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Os três mosqueteiros de Marcelo Oliveira: um pacto pelo sucesso

Tico, Ageu e Juvenílson são os companheiros inseparáveis do treinador na comissão técnica do líder absoluto Cruzeiro. Trio começa a surgir nos tempos do Paraná

Por Belo Horizonte

No consagrado romance de capa e espada "Os três mosqueteiros", de Alexandre Dumas, escrito em 1844, D'Artagnan, um jovem da Gasconha de 18 anos, abandonado, vai a Paris com o objetivo de se tornar integrante do corpo de elite dos guardas do rei, que são os mosqueteiros. Acaba se juntando a três ex-adversários, Arthos, Porthos e Aramis. Juntos, aumentam suas forças num combate e, a partir daí, trocam promessas de amizade. Mesmo não sendo mais jovem, Marcelo Oliveira conseguiu, ao longo da carreira, reunir homens de confiança para obter sucesso em seu trabalho. Tico, Ageu e Juvenilson parecem ter firmado desde a união no Paraná um pacto com o treinador que vai se consolidando na passagem pelo Cruzeiro, rumo a mais um título brasileiro.

 O jogador resistente, que joga 90 minutos em intensidade: o Egídio. O velocista, sprint: Marquinhos. O potente, que alia a força à velocidade num espaço curto: Nilton."
Juvenilson de Souza

 Os três estão com Marcelo desde os tempos do Paraná e completaram 114 jogos com o técnico no comando da Raposa. O primeiro mosqueteiro convocado por Marcelo Oliveira foi Cleocir Marcos dos Santos, o Tico. Os dois se conheceram no Atlético Mineiro em 2008, quando eram auxiliares do técnico Levir Culpi. Depois, quando Marcelo foi dirigir o Ipatinga, em 2009, convidou o já amigo para ser seu braço direito. Lá foram campeões na segunda divisão do Campeonato Mineiro. E nunca mais se separaram.

O segundo e o terceiro mosqueteiros Marcelo conheceu no Paraná, para onde foi em 2009: Ageu, ex-zagueiro do clube, que lá mesmo começou carreira de auxiliar técnico, e Juvenilson de Souza, preparador físico. O trio seguiu Marcelo no Coritiba em 2011 e 2012 - onde os quatro foram vice-campeões da Copa do Brasil por duas vezes -, na breve e turbulenta passagem pelo Vasco, ainda em 2012, e no vitorioso trabalho no Cruzeiro, que começou no mesmo ano.

- Há um entrosamento muito bom. Entrosamento bom não quer dizer que não haja divergência de opinião. Mas eu até estimulo e provoco isso para que não fique só a minha opinião, que exista interação, se discutam determinadas situações e haja um consenso. Mas a palavra final naturalmente é sempre a minha - disse Marcelo Oliveira, sem deixar dúvidas.

Juvenilson, Marcelo Oliveira, Tico e Ageu, Cruzeiro, Mosqueteiros (Foto: Maurício Paulucci)Juvenilson, Marcelo Oliveira, Tico e Ageu: um por todos e todos por um no Cruzeiro vitorioso (Foto: Maurício Paulucci)


O entendimento com Marcelo e do próprio trio entre si parece, de fato, perfeito. A ponto de os três morarem no mesmo condomínio e irem e voltarem juntos para a Toca da Raposa. Conversando sempre sobre... o Cruzeiro.

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Tico, o braço direito


Dos três, Tico, com 54 anos, é o mais velho e  vivido. O braço direito de Marcelo Oliveira foi jogador, treinador, preparador físico, auxiliar técnico, supervisor, coordenador de base... Um verdadeiro curinga. E ainda aparece para evitar possíveis desgastes do treinador. 

- Nos jogos eu troco ideia com o Tico. Às vezes, uma situação que não estou percebendo ele me leva. Eu levo a ele para discutir ali, no momento do jogo. A gente faz um planejamento de trabalho da semana, e muitas vezes ele executa. Eu acho que o técnico às vezes se desgasta muito quando está apitando direto com o jogador. O atleta, ali, no calor do treinamento, acha que a bola saiu, não saiu. Então eu deixo um pouco com o Tico e fico monitorando próximo e cobrando também. Então ele às vezes orienta e apita os pequenos jogos. E eu faço a parte tática, os coletivos, as jogadas ensaiadas - afirmou o treinador cruzeirense.

Tico Cruzeiro mosqueteiros entrevista (Foto: Mauricio Paulucci)Tico já foi jogador, treinador, preparador físico. Hoje é auxiliar de Marcelo (Foto: Mauricio Paulucci)

Tico lembra: o período no qual trabalhou como treinador e coordenador das divisões de base de vários clubes, como Atlético Mineiro, Coritiba e Atlético Paranaense, além das outras funções exercidas em tantos anos de carreira, lhe dá a base suficiente para auxiliar tanto Marcelo Oliveira quanto o restante da comissão técnica.

