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Abandono toma conta do campus da Universidade Gama Filho

Ameaçada com descredenciamento pelo MEC, faculdade em crise tem instalações sem manutenção e depredadas em sua sede, no Rio
Professor em sala da Gama Filho, com carteiras entulhadas e livros no chão Foto: Cezar Loureiro / Agência O Globo
Professor em sala da Gama Filho, com carteiras entulhadas e livros no chão Foto: Cezar Loureiro / Agência O Globo

RIO - O cenário na sede da Universidade Gama Filho é triste. Carteiras entulhadas no pátio, janelas e portas quebradas, uma piscina olímpica suja, cadáveres da faculdade de Medicina em decomposição e laboratórios depredados por bandidos que invadiram o local. Enfrentando seguidas greves de professores devido a falta de salários e ameaçada com descredenciamento pelo MEC, a instituição tem seu campus principal, no bairro de Piedade, Zona Norte do Rio, aparentemente abandonado.

Veja fotos do abandono e da depredação no campus da Gama Filho, em Piedade.

Assim como a UniverCidade, também administrada pelo grupo Galileo Educacional, a Gama Filho está afundada numa crise financeira. Muitos alunos já estão providenciando transferência para outras instituições. Na última terça-feira, O GLOBO esteve no campus de Piedade e constatou diversos problemas estruturais. Banheiros, sujos, dão espaço para uma família de gatos, pretos. No laboratório do curso de Medicina, cadáveres usados para fins didáticos apodrecem por falta de formol.

Diante de tal cenário, o estudante do quinto período do curso de Engenharia Elétrica, Rubens Miguel, tenta obter a transferência para outra universidade. Bolsista integral e com notas acima da média, Rubens tentou a PUC, mas não conseguiu. Agora, bate na porta da Veiga de Almeida. Para ele, esta pode ser uma opção para não enfrentar o caos dentro da Gama Filho.

- A faculdade está às moscas. No final do ano, alguns professores deram aulas mesmo com a greve. Eu fiz uma prova no fim de dezembro, o campus estava completamente abandonado, só tinha minha turma lá, sem nenhum funcionário trabalhando. Um risco grande de ser assaltado.

E, de fato, houve assaltos. Na virada do ano, bandidos aproveitaram a falta de segurança do campus para levar computadores do laboratório de informática, retroprojetores e bijuterias de um quiosque. Até a lanchonete eles esvaziaram. Por isso, a maioria das portas começou 2014 trancadas, por motivos de segurança. Sem ter sido avisado de tal, o professor de engenharia Marcelo Duarte acabou tendo que aplicar uma prova final a três alunos num bar, a ruas de distância do campus.

- Mesmo se quisermos dar aula sem receber, fica difícil assim - desabafa.

Descredenciamento mais próximo

Desde que o Grupo Galileo assumiu as mantenças da Gama Filho e UniverCidade, cerca de mil docentes foram demitidos, enquanto mensalidades sofreram aumentos repentinos de até 40%. Conforme O GLOBO mostrou em agosto do ano passado, a crise das universidades particulares se agravou  em 2011, quando o grupo financeiro Galileo Educacional adquiriu a Gama Filho e a UniverCidade. Embora fossem instituições filantrópicas, sem fins lucrativos, as transações renderam mais de R$ 234 milhões aos antigos donos , segundo ações judiciais às quais o jornal teve acesso.

Somente no ano passado, professores e funcionários da UGF entraram em greve três vezes por atrasos salariais e dívidas trabalhistas. Num espaço de seis meses, o MEC suspendeu, liberou e suspendeu novamente os vestibulares das duas instituições, após a Galileo descumprir o termo de saneamento de deficiências.

Nesta terça, um grupo de 50 estudantes ocupou a sede do MEC exigindo uma reunião como o ministro da Educação, Aloizio Mercadante. Eles conseguiram o encontro, no qual Mercadante foi categórico ao afirmar que as instituições podem vir a ser fechadas, se não houver melhorias.

Durante a reunião, o ministro lembrou que o MEC já havia suspendido os vestibulares de ambas. Ele disse também que, se as faculdades descumprirem as exigências do termo de saneamento de deficiências, assinado em outubro por representantes da pasta e do Galileo, as instituições serão fechadas.

- Se a resposta das instituições fossem satisfatórias, não teríamos suspendido o vestibular. A suspensão é uma medida duríssima. Com os problemas que nós temos, como podemos permitir a entrada de novos estudantes? A suspensão mostra que nós achamos que eles não estão cumprindo o termo. E se continuarem não cumprindo, está no acordo que fizemos e que eles assinaram, fecha!

Após a reunião no MEC, o órgão anunciou a criação de uma comissão formada representantes do ministério, alunos da UGF, UniverCidade, e um membro da União Nacional dos Estudantes (UNE), para discutir a transferência assistida dos estudantes para outras faculdades e universidades. O fantasma do descredenciamento, que nos últimos dias assombrou membros da comunidade acadêmica, agora parece estar se tornando realidade.
Depois de anos de crise, seria um fim melancólico para duas grandes universidades. Com 75 anos de história, a Gama Filho tem cerca de 9 mil alunos. Fundada em 1969, a UniverCidade conta hoje com 6 mil estudantes.