Rio

TCE diz que redução de prazo para testes na Linha 4 pode pôr em risco os passageiros

A inauguração do novo trecho está marcada para 1º de agosto, quatro dias antes dos Jogos Olímpicos
Obras na Estação São Conrado da Linha 4 do metrô, que ligará a Praça General Osório, em Ipanema, ao Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca: estado tenta obter liberação de empréstimo para concluir projeto Foto: Márcia Foletto/24-02-2016
Obras na Estação São Conrado da Linha 4 do metrô, que ligará a Praça General Osório, em Ipanema, ao Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca: estado tenta obter liberação de empréstimo para concluir projeto Foto: Márcia Foletto/24-02-2016

RIO — No mesmo dia em que o secretário estadual de Fazenda, Júlio Bueno, percorreu gabinetes, em Brasília, para tentar liberar dois empréstimos a serem usados na conclusão das obras da Linha 4 do metrô (Ipanema-Barra da Tijuca), o Tribunal de Contas do Estado (TCE) fez um alerta. Segundo o órgão, a redução do prazo de testes, de 16 meses para apenas dois, pode pôr em risco a segurança dos passageiros. A inauguração do novo trecho está marcada para 1º de agosto, quatro dias antes dos Jogos Olímpicos.

O presidente do TCE, Jonas Lopes Carvalho, considera curta a fase de testes antes de a linha entrar em operação, inicialmente para atender a “família olímpica” e o público que for assistir às competições. Ele observa que os testes operacionais, sem passageiros, começaram no dia 1º de junho e vão durar 60 dias. O plano original da Linha 4 previa 16 meses de testes e checagem de equipamentos (12 meses sem passageiros e quatro com usuários, em horário parcial). Eles deveriam ter começado em outubro de 2014 para serem concluídos em janeiro deste ano.

Segundo Jonas, as obras estão em ritmo acelerado, o que aumenta o risco de problemas técnicos. O presidente do TCE disse que é preciso cautela e lembrou o que aconteceu com algumas obras do legado olímpico: os buracos que surgiram na pista do novo Joá apenas dez dias depois da inauguração; a queda de um trecho da ciclovia da Avenida Niemeyer, em 21 de abril, que provocou a morte de duas pessoas; e as falhas na geração de energia para o VLT, deixando passageiros a pé entre as estações da Avenida Presidente Antônio Carlos e o Aeroporto Santos Dumont, numa de suas primeiras viagens.

SEM PILOTO AUTOMÁTICO

O presidente do TCE lembrou ainda que os trens do metrô circularão com intervalos de oito minutos, o dobro do previsto, porque a operação será manual. O sistema de piloto automático só será concluído em dezembro.

— Todos nós ficamos chocados com a queda da ciclovia da Niemeyer. A decisão sobre abrir ou não o metrô para a Olimpíada é política. Esse aviso do TCE não é uma torcida para que as coisas deem errado. Mas estamos fazendo um alerta às autoridades. E se um trem parar com uma pane entre os túneis? Será necessário um plano de contingência — disse o presidente.

Jonas Lopes afirmou que, se houver dúvidas sobre a segurança das operações, o estado deve levar em conta um plano B para o deslocamento das comitivas. Ele lembrou que a prefeitura vai criar faixas exclusivas para o uso das delegações.

O primeiro carro da Linha 4 do Metrô passa no chamado eixo olímpico Foto: Divulgação
O primeiro carro da Linha 4 do Metrô passa no chamado eixo olímpico Foto: Divulgação

As dúvidas sobre o metrô também levaram o TCE a aprovar ontem um relatório em plenário em que solicita que o estado apresente, no prazo de 30 dias, todos os documentos sobre testes feitos na linha que comprovem a segurança do sistema. No relatório, o auditor Rodrigo Melo do Nascimento (atuando na função de conselheiro substituto) afirma que a quantidade de obras ainda em execução e o ritmo acelerado da execução dos serviços nesta fase final “suscitam dúvidas quanto à suficiência do tempo reservado para todos os ajustes e testes necessários para a realização de uma operação segura e confiável". Cópias do relatório serão encaminhadas a diversos órgãos e entidades, incluindo o Comitê Olímpico Internacional (COI).

A Secretaria estadual de Transportes rebateu o TCE divulgando uma nota em que afirma que os passageiros não correrão risco. E que os tempos previstos nos testes operacionais são suficientes.

