Economia

Fazenda quer alongar dívida de estados em troca de limite com pessoal

Medida impulsionaria investimentos para sair da recessão
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BRASÍLIA - A equipe econômica quer negociar com os governadores um acordo para alongar as dívidas dos estados com a União por, pelo menos, dez anos, em troca da aprovação de leis locais que limitem gastos com pessoal e Previdência. Segundo técnicos do governo, essa medida daria mais fôlego para investimentos em um momento em que é

preciso tirar a economia da recessão. E, como seria combinada a ações para melhorar o perfil das despesas, não traria riscos para o equilíbrio fiscal. Além do alongamento, o governo quer concretizar logo a troca dos indexadores dos contratos de dívida e acelerar a liberação de empréstimos para os estados.

— Alongar os contratos e reduzir as prestações que precisam ser pagas à União a cada mês abre espaço para os estados. Mas, para que isso não vire um simples aumento de gastos, eles precisam se comprometer em conter pessoal e Previdência — disse um integrante da equipe econômica, lembrando que somente os gastos com folha de pagamento cresceram dois pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB) de 2007 até agora.

Secretários de Fazenda ouvidos pelo GLOBO comemoraram a iniciativa e lembraram que vários estados já estão caminhando na direção apontada pelo governo federal. O secretário do Estado do Rio, Julio Bueno, lembrou que tramita na Alerj uma proposta de Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que propõe mudanças na estrutura de gastos. Uma das regras é que qualquer aumento de despesa de pessoal deve estar condicionado ao incremento da Receita Corrente Líquida (RCL). Esses gastos só poderão subir se houver aumento real da RCL e, mesmo assim, estarão limitados a 70% desse incremento. Não pode ocorrer aumento com despesa de pessoal em caso de variação real negativa ou estagnação da receita.

— Nós teremos uma lei que vai ajustar a área pública estadual. São ações corajosas, que podem resultar em uma economia de R$ 13,5 bilhões — disse Bueno.

BRECHAS NA LRF

Goiás também já apresentou à Assembleia Legislativa uma proposta pela qual os gastos com pessoal não poderão ter crescimento real acima de 30% do aumento da receita. O Rio Grande do Sul, por sua vez, já conseguiu aprovar uma lei que estabelece medidas prudenciais para que o estado consiga estabilizar em patamares sustentáveis as despesas de pessoal, custeio e investimentos. Caso o gasto total com pessoal ultrapasse o limite máximo de 60% da RCL, haverá proibição de mais contratações e novos cargos.

A secretária de Fazenda de Goiás, Ana Carla Abrão, lembrou que, embora a LRF federal já fixe um teto para gastos de pessoal dos estados, há falhas no indicador. Ela ressaltou que a LRF determina que os gastos com pessoal não podem ultrapassar 49% da RCL e que a Dívida Consolidada Líquida (DCL) não pode ser duas vezes maior que a RCL. O problema é que o conceito de RCL contabiliza receitas que, na prática, não entram nos cofres dos estados. No caso de Goiás, por exemplo, a RCL inclui R$ 800 milhões de um fundo do Judiciário que não vai para o Tesouro local. Assim, os indicadores da LRF acabam mostrando um quadro mais favorável do que a realidade.

— É por isso que a preocupação do governo federal com os estados é importante. Não há solução para a crise econômica sem uma solução para os estados — disse Ana Carla.

Os técnicos do governo lembram que o alongamento das dívidas e a mudança dos indexadores — esta deveria ter ocorrido em 2015, mas foi adiada pelo então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por causa do ajuste fiscal — ajudam a minimizar um quadro perverso que se formou ao longo das últimas décadas. Os indexadores negociados no passado, IGP-DI mais 6%, 7,5% ou 9%, elevaram excessivamente as dívidas. Por isso, foi feito um acordo para que a correção dos contratos passe a ser feita pelo IPCA (usado na meta de inflação do governo) mais 4% de juros, ou pela Taxa Selic (hoje em 14,25% ao ano), o que for menor. O estoque atual das dívidas com a União é hoje muito maior do que o que foi negociado no final dos anos 1990. Assim, quando os contratos, que têm prazo de 30 anos, vencerem em 2028, muitos terão um valor residual elevado.

SECRETÁRIOS QUEREM CARÊNCIA PARA A DÍVIDA

No Rio, por exemplo, a dívida contratada no passado foi de R$ 23 bilhões, mas hoje está em R$ 69,6 bilhões. Segundo Bueno, o estado gastará R$ 9,3 bilhões com dívidas em 2016, sendo que, deste total, R$ 5,5 bilhões se referem ao contrato com a União. No caso do Rio Grande do Sul, os R$ 9,5 bilhões originais se transformaram em R$ 50 bilhões. O resíduo do governo gaúcho ao fim do contrato está estimado em R$ 35 bilhões.

— Isso tem que ser discutido. Não faz sentido um quadro como esse. Nós contratamos R$ 23 bilhões, já pagamos R$ 44 bilhões e hoje devemos quase R$ 70 bilhões — afirmou o secretário do Rio.

Segundo ele, a solução proposta pelo governo federal não será suficiente para solucionar o problema. O Rio, acompanhado de outros estados como o Rio Grande do Sul, defende que haja também uma carência para o pagamento das dívidas. A equipe econômica, porém, ainda resiste à ideia.

— O alongamento em dez anos e a mudança do indexador são insuficientes — disse Bueno.

A ideia da equipe do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, é implantar uma reforma fiscal pela qual a União também tenha um teto para seus gastos e adote uma meta de superávit fiscal flexível. Assim, a economia feita para o pagamento de juros da dívida pública poderia variar de acordo com o comportamento das receitas, mas daria margem para acomodar aumentos nos gastos. Essa ideia poderia ser estendida aos governos regionais futuramente, afirmam os técnicos.

O secretário do Rio considera a medida positiva. Ele afirma que, embora a medida demande alterações na LRF, é um aperfeiçoamento das regras ao quadro atual de crise econômica:

— A banda fiscal (para o superávit primário) é uma tese correta.

A intenção de Barbosa é fazer o debate sobre a reforma fiscal logo de modo que as novas regras, como teto para os gastos, sejam plurianuais e possam ser incluídas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a partir de 2017. Essa proposta precisa ser encaminhada ao Congresso em abril.