• Gustavo Silva
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Erick Jacquin, consultor do Le Bife, durante a abertura do restaurante em São Paulo (Foto: Gustavo Silva)

Erick Jacquin, consultor do Le Bife, durante a abertura do restaurante (Foto: Gustavo Silva)

Erick Jacquin conversa de onde reina incontestável. O chef - e agora personalidade de TV graças à sua participação como jurado no reality culinário MasterChef, que chega à sua segunda temporada no Brasil - fala da cozinha enquanto observa a preparação dos pratos que serão servidos aos convidados da inauguração do Le Bife, novo restaurante em São Paulo onde, dessa vez, ele atua apenas como consultor.

A casa, como o nome denuncia, é especializada em carnes e aposta no conceito de bistronomie - cortes como o entrecôte e guarnições como as essenciais fritas são carros-chefe do local. O steak tartar, uma das especialidades do consultor do restaurante, também faz parte do cardápio.
 

A fama de Jacquin ser dono de uma personalidade pouco afável - algo que, para muitos, fica em evidência em suas críticas aos participantes do programa - se dissipa ao longo da entrevista que o chef concedeu à GQ Brasil. O humor peculiar, seco, mas saboroso como um Dry Martini, está em quase todas as respostas - inclusive naquelas sobre perguntas que sequer foram terminadas - e nas cobranças da equipe da cozinha.


Talvez não por acaso, o tópico 'loucura' apareça ao final da conversa - com trilha-sonora imaginaria do ícone francês Serge Gainsbourg, com quem Jacquin conviveu e para quem cozinhou por anos. Mas gastronomia, fama e MasterChef aparecem como pratos principais do bate-papo, que você confere logo abaixo:  

O salão principal do Le Bife, restaurante especializado em carnes (Foto: Divulgação)

O salão principal do Le Bife, restaurante especializado em carnes (Foto: Divulgação)

Começando sobre o novo restaurante, o Le Bife, li uma entrevista do ano passado que você diz que...
(interrompendo) Nunca vou abrir restaurante, vou dar consultoria. É diferente. Esse não é meu. Nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho. Nunca mais vou abrir um restaurante – por enquanto. Mas vai demorar muito se eu for abrir. Hoje sou consultor, vendi esse conceito, inventei – bom, não inventei, porque ninguém inventa nada –, botei no papel, teve gente que quis investir, e topou. Ajudei a fazer, acompanhar e pronto.


Então você mantém a ideia de não abrir um restaurante?
Por enquanto, não. Não vou abrir restaurante.


No que a fama da TV modificou a vida/ profissão? Ajuda, atrapalha?
É diferente. Sou muito mais conhecido, por conta da TV aberta. Dá a oportunidade de eu chegar a outras classes sociais, a outras pessoas. Acho muito bom, eu gosto. Sou uma pessoa que gosto da vida, gosto de dar risada, beijar, abraçar, tirar foto. Gosto do que faço. Não posso reclamar, sou feliz.


Você tem a fama de ter uma personalidade difícil. Quanto há de personagem no Erick do MasterChef – e o quanto você tem de se conter nas críticas?
Eu acho que não tenho dupla personalidade. Sou igual na comida, no restaurante, na cozinha e na TV. Acho que é por isso que fui escolhido, porque sou desse jeito. Não tenho medo de falar o que todo mundo pensa, mas não tem coragem de falar. Sou verdadeiro, falo o que penso. Se devo falar merda, eu vou falar merda. Se tiver que falar ‘meus parabéns’, eu vou falar ‘meus parabéns’. Quem trabalhar comigo sabe disso. Posso brigar, mas depois levo todo mundo pra tomar cerveja, não tenho problema.


No início, quando você chegou ao Brasil, você tinha planos de passar um tempo, fazer dinheiro aqui e voltar para a França e abrir um restaurante.
E fiz tudo o contrário. Vim, perdi o dinheiro – que não tinha – e estou aqui ainda para pagar o dinheiro que eu devo. Você vê como é a vida? A gente nunca sabe o que vai ser dela, o que a gente vai fazer. Mas de uma coisa a gente não pode reclamar: ainda que eu esteja numa fase complicada, não posso reclamar da vida. Tem gente em estado muito pior que o meu.


