Economia

Ministro do Planejamento diz que não há descontrole do câmbio no Brasil

Nelson Barbosa fez questão de explicar medidas mais polêmicas, como as restrições na concessão da pensão por morte e do seguro-desemprego

BRASÍLIA - Apesar da recente alta do dólar, a situação do câmbio não é de descontrole, afirmou, nesta terça-feira, o ministro do Planejamento Nelson Barbosa. Para ele, a taxa de câmbio está passando por um realinhamento em função de fatores como a queda dos preços de commodities:

— O câmbio mudou de nível, mas quando nós olhamos para uma série mais longa, vemos que ele voltou a 2006. É um realinhamento da taxa de câmbio por fatores internos e externos, mas ela tende a se estabilizar num patamar mais adequado.

Num esforço para aprovar o programa de ajuste fiscal no Congresso, o ministro do Planejamento participou de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado na manhã desta quarta-feira. Em sua fala inicial, o ministro reconheceu que as medidas para reequilibrar as contas públicas podem ter impacto restritivo sobre a economia no curto prazo, mas vão permitir um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) já no segundo semestre de 2015.

Nelson Barbosa defende ajuste fiscal na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Foto: Marcos Oliveira / Agência Senado
Nelson Barbosa defende ajuste fiscal na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Foto: Marcos Oliveira / Agência Senado

— Temos adotado medidas que podem ter impacto restritivo sobre a economia no curto prazo, mas elas são o primeiro passo para a recuperação do crescimento da economia — disse Barbosa, acrescentando:

— O ajuste fiscal não é um fim em si mesmo.

O ministro destacou que a fixação da meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) em R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do PIB, em 2015 representa um esforço considerável, mas suportável para a economia:

— No ano passado, o setor público registrou um déficit primário de 0,6% do PIB, o primeiro desde 1997. A meta de superávit de 2015 foi fixada em 1,2% do PIB. Isso é um esforço fiscal considerável, mas possível. Procuramos fazer isso de maneira bem distribuída e numa velocidade gradual que a economia pode suportar.

Barbosa fez questão de explicar algumas das medidas mais polêmicas do programa, como as restrições na concessão da pensão por morte e do seguro-desemprego. Ele disse que as atuais regras para o pagamento do seguro-desemprego estimulam uma excessiva rotatividade no mercado de trabalho. E disse que as pensões por morte só estão deixando de ser vitalícias para casos específicos, o que afeta 13% dos beneficiários.

— As medidas (que restringem benefícios trabalhistas e previdenciários) promovem uma redução do gasto obrigatório da União. Elas vão abrir espaço para que os recursos poupados sejam utilizados em outros programas. São ações estruturais — afirmou ele.

O ministro argumentou ainda que a maior parte do ajuste fiscal está sendo feita pelo lado das despesas e que o governo só aumenta impostos quando há necessidade. Segundo ele, 70% das ações são para conter gastos e apenas 30% representam medidas para reforçar a arrecadação, como o aumento de tributos:

— Há uma ideia de que aumento de arrecadação pode ser complicado nesse momento. É sempre uma medida difícil que tem impacto negativo, mas o governo só adota isso quando é necessário.

Sobre os concursos públicos, o ministro afirmou que o governo pretende chamar os aprovados, mas explicou que isso tem que ser feito respeitando as limitações orçamentárias do momento.

— Temos por objetivo honrar os nossos compromissos. Mas a velocidade de admissão (dos aprovados em concursos) vai obedecer a programação orçamentária da União.

Barbosa apresentou ainda um quadro das perspectivas para a economia em 2015, destacando que a inflação deste ano está sofrendo uma alta temporária em função do realinhamento de preços. Segundo o ministro, os índices vão recuar em 2016 e convergir para o centro da meta de inflação, de 4,5% ao ano.

PROGRAMA DE CONCESSÕES

O ministro também falou aos senadores da CAE sobre os planos do governo para promover o crescimento da economia e destacou que o programa de concessões não está paralisado. Ele citou como exemplo o leilão da ponte Rio-Niterói, que ocorre nesta quarta-feira e já tem seis empresas interessadas em participar.

— Há perspectiva de grande concorrência. Quem é do Rio sabe. Quem vencer não vai apenas administrar a ponte, mas vai fazer um novo mergulhão em Niterói e uma conexão do porto do Rio com a Linha Vermelha — afirmou Barbosa.

O ministro disse ainda que haverá uma segunda rodada de concessões de rodovias no segundo semestre de 2015:

— O programa de concessões não parou. Há possibilidade de vários investimentos em rodovias.

PROMESSAS DE CAMPANHA

Nelson Barbosa ouviu críticas dos senadores às promessas de campanha da presidente Dilma Rousseff. Ricardo Ferraço (PMDB-ES) e Álvaro Dias (PSDB-PR) afirmaram que o programa de ajuste fiscal da equipe econômica é uma tentativa do governo de corrigir erros do primeiro mandato e representa um rompimento com os compromissos assumidos por Dilma na campanha pela reeleição, quando ela prometeu a preservar direitos dos trabalhadores.

