Economia

BC do Japão diz que seus estímulos substituem os dos EUA

Programa de compra de ativos japonês 'começou a fazer efeito', segundo Haruhiko Kuroda

JACKSON HOLE, EUA - O programa de estímulo econômico japonês, apoiado na compra mensal US$ 70,9 bilhões em ativos, “começou a fazer efeito”, avaliou Haruhiko Kuroda, governador do Banco do Japão, o banco central do país, destacando que o Japão manterá a estratégia “enquanto continua se esforçando para manter a estabilidade do sistema financeiro global”. A avaliação foi feita no sábado, no último dia do simpósio anual de bancos centrais e economistas em Jackson Hole, nos Estados Unidos, onde prevaleceu o entendimento de que o Japão e o Reino Unido serão capazes de compensar os efeitos da retirada do programa de estímulo americano, que hoje injeta US$ 85 bilhões por mês na economia.

A perspectiva de redução de compra de títulos pelo Federal Reserve (Fed, BC dos EUA), que pode começar já em setembro, está levando à alta de juros futuros no país e atraindo para países desenvolvidos os capitais alocados em emergentes, o que leva à desvalorização das moedas e ameça a saúde financeira destes países, pondo em risco o equilíbrio da economia global.

O mesmo não deve se repetir no Japão e no Reino Unido, que pretendem manter os juros baixos e as injeções de liquidez no mercado, fornecendo o dinheiro “barato” que permite investimentos nas economias emergentes. Charlie Bean vice-governador do Banco da Inglaterra, o BC do país, afirmou em Jackson Hole que o compromisso de não elevar as taxas de juros até que o desemprego (hoje em 7,8%) caia para 7%, assumido pela instituição, deve limitar os rendimentos dos títulos e aumentar a confiança de consumidores e empresários. Neste mês, a autoridade monetária informou que sua expectativa é manter os juros no atual patamar, de 0,5%, até o fim de 2016. Sem elevação das taxas de juros e dos rendimentos, o país não passa a atrair os capitais que estão nos emergentes.

Controle do fluxo de capitais

A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, sugeriu que a manutenção das políticas monetárias de outras grandes economias pode equilibrar a redução das compras de títulos pelo Fed.

— Nós não acreditamos que todos os bancos centrais vão iniciar a saída das políticas monetárias não convencionais — afirmou Lagarde. — Há ainda muito a ser feito na Europa e no Japão.

O impacto da reversão das políticas monetárias das economias desenvolvidas nos emergentes e a desaceleração da atividade nestes países dominaram as preocupações no encontro. Estudo apresentado no evento enfatiza estas preocupações e defende que os emergentes devem desenvolver ferramentas para controlar fluxos de crédito. Caso contrário, ficarão dependentes das políticas monetárias das economias mais avançadas. “Políticas macroprudeciais são necessárias para restaurar a independência da política monetária para os países não-centrais”, escreveu Helene Rey, professora da London Business School.

Algumas autoridades dos EUA, contudo, preferiram destacar a responsabilidade dos emergentes no processo pelo qual passam agora, após anos recebendo grandes fluxos de capital — e se queixando do excesso de dinheiro injetado no mercado pelos países desenvolvidos.

— Não faremos política monetária baseada só na volatilidade dos emergentes — afirmou James Bullard, presidente do Fed de St. Louis, frisando que a economia americana é o objetivo primário da autoridade monetária dos EUA.

O representante do Brasil no simpósio de Jackson Hole, o diretor do BC Luiz Awazu Pereira da Silva, manifestou apoio à redução dos estímulos monetários pelo Fed, argumentando que o movimento seria positivo para o país por mostrar o fortalecimento da economia americana. O real é uma das moedas de emergentes que mais vem sofrendo com os saques dos investidores estrangeiros e, na semana passada, atingiu o menor patamar em quatro anos.

— A retirada da política monetária não convencional (dos EUA) era um processo previsível e aguardado há muito tempo — disse Pereira da Silva. — O intrigante é que apesar de toda a cuidadosa preparação, as coisas ficaram turbulentas.