Economia

‘Talvez devêssemos ter usado uma mão mais leve em 2011’, avalia Mantega

Ministro diz que, se adivinhasse que a crise europeia estava se agravando, não teria imposto um freio tão grande na economia

Mantega: com aperto fiscal, PIB ficou mais tempo negativo na Europa
Foto: FOTO: Givaldo Barbosa
Mantega: com aperto fiscal, PIB ficou mais tempo negativo na Europa Foto: FOTO: Givaldo Barbosa

BRASÍLIA — Num balanço inédito sobre os cinco anos da crise global, o ministro Guido Mantega, provocado, faz um “mea culpa” e admite que o agravamento da crise europeia acabou derrubando os índices de crescimento do país. Olhando em perspectiva, ele diz que, se pudesse fazer algo diferente, teria usado uma mão mais leve, não teria retirado em 2011 os estímulos adotados para combater a crise. Mas frisa que a preocupação era evitar que a inflação estourasse.

Qual o efeito pós-crise para o Brasil? A economia foi para o chão...

A economia não foi para o chão. A economia foi para o céu. Crescemos 7,5% (em 2010). A média de crescimento nesse período de cinco anos é 3,2%, mais que o México, mais que os Estados Unidos. Em cinco anos de crise, nos saímos muito bem. Podemos ter nos equivocado em algum aspecto. Nós fizemos uma recuperação rápida do consumo. O investimento demora mais. O consumo foi reativado e o crédito também. Portanto, o mercado voltou a funcionar. A partir disso, criamos um programa para reativar o investimento.

Mas o crescimento não foi sustentado...

Mas teve a crise em “W”. Teve uma recaída na crise. Criamos o programa Minha Casa Minha Vida em 2009. É um programa que movimenta a construção civil, cria emprego. Geramos, ao todo, 600 mil empregos naquele ano. Foi muito rápida a reação da economia. Em 2011, nós, deliberadamente, demos uma freada na economia porque havia uma inflação. E com inflação a gente não brinca. Tomamos as medidas devidas, com política fiscal apertada e política monetária apertada. Aumentamos o superávit primário e o Banco Central aumentou juros. Então, veio a recaída europeia. Podemos dizer que, talvez, não tenhamos feito a previsão adequada sobre a economia europeia. Mas, em 2011, crescemos 2,7%, depois de ter crescido 7,5%. Não é um mau resultado. E o mais importante: geramos quase dois milhões de empregos em 2011. E em 2012 também geramos mais de um milhão de empregos. No balanço, o desempenho da economia brasileira está muito bom.

Ainda assim, o que o senhor faria diferente?

Teria feito um aperto menor em 2011. Fizemos o aperto em 2011 supondo que a economia mundial já estava em recuperação. Em 2011 puxamos o freio, dizendo: a gente faz um ajuste e depois retoma. Só que, quando foi retomar, no segundo semestre de 2011, já tinha começado a crise europeia. A Grécia estava com problemas. Aí começaram a descobrir que os bancos europeus não estavam tão sólidos. Procuramos reverter. Mas perdemos um pouco ali talvez. Eu acho, pessoalmente, olhando para o retrovisor. Juntamos aperto fiscal e aperto monetário. Mas isso demonstra como priorizamos o controle da inflação. O governo não brinca com a inflação. Tem gente que fala que o governo Dilma começou com o Banco Central mais relaxado. O BC, no primeiro mês do governo Dilma, começou a subir juros. E, ainda no fim do governo Lula, as medidas macroprudenciais tiveram efeito que equivale a uma elevação da taxa de juros. Começou no fim do governo Lula, porque a economia estava se aquecendo demais. E o governo tem de fazer ajustes para cima ou para baixo, para, principalmente, não deixar que a inflação retorne.

Alguma medida seria diferente olhando para a história?

Fizemos uma política que a gente chama de anticíclica, dando estímulos à economia que ela não teria naturalmente. Se deixássemos a economia abandonada à sua própria sorte, teríamos elevadas taxas de desemprego, desindustrialização etc. Mas o governo foi ativo, liberou crédito, reduziu impostos, criou um programa habitacional muito forte, estimulou setores, investimento, consumo etc. Em função dessa estratégia, tivemos um desempenho melhor do que outros países. A Europa ficou seis trimestres consecutivos com taxas negativas porque escolheu uma trajetória de não dar estímulos e só fazer ajuste fiscal. Mas é claro que alguma coisa diferente poderíamos ter feito.

Por exemplo?

Em 2011, quando achamos que a crise já tinha passado, todos os países tinham ido bem em 2010 e o Brasil cresceu 7,5%. Então, fizemos um ajuste mais forte, um superávit (fiscal) mais forte e um ajuste monetário maior, o que desacelerou fortemente (a economia). Se eu soubesse que, no segundo semestre de 2011 teríamos a crise europeia eclodindo, talvez tivéssemos usado uma mão mais leve.

*Enviada especial