• Texto Marilena Dêgelo | Realização Nuria Uliana | Fotos Victor Affaro
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Fachada | O arquiteto Marko Brajovic está no terraço da construção, cuja cobertura metálica de módulos Galvalume, da Expobrax, remete a uma concha e termina como paredes laterais (Foto: Victor Affaro)

Fachada | O arquiteto Marko Brajovic está no terraço da construção, cuja cobertura metálica de módulos Galvalume, da Expobrax, remete a uma concha e termina como paredes laterais (Foto: Victor Affaro)

Zion, 2, e Zoe, 6 anos, tomam banho na cachoeira com seus pais. Em seguida, percorrem uma trilha no meio da mata para se abrigarem em uma construção que parece uma arca, uma concha ou uma oca. A estrutura metálica curva, em contraste com a vasta vegetação, poderia ser ainda uma nave alienígena que pousou em uma clareira de antigo bananal na Serra da Bocaina, na cidade de Paraty, no Rio de Janeiro. A idealização da forma, que dá asas à imaginação, é do arquiteto croata Marko Brajovic, pai das crianças, que, ao lado da mulher Thereza, experimenta o convívio pleno com a natureza na casa de 110 m².

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A inspiração para esse projeto surgiu durante o período que Marko passou em uma aldeia indígena no Acre. “Fiquei fascinado pelo uso multifuncional dos espaços únicos nas casas. É uma vivência plena, livre, típica dos índios”, conta o arquiteto. A imagem de uma construção da tribo Asurini, no Médio Xingu, ajudou-o a encontrar um formato que proporcionasse a convivência que ele buscava para sua família e, ao mesmo tempo, o uso do espaço para receber pessoas em grupos de imersão na mata, com base na biomimética.“Pensei em uma solução que possibilitasse criar a área interna independente da estrutura na cobertura; pensei em uma pele única para não haver diferenciação entre paredes e teto, que se autossustentasse e me desse liberdade.”

A partir dessas premissas, Marko buscou uma tecnologia que lhe permitisse usar o mesmo material como estrutura e fechamento. Encontrou, então, a empresa Expobrax, que importa de Israel uma cobertura empregada em hangar de avião. “É uma chapa metálica que, além das características que proporcionam isolamento térmico, porque reflete luz solar, minimiza o barulho da chuva por causa do perfil e da textura, que resulta em tratamento acústico”, explica o arquiteto. Segundo ele, a cobertura se sustenta devido à geometria ondulada, presente em vários organismos naturais, como a concha do mar.

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Sob a cobertura, o arquiteto criou volumes de madeira nas laterais que não chegam até o teto, onde deixou a estrutura metálica aparente. No centro da planta livre, ficou o espaço amplo do living, ambientado com sala de estar e sala de jantar, junto à cozinha separada apenas por balcão. De um lado, o volume abriga dois quartos iguais, com um futon de casal e dois de solteiro que viram sofás. Em vez de armário, bancada multiúso. “Costumo ir com amigos, que ocupam um quarto. No outro, eu fico com minha família”, diz o arquiteto. “Dormimos com nossos filhos, como fazem os índios.” Do outro lado, ele instalou o banheiro.

O mais interessante no projeto é a integração com a natureza, vista de todos os ambientes internos pelos vidros das esquadrias de alumínio que fecham as fachadas da frente e dos fundos. Outra característica importante, e sustentável, é a rapidez da obra. “Transportados em uma picape, minimizando o gasto energético, os módulos (compostos de aço, alumínio e zinco) da cobertura foram montados em apenas duas semanas”, explica Marko. O restante da construção executada pela comunidade local, consumiu quatro meses. Sobre base de pilotis de concreto foram colocadas a estrutura do piso e os volumes de madeira, as esquadrias de alumínio e as instalações elétricas e hidráulicas. “A casa pode ser desmontada em uma semana e levada para outro local”, diz Marko. “Isso a torna uma estrutura nômade. Se eu cansar daqui, monto em outro terreno. É ideal para a geração atual, que é nômade.”

Os volumes de madeira têm paredes estruturais de 5 cm, confeccionadas pelo artesão Lindomar Princisval. Dentro das tábuas de 15 cm de largura, há barras de aço enroscadas em dois parafusos tensionados.“É uma técnica construtiva que desenvolvemos juntos. A estrutura sinergética trabalha por tensão com paredes rígidas, e não compressão, que é o paradigma das casas. Com isso minimizamos o uso de materiais, como vigas”, conta o arquiteto. Segundo ele, a construção brinca com a força da gravidade,porque não tem peso. “A forma é leve como uma cesta, pois, como sugeriu o escritor Ítalo Calvino, o século 21 tem o signo da leveza.”

