Política crise política

Com discurso de ameaças, Cunha mantém influência na Câmara

Mas para auxiliares de Temer, aliados de deputado se afastarão aos poucos

presidente afastado da Câmara tem fidelidade de parte dos deputados
Foto: Michel Filho / Agência Câmara/18-5-2016
presidente afastado da Câmara tem fidelidade de parte dos deputados Foto: Michel Filho / Agência Câmara/18-5-2016

BRASÍLIA — “Se eu renunciar, vocês têm alguma dúvida de que vou preso? E se eu for preso, vocês acham que vou sozinho?”. O diagnóstico seguido de ameaça foi feito pelo presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a um grupo de deputados dias após a decisão do Supremo Tribunal Federal determinar seu afastamento do cargo e do mandato. As colocações de Cunha aos aliados servem para ilustrar, em parte, o poder que ele continua a exercer sobre seus pares, e até mesmo sobre o governo do presidente interino Michel Temer.

A fidelidade de deputados a Cunha se justifica por motivos diversos. Vão desde o receio de serem expostos; passam pela dívida de gratidão por ele ter ajudado financeiramente em campanhas, dado relatorias de projetos importantes e por ter acatado o impeachment de Dilma Rousseff; e chegam até a amizade e sociedade em empreitadas.

Apesar da força que demonstrou na última semana, no Palácio do Planalto há a avaliação de que se acelerou o processo de perda de musculatura do deputado desde que ele foi afastado. E também que os atores que hoje atuam influenciados por Cunha passarão a pensar, cada vez mais, nas próprias histórias e respectivas sobrevivências. A tendência, para auxiliares do presidente interino, é que os “generais de Cunha”, como se referem aos deputados André Moura (PSC-SE), Jovair Arantes (PTB-GO), Rogério Rosso (PSD-DF) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), passem a se afastar do comandante da tropa.

— Na medida em que se estreita a possibilidade de Cunha voltar à Câmara, cada um desses aliados tem mais ganas de sentar na cadeira dele. Quando esse espaço for ocupado, a força dele perde pelo menos mais 50% da potência que já teve — afirma um interlocutor de Temer.

São esses “generais” os responsáveis pelo leva e traz de Cunha ao Planalto nos últimos dias. Segundo relatos de auxiliares de Temer, esses deputados fizeram todo o movimento para emplacar aliados de Cunha no governo. A operação começa na residência oficial da presidência da Câmara, onde Cunha vive e despacha diariamente, e que é frequentada pelos aliados como se de seu gabinete político se tratasse. Os deputados coletam as informações com o peemedebista e as levam ao Planalto e para os demais deputados de suas bancadas.

IRA CONTRA PLANALTO

Alguns do governo acreditam que, com as afrontas aos seus investigadores, Cunha vai acabar sendo preso. E o que o governo não quer é ser responsável por isto e ver a ira dele se voltar contra o Planalto. Portanto, a ordem, no momento, é atendê-lo no que for possível para evitar ataques. Exemplo disto foi a escolha de André Moura para a liderança do governo. Apesar de ter aceito a indicação de Cunha, aliados de Temer são enfáticos:

— André Moura é líder do governo até quando estiver servindo ao governo. E, pragmático como é, Cunha não vai nos prejudicar. Se tem alguém que pode acolhê-lo politicamente é a base do governo, que é comandada, obviamente, pelo governo. Para ajudá-lo, o governo pode oferecer aos deputados cargos, emendas, liberação de obras. Ele sabe que entrar numa disputa com o Planalto, desta vez, não é uma boa — diz fonte próxima Temer.

Apesar de dizer que não indicou “nem um alfinete” para o governo Temer, vários aliados de Cunha ingressaram no coração do novo governo. Cunha, no entanto, nega estar exercendo qualquer influência sobre o governo e diz que não há o que temer.

— Não estou exercendo qualquer influência em nada. E ninguém tem motivos para qualquer temor porque não tenho nada para expor de nenhum deputado. Amizade, eu tenho muitas. Fui eleito por maioria absoluta em primeiro turno e contra o governo em início de mandato — afirmou ao GLOBO, por meio de mensagem.