“O prazo de testes adotado na Linha 4 leva em consideração todos os procedimentos de segurança já adotados desde a inauguração do metrô, em 1979”, diz um trecho da nota.

A Secretaria estadual de Transportes afirmou ainda que, pelas regras atuais do contrato de concessão, ficou estabelecido que, antes de receber os passageiros, seriam feitos testes durante 90 dias. E que, na verdade, essa etapa vai ter uma duração até maior. O governo argumentou que os testes nos sistemas operacionais começaram em janeiro deste ano. E que os trens estão sendo avaliados desde junho de 2015, porque algumas composições adquiridas para a Linha 4 passaram a rodar nas Linhas 1 e 2.

O TCE, porém, contesta a informação, afirmando que, em dezembro de 2015, o estado assinou um aditivo ao contrato de concessão e de obras, reduzindo o prazo de testes para 60 dias.

“O governo do estado tem como diretriz a segurança absoluta do sistema metroviário, não abrindo mão de qualquer procedimento necessário à segurança dos seus passageiros”, diz outro trecho da nota.

Também em nota, a concessionária Metrô Rio, que assumirá a operação da futura ligação, afirmou que “todos os testes estão sendo realizados para que a operação da Linha 4 ocorra de acordo com os padrões internacionais de segurança”. Os consórcios Linha 4-Sul e Rio-Barra, responsáveis pelas obras, reafirmaram em nota que as regras de segurança estão sendo respeitadas.

Para o professor José Eugênio Leal, especialista em transportes da PUC-RJ, o prazo de dois meses para os testes operacionais pode ser suficiente para garantir a segurança da operação. Mas ele observa:

— Se o sistema de pilotagem automática não estiver ativo, isso exigirá que os maquinistas redobrem a atenção e respeitem rigorosamente a sinalização.

PÉRIPLO EM BRASÍLIA

Em relação à ida de Júlio Bueno a Brasília, o estado aposta numa solução para obter o empréstimo que também passa pela articulação política com o PMDB nacional, de modo a socorrer a economia do Rio e a obra do metro da linha 4 às vésperas das Olimpíadas e de uma eleição municipal. A ideia é trocar uma dívida por outra, recorrendo a brecha jurídicas.

O estado tenta receber um empréstimo do Banco do Brasil de R$ 1 bilhão para sair do Cadastro de Inadimplentes do Governo Federal (Cadin) e quitar dívidas com a própria União. O empréstimo do BB já foi aprovado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e também por uma resolução do Senado que permite estados prejudicados pela perda de arrecadação de royalties de se endividarem sem que esses empréstimos sejam usados nos cálculos dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O Rio foi incluído no cadastro de maus pagadores da União por por ter atrasado parcelas de serviços das dívidas interna e externa — esta última coberta pela União. Caso quite o débito, abre caminho para a liberação dos recursos do BNDES.

O Banco do Brasil preferiu não comentar as negociações. Bueno teve reuniões no Ministério da Fazenda, mas ainda não conseguiu fechar um acordo. Nos bastidores, peemedebistas fluminenses buscam uma solução política junto ao governo federal para a questão, já que, sem esse último financiamento, o Rio não teria outras fontes de receitas para sair do cadastro de devedores da União, o que inviabilizaria a transferência do recurso do BNDES (R$ 989 milhões).

Esta semana, o presidente interino Michel Temer afirmou que não faltaria verba para a Olimpíada do Rio, embora não tratasse especificamente da obra do metrô.

Os problemas de inadimplência do Rio se agravaram na semana retrasada, quando o estado deixou de pagar uma parcela de R$ 8 milhões de um contrato com uma agência francesa de fomento. Apesar do imbróglio, o governador em exercício, Francisco Dornelles, disse ontem espera liberar o dinheiro do metrô no prazo de um mês:

— Queremos que se pague ao Tesouro Nacional com esse R$ 1 bilhão (do empréstimo). Estamos com esperança que isso ocorra este mês — explicou Dornelles, ao participar de uma coletiva sobre um pacote de medidas de austeridade contra a crise.

LEIA MAIS:

Corte de despesas na Justiça gera polêmica entre magistrados

Estado estuda parcelar salários dos servidores

‘Calendário do 1º semestre da Uerj está totalmente comprometido’, diz reitor

Despesas do estado com servidores requisitados triplicaram

Inadimplência do estado ameaça conclusão de obras do metrô para os Jogos