O que é mais difícil: tocar uma cozinha, ser administrador ou lidar com câmeras da TV?
Não sei. Não sei o que é mais difícil. Depende do que se gosta e do que se sabe fazer.


O que você gosta menos então?
Conversar com jornalista (sorri). Não sei. Administrar é muito fácil quando tá tudo certo e você tem dinheiro. Na cozinha, quando você tem os melhores do seu lado é maravilhoso. O programa na televisão tem um ibope maravilhoso. Tudo depende das circunstâncias da sua vida. Os três valem juntos. É isso o que eu sou hoje.

Um dos salões do Le Bife, em São Paulo (Foto: Divulgação)

Um dos salões do Le Bife, em São Paulo (Foto: Divulgação)

Como jurado, como você enxerga a linha que separa a crítica do bullying no programa?
Nada é pessoal. Meu paladar é que manda. É bom ou é ruim. Às vezes você dá um toque para acelerar as coisas. Você falar que ‘é ruim’, ‘não é bom’, não é suficiente. Tem que colocar uma pressão. ‘Olha esse peixe, estava tão bonito e agora tá péssimo’. Isso é para valorizar o trabalho ou ajudar a mudar para ser melhor. Eu fui criado com muita dureza. O talento não é suficiente. Você pode nascer com talento para ser músico, pintor, mas não é suficiente. Se você não trabalha, o talento fode a sua vida. Quando você pensa ser o melhor, tá fodido da vida. Precisa trabalhar. Se você é o melhor, você já tem uma vantagem diante dos outros. Mas sem trabalho você é nada, absolutamente nada.


Alguma vez você se arrependeu de alguma crítica a algum funcionário ou participante do programa?
Não, não. Por que eu vou me arrepender? Pode ser que eu vá pensar “ah, eu fui duro”. Mas se eu critico, é porque tá ruim. Eu sou o chef, eu que decido o que é bom ou ruim. Às vezes você pode ser muito duro, e me arrependo às vezes. Mas depois eu resolvo. Falo “Oh, vamos tomar cerveja. Você foi bom por isso, ruim por aquilo”. A maioria das pessoas agradece depois. Quem quer ser chef de cozinha ou um bom cozinheiro, tem que ouvir que ‘tá errado, ‘tá bom’, ‘tá ruim’. Mas eu nasci na história antiga, fui criado desse jeito. Eu sei que hoje é diferente, a maioria dos ruins nunca vai ceder. Dizem ‘então me manda embora’. Se um cara te responde isso, você já sabe que ele não quer ser [chef de cozinha]. Então mando embora e acabou.


Já houve algum prato que exigiu muita coragem para ser degustado no Master Chef?
Teve um cara lá no início do MasterChef nesse ano que fez um pudim de peixe que nem levantei, não fui provar. Olhei pro Fogaça, olhei pra Paola e não aguentei. Fiz isso [movimenta o dedo indicador em sinal de negação]. Tava podre, tava cheirando. Se eu ficasse do lado, vomitava.


Você apresenta um humor bem peculiar no programa, que eu particularmente gosto...
(interrompendo) Que bom. Tem gente que não gosta. Mas é bom que todas as pessoas não gostem de você, porque deixa gente para você conquistar. É bom que tem gente que fala que ‘o Jacquin é um puta idiota’ porque eu vou conquistar, provar que não é verdade.


E você tem alguma referência no humor?
Não tem isso. Mas eu tive vários patrões loucos. Acho que a loucura é contagiosa. Tive muito chefe louco, doido. Tive chance de cozinhar pra gente muito diferente. Cozinhei para o Serge Gainsbourg (músico, cantor e compositor francês), mas não uma vez – duas, três vezes por semana por três anos. Tomava vinho com ele todo o dia. Isso muda uma vida, não tem jeito. Na época não tinha telefone celular, não tinha nada, a gente não tinha uma foto. Hoje as pessoas não conversam, só tiram foto. O cara chega no restaurante, nem olha pra mulher dele e tá lá, olhando as gostosas no Instagram, no Facebook. Pô, ninguém conversa mais. Eu twitto às vezes, me divirto usando o Instagram. Mas quando vou jantar no restaurante, não vou twittar. Vou jantar com a pessoa que está comigo.