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Para Marko, a casa é experimental e tem dois manifestos: ao estilo de vida e ao modo de fazer arquitetura. A integração com o entorno devido à leveza da forma e à adaptação ao terreno, sem mexer na topografia, dá o perfil orgânico à casa, mas o material usado cria contraste futurista e interessante com a natureza. “Eu quis esse contraste do orgânico com o imaginário que seduz.”

Living | O espaço de convivência tem uma visão ampla da mata através dos vidros, de 85 x 85 cm, na esquadria de alumínio, que chega a medir mais 5 m na parte mais alta da semiabóboda (Foto: Victor Affaro)

Living | O espaço de convivência tem uma visão ampla da mata através dos vidros, de 85 x 85 cm, na esquadria de alumínio, que chega a medir mais 5 m na parte mais alta da semiabóboda (Foto: Victor Affaro)

Sala de estar | Marko brinca com Zion no pufe da Brasilazy. Atrás, o volume feito de eucalipto autoclavado abriga dois quartos, que têm portas de correr com tinta lousa para serem usadas em encontros de grupos de imersão (Foto: Victor Affaro)

Sala de estar | Marko brinca com Zion no pufe da Brasilazy. Atrás, o volume feito de eucalipto autoclavado abriga dois quartos, que têm portas de correr com tinta lousa para serem usadas em encontros de grupos de imersão (Foto: Victor Affaro)

Sala de jantar | O balcão de madeira com tela metálica separa a cozinha equipada com eletrodomésticos de inox e pendentes da Tok&Stok (Foto: Victor Affaro)

Sala de jantar | O balcão de madeira com tela metálica separa a cozinha equipada com eletrodomésticos de inox e pendentes da Tok&Stok (Foto: Victor Affaro)

Banheiro | Em cima da caixa de madeira fica um boiler de 300 litros com água aquecida por sistema elétrico. No centro, a bancada tem pia típica de barco (Foto: Victor Affaro)

Banheiro | Em cima da caixa de madeira fica um boiler de 300 litros com água aquecida por sistema elétrico. No centro, a bancada tem pia típica de barco (Foto: Victor Affaro)

Boxe | A porta na esquadria de alumínio permite o acesso por fora e passar direto pela ducha de 50 cm de diâmetro com monocomando, da Grohe (Foto: Victor Affaro)

Boxe | A porta na esquadria de alumínio permite o acesso por fora e passar direto pela ducha de 50 cm de diâmetro com monocomando, da Grohe (Foto: Victor Affaro)

Quarto | A parede e o teto são revestidos de tábuas de eucalipto autoclavado tratado e envernizado iguais às do assoalho. Cama com futon de casal da Futon Company. Móveis executados pelo artesão Lindomar Princisval (Foto: Victor Affaro)

Quarto | A parede e o teto são revestidos de tábuas de eucalipto autoclavado tratado e envernizado iguais às do assoalho. Cama com futon de casal da Futon Company. Móveis executados pelo artesão Lindomar Princisval (Foto: Victor Affaro)

Terraço | Na fachada dos fundos, o assoalho continua com o deque. O guarda-corpo tem estrutura metálica e cabos de aço tensionados. Dois painéis de correr abrem no meio da esquadria de alumínio cor chumbo (Foto: Victor Affaro)

Terraço | Na fachada dos fundos, o assoalho continua com o deque. O guarda-corpo tem estrutura metálica e cabos de aço tensionados. Dois painéis de correr abrem no meio da esquadria de alumínio cor chumbo (Foto: Victor Affaro)

Protegida da insolação pelas árvores, acasa é suspensa por pilotis de concreto, evitando o contato direto com a umidade do solo. Na cobertura, dois exaustores compõem o sistema de ventilação natural, levando o ar quente para fora (Foto: Victor Affaro)

Protegida da insolação pelas árvores, acasa é suspensa por pilotis de concreto, evitando o contato direto com a umidade do solo. Na cobertura, dois exaustores compõem o sistema de ventilação natural, levando o ar quente para fora (Foto: Victor Affaro)