Rio

Agressor de três pessoas em festa já foi condenado pela Lei Maria da Penha

Com oito passagens pela polícia, José Phillippe Ribeiro de Castro, de 28 anos, é conhecido pela vida boêmia e por atos covardes

José Phillippe é levado para o complexo penitenciário de Gericinó: mesmo cumprindo prisão temporária, ele teve de raspar a cabeça e usar uniforme em Bangu 10
Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo
José Phillippe é levado para o complexo penitenciário de Gericinó: mesmo cumprindo prisão temporária, ele teve de raspar a cabeça e usar uniforme em Bangu 10 Foto: Gabriel de Paiva / Agência O Globo

RIO — Preso sob a acusação de ter ferido, com golpes de um objeto cortante, três pessoas durante uma festa em sua casa no último sábado, na Gávea, José Phillippe Ribeiro de Castro, de 28 anos, não tem apenas um histórico de oito passagens pela polícia. Ele já se sentou no banco dos réus no Tribunal de Justiça do Rio. Em 2011, foi processado por uma jovem que o acusou de agressão e violação de domicílio. O promotor de eventos foi condenado, mas a pena acabou sendo suspensa sob a condição de que comparecesse ao Fórum a cada dois meses. Porém, o réu descumpriu a ordem. Antes da sentença, o juízo chegou a determinar medidas protetivas para a vítima com base na Lei Maria da Penha: José Phillippe não poderia chegar a 250 metros da jovem. O processo envolveria uma criança, mas o advogado do acusado, Luiz Henrique da Penha Gomes, que confirmou a existência do processo, negou que houvesse uma, citada na ação como filha do casal.

— Houve violação de domicílio porque ela, com o fim da relação, impediu José Phillippe de entrar no apartamento para pegar alguns pertences. Ele então forçou a entrada e vizinhos chamaram a polícia. Mas tanto não houve agressão que ela desistiu do processo e não compareceu às audiências. Houve algum engano com relação à existência de uma criança. Ele não tem filhos. E também não descumpriu a medida. Apenas não compareceu por um erro do próprio tribunal, que atrasou sua citação — afirmou o advogado.

ROTINA DE VIOLÊNCIA E NOITADAS

Enquanto respondia a uma série de denúncias de violência e agressões na polícia, a vida de José Phillippe parecia uma festa sem fim. No último dia 29, na inauguração da filial carioca da boate nova-iorquina Pink Elephant, na Barra, lá estava ele. Na semana passada, bateu ponto em uma comemoração VIP da Veuve Clicquot numa mansão de Santa Teresa. Na noite seguinte, foi a um evento reservado a promoters da cidade. Sua namorada, a estudante de moda Camila França, dividia espaço em fotos com diversas beldades, com quem ele adorava posar em suas andanças pela noite do Rio.

O perfil exibido por José Phillippe no mundo virtual certamente não terá relatos de seus últimos dias. A rotina foi bem menos sedutora que aquela que ele costuma levar nos camarotes das mais badaladas festas da cidade. Dormiu uma noite na carceragem da 14ª DP (Leblon), onde comeu a mesma refeição servida a outros detentos: arroz, feijão, contrafilé, batatas e salada. Horas depois, alegou que estava passando mal e pediu para ser levado a uma clínica particular, mas policiais o conduziram ao Hospital Municipal Miguel Couto. Um médico o examinou, lhe deu um remédio e disse que ele estava bem para voltar à cela. Na segunda-feira pela manhã, José Phillippe foi transferido para a Cadeia Pública José Frederico Marques, conhecida como Bangu 10, no Complexo Penitenciário de Gericinó.

Como todo novo detento, José Phillippe, que cumpre desde domingo um mandado de prisão temporária de cinco dias, foi obrigado a raspar a cabeça para evitar piolhos. Depois do corte, recebeu uma roupa nova: o uniforme da Secretaria estadual de Administração Penitenciária, que se resume a uma camisa verde, calças jeans e chinelos de dedo. Bangu 10 é considerada uma unidade de entrada no sistema carcerário, e, na segunda-feira, advogados aguardavam sua transferência para Bangu 8, destinada a presos com diploma de curso superior — José Phillippe é formado em ciências econômicas pelo Ibmec.

