Política

Crimes contra saúde serão investigados por divisão especial da PF

Governo enviará ao Congresso projeto de lei para criminalizar fraudes em dispositivos médicos implantáveis, como órteses e próteses

A Polícia Federal terá uma divisão para apurar apenas os crimes contra a saúde. Além disso, o governo também enviará ao Congresso um projeto de lei para criminalizar fraudes na prescrição e comércio de dispositivos médicos implantáveis (DMI), como órteses e próteses. As medidas, anunciadas nesta terça-feira, são resultado do relatório final de um grupo trabalho criado em janeiro para combater irregularidades no setor. O grupo começou a funcionar após o programa "Fantástico", da TV Globo, exibir reportagem denunciando fraudes no comércio desses equipamentos em hospitais da rede pública.

O projeto prevê que a obtenção de lucro ou vantagem ilícita na comercialização, prescrição ou uso de DMIs passa a ser crime. O texto, que tramitará em regime de urgência, altera o artigo 171 do Código Penal, que trata de estelionato. Pelo projeto, serão responsabilizados administrativa, civil e criminalmente os envolvidos em condutas irregulares que envolvam DMIs. Em relação à nova divisão da PF, o secretário-executivo do Ministério da Justiça, Marivaldo de Castro Pereira, informou que a portaria que a cria ficará pronta nesta terça ou na quarta-feira.

Também estão sendo criadas regras para o uso de DMIs, priorizando inicialmente as áreas de ortopedia e cardiologia. O objetivo é fazer com que o médico indique ao paciente aquele produto que seja de fato o mais adequado para ele. O SUS, por exemplo, não terá de pagar procedimentos desnecessários.

O grupo, que tinha por objetivo reestruturar os processos do setor, dando mais transparência, foi formado por representantes dos ministérios da Saúde, Fazenda e Justiça, além do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems).

O grupo também propõe a padronização de nomenclaturas e a implantação do Registro Nacional de Implantes (RNI). No RNI, haverá informações técnicas e econômicas dos DMIs, possibilitando rastreá-los desde sua produção até a implantação no paciente. O objetivo dessas e outras medidas é diminuir a assimetria de informação entre prestadores do serviço e usuários.

Segundo o Ministério da Saúde, também haverá melhorias no Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as medidas a serem colocadas em prática está o envio de correspondência ao paciente com informações sobre o tratamento pelo qual passou para a implantação do DMI. Também haverá auditorias periódicas para apurar irregularidades.

De acordo com o Ministério da Saúde, foi detectado que as unidades de saúde recebem lucro que varia entre 10% e 30%, encarecendo o preço do produto. Uma prótese de joelho, por exemplo, chegou a ser comercializada por uma valor 8,7 vezes maior, boa parte disso decorrente de cobranças irregulares de médicos e hospitais. Já um marcapasso pode custar entre R$ 29 e R$ 90 mil, dependendo da região.

Vários especialistas também cobram comissão pelo uso do produto de um fornecedores, apesar da proibição tanto do Conselho Federal de Medicina (CFM) como do Conselho Federal de Odontologia (CFO). Foi constatada ainda a existência de reserva de mercado, com distribuidores exclusivos por região. Além disso, o grupo de trabalho verificou que vários produtos são muito mais caros no Brasil do que no exterior. Para combater esse problema, será elaborado um projeto de lei para a aplicação do modelo de preço de referência externo. Também haverá medidas para flexibilizar a importação e ampliar a produção nacional. O mercado hoje é dominado por grandes empresas multinacionais.

Segundo o ministério, há mais de 10 mil DMIs registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Eles movimentaram R$ 4 bilhões no ano passado e representam 20% de todo o mercado de produtos médicos, avaliado em R$ 19,7 bilhões. Esses dispositivos tiveram um crescimento de 249% entre 2007 e 2014 no Brasil. Os DMIs não incluem todas as órteses e próteses, apenas aquelas implantadas por ato cirúrgica. Óculos e cadeiras de roda, por exemplo, são órteses, mas não são DMIs

Funcionam hoje no Congresso duas comissões parlamentares de inquérito para tratar das fraudes no setor: uma na Câmara e outra no Senado. O ministro da Saúde, Arthur Chioro, entregou ao deputado Geraldo Resende (PMDB-MS), presidente da CPI na Câmara, o relatório do grupo de trabalho. À tarde, ele fará o mesmo na CPI do Senado.