores será no próximo dia 14, em evento em Paris, na sede da Unesco, que patrocina o concurso. Se ganharem, voltarão para o Brasil com € 30 mil no bolso, além de terem a oportunidade de fazer uma parceria com a Airbus para o desenvolvimento em escala comercial do produto que inventaram. Não há promessa para essa parceria no regulamento, mas desde que o concurso “Fly your ideas” (“Deixe suas ideias voarem”) começou, em 2009, a companhia já está trabalhando com duas universidades, uma americana e uma australiana, cujos estudantes chegaram à final do processo seletivo. Na edição de 2013, foram mais de cem equipes. O grupo de estudantes da USP, o único representante das Américas, disputa o primeiro lugar com mais quatro equipes de outros lugares do mundo.

A ideia de desenvolver o sistema surgiu durante uma disciplina do curso de Design. Os estudantes visitaram as instalações da Embraer e tiveram que produzir um trabalho que propusesse uma solução para algum problema do setor de aviação. Na pesquisa que fizeram, perceberam que os funcionários do setor de carga e descarga se queixavam constantemente de dores nas costas. Os empregados não apenas tinham de levantar peso, como também precisavam puxar ou empurrar malas dentro dos porões dos aviões agachados, uma vez que a distância entre o chão e o teto dos compartimentos de bagagens é pequena. Nos modelos A320, por exemplo, muito usados nas rotas domésticas brasileiras, a altura do porão é de apenas 1,5m e a profundidade é de 4m.

— Nós queríamos resolver esse problema, para melhorar as condições de trabalho dessas pessoas. E acabamos também conseguindo reduzir em 30% o tempo de carregamento e descarregamento de bagagens. Com isso, os passageiros esperam menos para reaver suas malas, e as empresas reduzem o tempo das aeronaves no solo, ganhando competitividade. É bom para todo mundo — diz Marcos Salvi Philipson, um dos estudantes que integra a equipe, batizada de “Levar”.

Malas deslizam no chão

O sistema bolado pelos alunos funciona assim: bolsões de ar instalados sob o piso do compartimento das bagagens são inflados ou desinflados fazendo com que a parte anterior ou posterior do porão se incline, como numa gangorra. Para encher o porão de malas, o funcionário dá o comando para inflar as bolsas de ar dianteiras, de modo que o chão se incline levemente para baixo — a inclinação é de menos de dois graus. Ele, então, acomoda as bagagens na porta do compartimento e as empurra com uma pá especial. Ao mesmo tempo ar comprimido começa a soprar por debaixo do piso. Como o piso é feito de um material de baixo atrito e é todo furadinho, as malas deslizam até o fim do porão como se estivessem plainando. É o mesmo princípio do hóquei de mesa. O movimento é repetido até que todo o porão seja preenchido. Para descarregar o avião, basta fazer o movimento inverso.

Os estudantes foram aprovados na disciplina e decidiram inscrever o projeto no concurso da Airbus no ano passado, quando leram sobre o evento na internet. Na segunda fase do concurso, um especialista da companhia auxiliou os universitários a ajustar o sistema para as reais demandas da indústria. A troca de informações faz parte do processo seletivo e tem por objetivo aprimorar as ideias originais dos aspirantes a cientistas. No Brasil, por exemplo, a Infraero vem exigindo das empresas aéreas desde 2012 que as malas sejam entregues em até 18 minutos nos voos internacionais e 12 minutos em operações domésticas, algo que nem sempre é cumprido. A exigência vale para aeroportos como Galeão (RJ) e Guarulhos (SP).

Redução no extravio da bagagem

De forma indireta, o projeto dos estudantes da USP também ajuda na redução do extravio de bagagens, pois as etiquetas seriam menos danificadas durante o manuseio. Danos no processo de carregamento das malas são uma das principais causas de extravio.

Os universitários, que estão cursando o quarto ano da faculdade de Design, também tiveram a orientação do professor Robinson Salata, responsável pela disciplina de projetos do curso, para a qual o sistema foi desenvolvido originalmente. Salata enfatiza o caráter multidisciplinar do curso, com noções de engenharia e economia, que deu aos alunos uma visão mais abrangente dos conceitos de Design. Os quatro concorrente da “Levar” na final do concurso são estudantes de engenharia.

Nesta semana, os brasileiros embarcam para Toulouse, sede da Airbus na França, onde apresentarão seu projeto a um júri de especialistas. De lá, seguem para Paris para acompanhar o anúncio da equipe vencedora.