Dias chegou a falar que a presidente cometeu um “estelionato eleitoral”. Ferraço, por sua vez, afirmou:

— Não dá para (o governo) dizer "esqueçam tudo o que eu fiz", "tudo o que eu falei".

O ministro rebateu alfinetando a oposição. Ele disse que o governo Dilma não está negando promessas de campanha e nem a política econômica do primeiro mandato, assim como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não o fez em 1998, quando mudou o regime de câmbio fixo para câmbio flutuante logo após a reeleição:

— Eu acho que não foi uma negação o presidente Fernando Henrique mudar a política cambial depois de reeleito. Em 1998, o câmbio era fixo, ele defendeu o câmbio fixo o quanto pode. Mas quando veio uma crise financeira, num ato corajoso, ele mudou a matriz de política econômica, adotando metas de inflação e câmbio flutuante — disse o ministro, acrescentando:

— A equipe (de Dilma) tentou lutar contra a desaceleração da economia mundial e isso teve impacto sobre as contas públicas. Estamos tentando fazer uma saída gradual. Houve uma preocupação fundamental de preservar o interesse da população. Reavaliações de política econômica não são monopólio de um partido.

O ministro também afirmou que as mudanças que estão sendo propostas em benefícios sociais são decorrentes de uma nova realidade econômica, que não existia quando eles foram formatados:

— Parte do que a gente tem que fazer agora é fruto do aumento da formalização e da renda, o que colocou pressão sobre programas que foram formatados em outra realidade, quando o salário mínimo era baixo. Não considero que há negação (das promessas de campanha) e nem volta atrás. Há uma decisão correta e corajosa de criar as condições para um novo ciclo de desenvolvimento.

NOVOS MINISTÉRIOS

Nelson Barbosa afirmou na CAE que a criação de novos ministérios nos últimos anos não teve grande peso sobre os gastos da União. Ao discutir as medidas de ajuste fiscal com senadores, ele disse que parte dos ministérios surgiu a partir de secretarias que já existiam e que foram transformadas em função de sua importância para o país. Por isso, argumentou o ministro, eles não representaram um grande aumento das despesas do governo:

— A maior parte dos (novos) ministérios vieram a partir da transformação de secretarias já existentes em ministérios e representaram muito pouco em termos de gasto adicional considerando sua importância para o país. Foi uma decisão política. Não acho que o número tenha um grande peso orçamentário.

O senador Reguffee (PDT-DF) questionou o ministro sobre o compromisso da atual equipe econômica com a meta de superávit primário de 2015. Barbosa respondeu afirmando que o governo está propondo ao Congresso medidas que permitam a realização desse esforço fiscal e destacou que o atingimento da meta não depende apenas do Executivo:

— O atingimento da meta depende do apoio do Congresso à aprovação de medidas propostas pelo governo. Ela é de todo o Estado brasileiro — disse ele.

O ministro disse que não se sente desconfortável com o fato de ter ajudado a formular o programa de desoneração da folha de pagamento das empresas que foi adotado no primeiro mandato da presidente Dilma e agora está sendo revisto para reduzir os gastos do governo:

— Não me sinto desconfortável em relação à revisão das medidas. Eu defendi a desoneração da folha, mas faz parte da política econômica revisar o que a gente acha que está em nível excessivo.

O ministro admitiu que a alta do dólar pressiona os índices de inflação, mas disse que esse é um efeito restrito e passageiro.

— O câmbio mudou de patamar, mas não saiu do controle. Ele cria efeitos temporários sobre a inflação, mas isso é restritivo porque depois a economia se adapta e se recupera. O governo está atento e mantendo sua política de câmbio flutuante, tomando medidas necessárias dentro da dose adequada.

GRANDES FORTUNAS

Barbosa afirmou que o governo não tem uma meta de câmbio e que o programa de leilões de swap cambial - a chamada ração diária - implementado pelo Banco Central (BC) foi adotado para atenuar os impactos da flutuação da moeda americana no mercado. Ele admitiu que o programa de swap tem um custo para o orçamento da União, mas ressaltou que ele é transparente e aparece no balanço do BC.

O ministro do Planejamento também foi questionado pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ) sobre a possibilidade de o governo passar a tributar grandes fortunas. Num tom afinado com o Ministério da Fazenda, Barbosa afirmou que esse tipo de medida não é tão eficiente e disse que uma alternativa poderia ser a taxação de heranças, doações e transmissão de bens:

— Seria mais eficiente a tributação da transmissão da riqueza do que da riqueza a cada momento — disse ele.

Na conclusão de sua fala na CAE, depois de cinco hora de audiência pública, o ministro afirmou que o desenvolvimento da economia tem altos e baixos e que agora o Brasil está numa ladeira:

— Momentos de dificuldade fazem parte do desenvolvimento. A estrada do desenvolvimento tem altos e baixo. Estamos numa ladeira e não se sobe ladeira em terceira ou quarta marcha. Se sobe de primeira e segunda.

Ele voltou a afirmar que o governo está fazendo ajustes em sua política econômica porque tem a humildade de corrigir que deu errado:

— Como todos os humanos somos falíveis. Temos que ter a humildade de reconhecer o que precisa ser corrigido.