Rio

Abandonado, marido dá a volta por cima fantasiado de The Flash

Vendedor de cloro chegou a morar na rua, mas descobriu como conquistar admiradores e emprego com trajes do super-herói

O vendedor de cloro Adriano da Cunha, 38 anos, foi para o fundo do poço depois que a mulher o abandonou. Para piorar, os três filhos foram levados juntos. Arrasado, sujo e esmulambado, passou a morar pelas ruas de Campo Grande. A volta por cima veio depois que usou fantasia de The Flash, o super-herói criado pelo escritor Gardner Fox e pelo artista Harry Lampert. Esta curiosa história abre a série Gente do Rio , que apresenta toda terça-feira os personagens que tornam o Rio ainda mais encantador.

O maltrapilho Adriano mal conseguia se aproximar das pessoas. Era enxotado que nem cão sarnento.

— Era sempre expulso dos lugares. Cheirava mal. Estava desnorteado — conta ele, que vivia de pequenas esmolas.

A heroica virada veio quase por acaso. Ao passar em frente às lojas de eletrodomésticos, viu pela TV os preparativos para a Corrida Internacional de São Silvestre, em São Paulo. De estalo, lembrou-se do que realmente gostava de fazer desde a infância: correr, alucinadamente. Sonhou correr fantasiado, como via nas maratonas pela TV.

— Muita gente corria como Batman, Homem Aranha e Hulk. Mas queria um super-herói que ainda não havia visto. Aí surgiu a ideia do Flash —explica Adriano.

Apesar da péssima aparência, o corredor conseguiu convencer uma costureira a fazer a fantasia. Em campanha pelas ruas, arrecadou o dinheiro suficiente para custear a roupa da corrida e a passagem para São Paulo.


Como The Flash, o vendedor de cloro Adriano da Cunha passou a ser assediado nas ruas
Foto: Élcio Braga / Élcio Braga
Como The Flash, o vendedor de cloro Adriano da Cunha passou a ser assediado nas ruas Foto: Élcio Braga / Élcio Braga

A vida começou a mudar depois da participação na corrida paulista. Além de ter dado entrevistas após a disputa, percebeu que a fantasia o tornou alguém admirado. Em vez de enxotá-lo, as pessoas agora queriam tirar foto ao seu lado.

— Todo mundo queria falar comigo e tirar fotos. Passei a ser querido.

Hoje, The Flash só tira a fantasia para dormir. Passa o dia inteiro vendendo cloro e gás em seu triciclo. Usa ainda o veículo, dotado de equipamento de som, para fazer divulgação de lojas e shows na região. Fatura em torno de R$ 1,5 mil por mês, valor que dobra nas temporadas de vacas gordas.

Hoje o vendedor mora com uma filha em galpão alugado, sede de sua pequena empresa. O microempreendedor acalenta ainda o sonho de trazer os outros dois filhos de volta, abrigados na casa de parentes.

— A minha vida é correr. É isso que me faz feliz — observa o vendedor, que costuma correr de Campo Grande ao Centro do Rio, uma jornada de 53 quilômetros pela Avenida Brasil.

Pelo trajeto, com várias paradas por postos ao longo da via expressa, Adriano costuma ser muito assediado por populares. Muitas vezes desafia os admiradores para uma corrida. Mas, em vez de correr, apresenta uma coletânea de piadas prontas para os que queriam ver o homem mais rápido do mundo em ação.

Apesar da fama de veloz, Adriano guarda uma tristeza. Durante a Jornada Mundial da Juventude, em 2013, chegou atrasado e não viu o Papa Francisco.

— Eu corri desde a Central do Brasil, mas quando cheguei a Copacabana, o papa já tinha ido embora. O pessoal ficou me zoando, dizendo que o The Flash era muito mole — lamenta.