- Pelo fato de eu ter feito várias funções no futebol, isso me dá uma tranquilidade em relação às observações do todo. Existe a parte física, técnica, tática, de supervisão, logística. E eu tive sorte de ter sido atleta, de ter tido base profissional de futebol, fiz o curso de educação física, então tenho conhecimento da preparação física, já fui preparador físico no início da carreira e fui supervisor, gerente... Então tenho esse entendimento de logística, de programação, de planejamento. E isso me fez bem, eu passar por todas essas áreas em alguns clubes. E ter trabalhado nas categorias de base, como treinador de juniores, como coordenador de base. Então essa mistura, essas várias funções que você executa vão te dando um pouquinho de cada coisa, e aí o Marcelo é uma pessoa muito inteligente, um cara que tem uma química com a comissão técnica muito grande, porque ele sabe ouvir.

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Ageu, o espião


Se Tico é o braço direito, Ageu Gonçalves, 42 anos, é o lado espião de Marcelo Oliveira. O ex-zagueiro do Paraná conheceu o treinador justamente quando estava no Tricolor Paranaense, já como auxiliar. E Marcelo gostou tanto do seu trabalho que o convidou para ingressar no Coritiba. A parceria se estendeu ao Vasco e agora ao Cruzeiro.

Ageu viaja para ver jogos dos adversários. Faz as observações, analisa-os coletivamente e individualmente e apresenta o relatório a Marcelo Oliveira e ao restante da comissão técnica.

- Acho que é importante isso. Pela televisão é um pouco diferente de ver in loco, ali no estádio, ver a movimentação do time como um todo. Isso não ganha jogo, mas é um detalhe que agrega, pode ajudar... Um jogador prestando atenção num outro jogador do seu setor para se prevenir ou se aproveitar de uma fraqueza ou de um setor vulnerável também para ser explorado - disse Marcelo Oliveira.

O ex-zagueiro também é o responsável por ficar com os atletas que não viajam para as partidas fora de casa - ele fica em Belo Horizonte - e por alguns treinamentos com os zagueiros. Quanto à principal tarefa que executa, lembra o trabalho de equipe com a comissão técnica.

Ageu, Cruzeiro, Mosqueteiros (Foto: Maurício Paulucci)Ageu observa os adversários e jogadores da base do  Cruzeiro (Foto: Maurício Paulucci)

- Observo os adversários. Não é ser um espião, hoje está muito fácil, muito rápido para ter essas informações. Você as passa, e a convicção é do treinador. O Marcelo tem suas convicções, que às vezes no jogo acontecem, às vezes a gente passa algo que no jogo o adversário pode mudar. Não tem isso de que "Ah, o Ageu viu o adversário, ganhou o jogo". Isso é um trabalho em conjunto. Quem faz esse resultado final são os jogadores. Claro que cumprindo a parte tática que o Marcelo elabora. A gente só faz o que tem que ser feito. Passa as bolas paradas, os contra-ataques, as substituições. Todos os grandes clubes fazem esse trabalho. Não me vanglorio com essa situação. Sou apenas uma peça da engrenagem que colabora para que funcione. Não tenho essa vaidade de que "Ah, o Ageu...". Esse é o trabalho de todo o grupo do Cruzeiro.

Ageu também observa os jogadores da base do Cruzeiro. Em algumas ocasiões viaja com os juniores para acompanhar competições nacionais e faz um relatório de quem pode ser melhor aproveitado. Os scouts das partidas, principalmente do Mineirão, estão também sob sua responsabilidade. Tico lembrou a importância desse trabalho.

-  Como o Ageu não viaja para os jogos do Cruzeiro, não temos isso nos jogos fora. Mas dentro de casa, no Mineirão, a gente tem um scout do jogo, os números. No intervalo ele desce e apresenta. Isso o Marcelo usou várias vezes para corrigir a postura da equipe. Às vezes você está jogando contra um adversário que teve cinco escanteios contra e um a favor. Teve caso de bola roubada no Mineirão, e a gente estava com a pegada muito leve. Não lembro o jogo, mas o Marcelo usou no intervalo. O time teve um crescimento de bola roubada muito grande. E várias outras coisas que acontecem com uma dinâmica de trabalho - afirmou Tico.

Os treinamentos do ex-zagueiro com os defensores também são considerados importantes. Ageu procura passar para os jogadores a experiência de anos na posição. E lembrou: o entrosamento com a comissão técnica é fundamental para acertar com facilidade essa e outras questões. A amizade fora do trabalho conta muito a favor.