Acusado de decepar parte da orelha de Gabriel Silva, amigo de seu irmão — que organizava a festa na casa da família —, e de desferir três golpes com um objeto cortante em Ana Carolina Romeiro, ele ainda teria cortado uma mão e um braço de Lourenço Brenha. José Phillippe responde a inquérito por dupla tentativa de homicídio e lesão corporal. Com a primeira passagem pela polícia aos 16 anos de idade, o promotor de eventos começa a ter revelado um lado de sua personalidade muito diferente daquele que aparece nas redes sociais.

“Covarde! Então é você que estourou o tímpano de uma amiga? Você é nojento, covarde e assassino. Já estava na hora de apodrecer na cadeia”, diz o trecho de uma postagem escrita na segunda-feira por Renata Bernat na página de José Phillippe no Facebook.

Uma ex-namorada de José Phillippe, em entrevista ao GLOBO, também fez graves acusações.

— No início, ele era um homem encantador, educado e estabilizado. Passados poucos meses de namoro, começou a ter ciúme dos meus amigos, inclusive mulheres. Bate em mulher como se estivesse batendo em homem. Seus pais e avós sempre souberam de tudo, mas nunca fizeram nada. Fui agredida uma única vez. Depois, ele tentou me chantagear, queria que eu voltasse, ameaçou espalhar fotos íntimas minhas. Por isso, nunca o denunciei — relatou ela, que, por segurança, pediu anonimato.

Atos de covardia contra mulheres teriam se repetido. Uma amiga do rapaz, indignada com os três golpes sofridos por Ana Carolina Romeiro, também o descreveu como um homem com um longo histórico de problemas:

— Ele é perigoso, sempre foi brigão. Dirigia bêbado, feito um maluco. Uma vez, ele e o irmão caçula brigaram feio. Tão feio que o pai o expulsou de casa. Foi covardia, ele é o mais velho dos quatro filhos.

Sem revelar seu nome, ela disse que uma outra ex-namorada de José Phillippe ficou trancada 24 horas em um banheiro da casa dele após uma briga.

AMBIÇÃO DE LUCRAR NA BOLSA

José Phillippe mantém uma página na rede social LinkedIn. Todo o texto com seu histórico profissional está escrito em inglês. Diz ele:

“A Souza Cruz me fez uma proposta para trabalhar com análise financeira. Era um grande salário, um emprego seguro, então eu disse que sim. A razão pela qual deixei a empresa foi que eu poderia ganhar na bolsa de valores 600% a mais que o meu salário”.

Após pular de emprego em emprego desde que se formou, José Phillippe, filho de um empresário do agronegócio e de uma psicóloga, resolveu mudar de área. Em janeiro deste ano, passou a investir na carreira de promotor de festas. Seu trabalho, no entanto, parece não ter agradado a todos. Uma das boates em que ele deu expediente foi a Sette, do Leblon, onde ficou pouco mais de um mês, segundo Marcello Rendy, dono da casa noturna. Ele contou que José Philippe deixou de trabalhar no local porque os eventos que promovia não reuniam o público esperado:

— Depois de algum tempo, ele não levava gente suficiente para a boate. Mas sempre me pareceu uma pessoa íntegra e tranquila.

Uma bailarina carioca dá uma versão diferente para a saída. Ela apresentou um contrato, no valor de R$ 500, que José Phillippe teria assinado para que se apresentasse na boate. O valor nunca foi pago. Em mensagens enviadas para o celular da dançarina, ele afirma que a jovem é “burra até dizer chega”, e que teria ‘‘estragado tudo’’ ao revelar a dívida para Rendy — que nega a versão.

— Isso foi há dois meses. Ele saiu da casa por causa desse episódio. Depois, ainda o encontrei na Pink Elephant e em outra festa, semana passada. Na primeira, ele chegou a apertar meus braços, mas um segurança o afastou de mim — contou a bailarina.

Os advogados que defendem José Phillippe — Ari Bergher e Raphael Matos — aguardam o desenrolar do inquérito para pedir a soltura do rapaz. Segundo Bergher, seu cliente tem dois machucados — semelhantes a mordidas — na barriga e arranhões nas costas e no pescoço.

Bergher contou que os pais de José Phillippe, que estavam em Miami, nos Estados Unidos, anteciparam a volta e chegaram nesta segunda-feira ao Rio. Ele negou as acusações feitas pela ex-namorada. Internada na UTI da Clínica São Vicente, na Gávea, Ana Carolina apresentou melhora em seu quadro clínico. As contas do hospital estão sendo pagas pela família de José Phillippe, que deixou um cheque de R$ 60 mil.

*Colaboraram: Ana Cláudia Costa e Selma Schmidt