Saúde

É preciso ficar atento aos sinais da visão

Médicos recomendam consultas regulares após os 40 anos e explicam as doenças mais comuns

O engenheiro Ricardo Inchausti, de 76 anos, abandonou os óculos depois de descobrir uma catarata e operar os olhos. “Tinha cerca de 50% da visão em um deles e não percebia”, diz
Foto: Ana Branco
O engenheiro Ricardo Inchausti, de 76 anos, abandonou os óculos depois de descobrir uma catarata e operar os olhos. “Tinha cerca de 50% da visão em um deles e não percebia”, diz Foto: Ana Branco

RIO — Se 80% das informações recebidas do mundo exterior chegam a nós por meio da visão, presume-se que a saúde dos olhos é tratada pela maioria das pessoas como uma prioridade. Mas, de acordo com oftalmologistas, isso nem sempre acontece: como algumas doenças oculares avançam vagarosamente, é comum que pacientes cheguem aos consultórios com grande comprometimento da função visual. “Cuidados com os olhos” foi o tema da mais recente rodada de palestras da série Encontros O GLOBO Saúde e Bem-Estar. Apresentado pela jornalista Viviane Nogueira e coordenado pelo médico Cláudio Domênico, membro das sociedades Americana e Europeia de Cardiologia, o evento contou com a participação dos cirurgiões Almir Ghiaroni, mestre em oftalmologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e Oswaldo Moura Brasil, titular da Academia Nacional de Medicina, diretor e chefe do setor de retina e vítreo do Instituto Brasileiro de Oftalmologia (Ibol).

— O diagnóstico precoce é fundamental para o tratamento das doenças dos olhos. Consultar um oftalmologista deveria ser como ir a um cardiologista ou dentista — afirma Domênico, acrescentando que os cuidados com os olhos e a saúde bucal não costumam receber tanta atenção quanto o coração. — Infelizmente, a maioria das pessoas só procura ajuda médica quando já está com a visão comprometida. E, muitas vezes, nem percebe o surgimento dos primeiros sintomas.

DEPOIS DOS 60, MAIOR CUIDADO

Domênico lembra que, de acordo com a Sociedade Brasileira de Oftalmologia, as visitas a um médico especialista em olhos devem ser anuais após os 65 anos. E, para quem já fez 40, a recomendação é marcar pelo menos uma consulta a cada dois anos.

— Essa regularidade é muito importante porque ajuda a cuidar não só da vista, mas de todo o corpo. Exames de fundo do olho, por exemplo, podem revelar alterações em artérias fininhas que indicam, em alguns casos, hipertensão e diabetes — destaca Domênico.

O caso do engenheiro Ricardo Inchausti, de 76 anos, é um exemplo do problema, citado por Domênico, da falta de regularidade na marcação de consultas com oftalmologistas. Ele demorou a perceber que perdia a visão, aos poucos, devido a uma catarata, doença que afeta o cristalino, deixando-o opaco em relação à luz. Quando sentia alguma dificuldade para enxergar, sacava uns óculos para vista cansada e pronto. Mas, no início de 2014, a catarata “acelerou” e ele foi parar em uma mesa de cirurgia.

— Só assim descobri que tinha somente 50% da visão em um dos olhos. Não percebia isso. Felizmente, recuperei a capacidade total — conta o engenheiro, que, após três meses, operou o outro. — Não preciso mais de óculos. Meu médico me recomendou usá-los apenas em ambientes escuros. Mas nunca mais precisei.

Inchausti lembra que ficou impressionado ao perceber que convivia com uma “bomba-relógio”:

— Achava que bastava usar os óculos para vista cansada. Fui protelando. Tomei um susto, mas ainda bem que tudo deu certo. Hoje, minha visão está melhor do que quando eu tinha 60 anos.

Com base em dados de uma pesquisa realizada por uma grande empresa de produtos ópticos, o oftalmologista Almir Ghiaroni diz que, no mundo, cerca de 4,5 bilhões de pessoas têm algum tipo de problema visual. Ele ressalta que aproximadamente 30 milhões apresentam degeneração macular da retina, e este número deverá duplicar até 2030.

CATARATA: 500 MIL CASOS POR ANO

Catarata: 550 mil casos por ano

Segundo Ghiaroni, a catarata é a maior causa de cegueira reversível no mundo. Na maioria dos casos, a doença atinge quem tem mais de 50 anos e progride lentamente. Mas o especialista observa que, entre jovens e diabéticos, a evolução pode ser rápida, levando a uma significativa perda da visão em poucos meses.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que, no Brasil, surgem 550 mil novos casos de catarata por ano.

— A OMS considera adequado um índice de três ou quatro cirurgias de catarata a cada mil habitantes de países em desenvolvimento. Assim, no país, deveriam ser realizadas cerca de 700 operações anuais. Estima-se que os sistemas público e privado façam, juntos, 400 mil por ano — informa Ghiaroni.

GLAUCOMA AVANÇA NO MUNDO

O especialista lista as causas mais comuns de cegueira, além da catarata: degeneração macular da retina, retinopatia diabética e glaucoma, que provoca lesão no nervo óptico e, por isso, é a maior causa de perda visual irreversível, segundo o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).

No caso do glaucoma, os números da OMS são desanimadores: a cada ano, são registrados 2,4 milhões de novos casos no mundo. E a expectativa é que, em 2020, o número de portadores da doença chegue a 80 milhões.

— Na fase final da doença, o paciente perde a visão periférica e passa a enxergar como se olhasse por um tubo. As lesões inicias não são periféricas, mas paracentrais. Por isso, o diagnóstico precoce, com o exame do nervo óptico, é fundamental — aponta Ghiaroni, acrescentando que a cirurgia nem sempre é necessária. — Em muitos casos, a pessoa não fica cega. É possível controlar a doença, mas ela não tem cura.

Oswaldo Moura Brasil chama a atenção para as doenças da retina, na parte posterior do olho, e afirma que a degeneração macular relacionada à idade é a mais frequente. Segundo o oftalmologista, ela se tornou, entre pessoas com mais de 50 anos, a principal causa de perda visual irreversível.

Há dois tipos de degeneração macular: a seca, que forma calcificações e apresenta alterações na pigmentação; e a exsudativa, que se manifesta quando a retina tenta revascularizar a área doente ou ocorrem hemorragias e edemas. Esta última, de acordo com Moura Brasil, é menos comum (corresponde a 10% do total de casos) e mais grave, porém de fácil tratamento.

— As pessoas estão vivendo mais, o que faz os problemas oftalmológicos se tornarem frequentes — comenta Moura Brasil.

Em sua palestra, o especialista também abordou o buraco de mácula, doença que tem levado muitos pacientes à mesa de cirurgia e que costuma atingir mulheres com mais de 60 anos que enfrentam problemas hormonais. Ela nada mais é do que uma bolha que se rompe no interior do olho.

— Trata-se de um problema que pode ser resolvido com uma cirurgia simples. O importante é não ficar com o buraco por muito tempo — informa Moura Brasil.