- Joguei futebol 17 anos como profissional, passei pela base. Então trabalhei com muitos treinadores. Alguns trabalhos a gente tem passado para eles, mas às vezes eles também têm uma coisa que pode encaixar na forma do trabalho. Isso é combinado com a comissão técnica, o Juvenilson, o Tico e o próprio Marcelo. Eles é que determinam qual é o trabalho que a gente vai usar. E aí eu intensifico de acordo com o planejamento feito na nossa sala. A gente tem uma convivência muito grande. Eu, Tico e Juvenílson, a gente vai e volta junto falando de trabalho. Moramos no mesmo condomínio, somos amigos pessoais. Isso facilita o trabalho. Por isso você às vezes chega ao treino e já sabe o que fazer, está tudo elaborado. Então, vai ali no campo e só executa - disse o ex-zagueiro.

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Juvenilson, o homem do fôlego



Se Tico e Ageu são os mosqueteiros que ajudam Marcelo Oliveira a montar a cabeça e o coração do Cruzeiro líder, desafiador, envolvente, o terceiro mosqueteiro do treinador, Juvenilson de Souza, 42 anos, é o responsável por encher os pulmões da equipe para executar todo o belo repertório de jogadas do time desde a conquista do Brasileirão de 2013. E a tabelinha com Marcelo Oliveira segue perfeita, segundo o preparador. Ele elogia o comandante: Marcelo lhe dá liberdade total com relação à carga de treinamento, à recuperação, à monitoração, à distribuição dos treinamentos durante a semana.

- Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é que hoje o futebol exige que você tenha dinâmica, velocidade. O nosso trabalho é sustentado em força e velocidade. Então a gente tem N meios de treinamento para desenvolver a força e N meios para desenvolver a velocidade. A parte de resistência é muito treinada em função dos trabalhos de posse de bola e dos trabalhos de campo reduzido - afirmou Juvenilson.

Os números são hoje o grande companheiro da preparação física tanto no ponto de vista do aspecto técnico como no tático. E Juvenilson dorme abraçado com eles para fazer o Cruzeiro voar nas competições.

- Monitoramos treinamentos e jogos. Então sabemos todas as ações que cada atleta executa nas partidas. Acabou o jogo ou acabou o treinamento, a gente tem esses dados. O departamento de fisiologia coleta as informações, põe num banco de dados, as traz para mim. Analisamos isso. Então sabemos a intensidade com que cada atleta treinou, o número de ações que esse atleta fez em termos de distância, o número de sprints, os piques em velocidade que ele fez. Isso faz com que a gente, tendo esses dados, saiba qual é a intensidade do jogo, e tem um perfil de cada posição que executa de sprints num jogo. Se tiver algum atleta abaixo disso, procuro conversar e orientar para que possa, nos próximos treinamentos, buscar essa intensidade.

Esses dados permitem ao treinador saber a melhor forma de explorar o potencial de sua equipe. Cada ponto forte, cada ponto fraco. E há os que se destacam. Na hora de apontar o jogador mais resistente, o mais veloz e o leão do time, o preparador físico não teve dúvidas.

Juvenilson, Cruzeiro, Mosqueteiros (Foto: Maurício Paulucci)Juvenilson de Souza diz que Egídio é o jogador mais resistente (Foto: Maurício Paulucci)

- O jogador resistente, que joga 90 minutos em alta intensidade: o Egídio. Um jogador velocista, sprint: o Marquinhos. Um jogador potente, que alia a força à velocidade num espaço curto: Nilton. Temos percebido características físicas importantes correlacionadas por posição e função que o jogador exerce. Primeiro: os laterais são os atletas com mais volume de ações. Depois, os volantes. Aí vêm os meias. Se a gente for comparar com alguns anos atrás, tinham muito mais funções ofensivas e poucas defensivas. Hoje têm as duas. Isso aumentou muito a condição física deles. E por fim aparecem os zagueiros e o centroavante no sistema que o Marcelo adotou aqui no Cruzeiro. O homem de referência. Claro que não é uma coisa uniforme. Varia de jogo para jogo. No geral, no padrão, é o que frequentemente acontece.

Juvenilson lembra que nada é fácil hoje em termos de preparação física: zagueiros têm funções defensivas, mas hoje, com muitas jogadas de bola parada, precisam ir à frente para surpreender as defesas adversárias. E por aí vai. No fim, resume por que o Cruzeiro vai bem, obrigado.

- Quando os zagueiros vão, a ação não é de alta intensidade. Mas quando voltam, muitas vezes há contra-ataque. Então eles têm ações de alta intensidade. Os laterais, que anteriormente tinham muito mais funções defensivas, hoje precisam atacar e defender. E se não voltarem e ocorrerem gols no setor deles, serão responsabilizados. Então, necessitam voltar. E isso em todas as posições. O volante também tem que atacar. Então o futebol moderno exige que todos os atletas tenham funções ofensivas e defensivas. Uns mais, outros menos. Mas todos têm. Porque se você não tiver isso, se você não tiver atletas preparados para fazer isso, pode ganhar um ou dois jogos, mas dificilmente estará competindo para ganhar títulos.