Economia

Jornal britânico ‘The Independent’ deixará de ser publicado em papel

Diário para de circular em março; edição digital continuará a ser produzida

Cópias do jornal britânico “The Independent”, que deixará de circular em papel em março
Foto: ADRIAN DENNIS / AFP
Cópias do jornal britânico “The Independent”, que deixará de circular em papel em março Foto: ADRIAN DENNIS / AFP

LONDRES - Três décadas depois de surgir, concorrendo em pé de igualdade com os tradicionais jornais britânicos, o periódico de centro-esquerda “The Independent” se despede do papel. Foi anunciado ontem que a última edição impressa do “Indy”, como era conhecido pelos locais, sairá em 26 de março, um sábado. A última edição dominical será publicada no dia 20 do mesmo mês. O mais jovem dos principais jornais britânicos, fundado em 1986, é o primeiro a migrar integralmente para o digital.

A decisão não surpreendeu os especialistas. O jornal não ia bem há algum tempo. Sua tiragem caiu de 428 mil, no início dos anos 1990, para cerca de 57 mil exemplares diários em dezembro de 2015. Nas últimas semanas, havia rumores de que ocorreriam mudanças drásticas. Foi o próprio dono, o bilionário russo Evgeny Lebedev — que em 2010 comprou o “Independent”, então mal das pernas, por apenas uma libra (R$ 5,75 hoje) —, que anunciou a novidade por meio de uma carta aos funcionários na manhã de ontem.

‘FINANCEIRAMENTE INSUSTENTÁVEL’

O grupo também anunciou a venda do jornal “i” à concorrente Johnston Press por 24 milhões de libras (R$ 138 milhões). O “i”, lançado em 2010, traz notícias curtas, de leitura rápida, e custa menos. Sua tiragem é de 275 mil exemplares diários. A operação não terá efeito sobre o diário gratuito “The Evening Standard”, que também pertence a Lebedev e que está no azul.

A aposta de Lebedev agora é a edição digital, cuja audiência, segundo dados do jornal, cresceu 33%. E ele projeta aumento de 50% com as receitas on-line. Mas, para o especialista da Universidade de Sheffield Mark Bradley, a migração por si só não é capaz de garantir o sucesso do jornal. Ele acredita que a edição terá de sofrer reformas importantes para oferecer um conteúdo diferenciado aos leitores.

— Ironicamente, eles faziam isso com o papel. O “Independent” ficou conhecido por capas e edições célebres. A ironia está no fato de que eram mais conhecidos pelo que produzem no papel do que na plataforma digital. Eles terão de investir no jornalismo — afirmou Bradley.

Já Charlie Beckett, diretor da Polis, think tank de jornalismo da London School of Economics (LSE), onde também é professor, acredita que o “Independent” era financeiramente insustentável:

— O fechamento do “Independent” é o reconhecimento da dura realidade do setor de jornais do Reino Unido, onde há hoje títulos demais operando em um mercado hipercompetitivo. A isso se soma a nova disputa digital, combinada ao colapso da renda com publicidade.

Para Beckett, a versão on-line também tem pela frente a difícil tarefa de competir com o conteúdo de outros jornais já estabelecidos, além de plataformas digitais como Buzzfeed e Politico, e marcas internacionais como o “New York Times”.

Ao GLOBO, o diretor-geral da Associação Mundial de Periódicos e Editores de Jornais (WAN-Ifra, na sigla em inglês), Vincent Peyrègne, admitiu haver uma forte tendência de migração para o digital, mas ressaltou que isso não necessariamente é prejudicial ao mercado:

— A prioridade é a audiência. E os jornais terão de se adaptar. O importante é que a imprensa continue mantendo seu papel plural e independente, seja em meio físico ou digital. O público é o alvo, e não o seu apoio.

O “Independent” sempre foi considerado ousado e moderno. E ainda era levemente republicano, não dando muito espaço para as efemérides da família real.