Esportes

Rafaela Silva é ouro no Mundial de Judô

Judoca é a primeira brasileira a subir ao lugar mais alto do pódio na competição
ES Rio de Janeiro (RJ) 28/08/2013 - Mundial de Judô. Rafaela Silva bate americana na final e é campeã mundial de judo até 57kg. Foto: Marcelo Carnaval/Agência O Globo Foto: Marcelo Carnaval / Agência O Globo
ES Rio de Janeiro (RJ) 28/08/2013 - Mundial de Judô. Rafaela Silva bate americana na final e é campeã mundial de judo até 57kg. Foto: Marcelo Carnaval/Agência O Globo Foto: Marcelo Carnaval / Agência O Globo

RIO - Uma atleta comum teria desistido. Mas não alguém com o DNA e destino de campeã. Eliminada em Londres-2012, por um golpe considerado ilegal e xingada nas redes sociais, Rafaela Silva até pensou em mudar de categoria, mas continuou peso-leve (até 57kg). Ainda bem, porque ontem, no Maracanãzinho, tornou-se a primeira brasileira campeã mundial da modalidade, ao aplicar um ippon sobre a americana Marti Mallori, com 50s de combate. Esta é a terceira medalha do Brasil neste Mundial, antes o país conquistou o bronze de Sarah Menezes e a prata de Érika Miranda .
FOTOGALERIA: A trajetória de Rafaela no Maracanãzinho

Rafaela ouviu o hino nacional no pódio, ladeada por Mallory e pelas medalhistas de bronze, a eslovena Vlora Bedeti e a alemã Miryam Roper. A também brasileira Ketleyn Quadros havia sido eliminada por Malloy nas oitavas.

Para a campeã, que comemorou com os pais, Luiz Carlos e Zenilda, a irmã Raquel e a sobrinha Ana Carolina, o título teve o sabor de volta por cima.

— Foi muito bom para calar quem me criticou e que disse que lugar de macaca era na jaula. O esporte não depende da cor nem de nada — enfatizou Rafaela. — Puseram mensagens nas redes me criticando, dizendo que eu era uma vergonha. Vim para ser campeã mundial na minha cidade. No meu país ninguém me tiraria este ouro.

Criada na Cidade de Deus, ela começou ainda criança, por influência dos pais, para ser campeã mundial adulta, medalhista de prata no Mundial Adulto de Paris, em 2011, e de ouro no Mundial Júnior, na Tailândia, em 2008. Atualmente, é a quarta do ranking mundial.

— Muita gente tem talento e garra, mas não tem dinheiro para investir — comentou a atleta do Instituto Reação, do ex-judoca Flávio Canto. — É muito bom vir de comunidade carente e dar exemplo às crianças. Não é só quem tem dinheiro ou mora num lugar bacana. Saí da Cidade de Deus e estou aqui, conhecendo grande parte do mundo.

Para chegar ao título, a carioca de 21 anos estreou derrotando a americana Hana Carmichael. Depois, bateu a romena Loredana Ohai, e em seguida, nas quartas, superou Nora Gjakova, do Kosovo. Na semifinal, contra a francesa Automne Pavia, bronze em Londres-2012 e número um do ranking, a brasileira conseguiu se impor por wazari, e assim, avançou à final contra Malloy, também bronze em Londres.

— O juiz tinha apontado wazari, mas vi que a mesa dera ippon (golpe perfeito, que decide a luta), e foi só felicidade. Ainda nem parei para pensar que sou campeã, que estou fazendo história. Se Deus quiser, vou buscar o ouro olímpico em casa, em 2016 — declarou ela, que agradeceu ao primeiro técnico, Geraldo Bernardes, recordou a memória do amigo Silvestre Travassos e comentou a importância da participação da treinadora japonesa Yuko Fujii, que está no país há alguns meses. — Yuko foi muito importante. Ela sempre me incentivou e me corrigiu.

Japonês campeão no masculino

Vestidos com uma camiseta com a inscrição “Keep calm (Fique calmo) e hoje tem Rafaela Silva”, os parentes dela foram abraçá-la e beijá-la.

— Ela (Rafaela) nem queria entrar no judô e começou de brincadeira, em dúvida entre o judô e o futebol — contou a mãe, Zenilda.

Ao lado, o pai, Luiz Carlos, comentou que o primeiro técnico de sua filha, Geraldo Bernardes, sempre apostou nela:

— Eu achava que ela jogava futebol bem, mas o Geraldo sentiu que o futuro dela estava no judô.

Tão alegres quantos os pais, estavam Geraldo e Rosicleia Campos, técnica do feminino em licença-maternidade.

— Com uns 8 anos, parecia uma moleque de rua, jogando bola e sendo expulsa da escola. Hoje, ela é uma mulher feita, campeã do mundo e na vida, que está cursando o primeiro semestre de psicologia — declarou Geraldo.

Quase sem voz, de tanto gritar da tribuna, já que não podia ficar ao lado do tatame, Rosicleia estava emocionada.

— Este ano, eu já tinha ganho meus dois ouros (filhos gêmeos), e agora isto. Rafaela adora desafios, e precisa ser desafiada. É guerreira na vida, nos tatames e campeã mundial — elogiou, antes de revelar. — Rafaela está amando, e quando se está bem na vida pessoal, vai leve para o tatame. Ela merece ser feliz.

O superintendente técnico da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), Ney Wilson observou que era a única medalha que o judô brasileiro não tinha.

— Agora, tem todas no masculino e feminino. O feminino cresceu em velocidade meteórica nos últimos cinco anos, e os ouros da Sarah e da Rafaela são marcos. Calculei que chegaríamos a seis medalhas , incluindo um ouro no feminino. Podemos ultrapassar isso.

Hoje, a programação tem início às 10h, no Maracanãzinho, com transmissão do Sportv. Pelo Brasil, lutam os meio-médios Victor Penalber (81kg) e Katherine Campos (63kg).

Ontem, no masculino, o japonês Shohei Ono foi o medalhista de ouro, com o francês Ugo Legrand ficando com a prata, e o holandês Dex Elmont e o belga Dirk Van Tichelt com o bronze. Foi o terceiro ouro japonês em três possíveis, após o fracasso em Londres-2012.