17/03/2014 20h48 - Atualizado em 17/03/2014 20h48

Músicos divergem sobre direitos autorais; STF julgará ação neste ano

Supremo fez audiência pública para discutir tema e embasar julgamento.
Ações no STF questionam Lei dos Direitos Autorais, aprovada ano passado.

Mariana OliveiraDo G1, em Brasília

Representantes de músicos e compositores divergiram nesta segunda-feira (17) sobre as regras em relação aos direitos autorais durante audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF). O debate vai embasar o julgamento de duas ações que tramitam no tribunal e contra a Lei de Direitos Autorais para obras musicais, aprovada pelo Congresso no ano passado.

Nas ações, o Escritório Central de Arrecadação de Direitos Autorais (Ecad) e a União Brasileira de Compositores (UBC) questionam trechos da lei que estipulam como de "interesse público" a atuação dos órgãos de arrecadação e determinam a divulgação de valores arrecadados com direitos autorais.

Na avaliação do Ecad e de outros músicos contrários à nova lei, o texto prevê intervenção do Estado na propriedade privada. Eles consideram que a regra fere a ordem econômica, a liberdade de associação, o direito de propriedade e o direito de privacidade dos autores.

Outros músicos, porém, defendem que a lei regulamenta a atuação do Ecad e também a destinação dos valores a serem distribuídos a compositores e intérpretes.

O relator das ações no Supremo, ministro Luiz Fux, disse esperar um julgamento "muito difícil".

"Apesar de ser uma classe muito criativa, está extremamente dividida. De um lado aqueles que entendem que o direito autoral é propriedade privada e não deve merecer ingerência da tutela estatal. E, de outro lado, entendem que no Brasil de hoje, onde há marcos regulatórios para todas as atividades, nada impede que haja a regulação da gestão coletiva do direito autoral. Vamos prosseguir audiência, colher mais elementos, transmitir aos demais colegas da Corte, porque já antevejo um caso muito difícil de ser julgado", afirmou o ministro.

Segundo Fux, o tema poderá ser julgado ainda em 2014. "Eu pretendo levar a julgamento ainda este ano", disse.

O cantor Lobão participa de audiência pública no STF sobre direitos autorais (Foto: Mariana Oliveira / G1)O cantor Lobão participa de audiência pública no STF
sobre direitos autorais (Foto: Mariana Oliveira / G1)

Lobão x Frejat
Durante a audiência, o cantor e compositor Lobão disse que tirar poderes do Ecad é uma forma de "revanche" e que é preciso melhorar o órgão de arrecadação e não passar para o governo a incumbência de fiscalizar a arrecadação.

"Parece medida mais de revanche com o Ecad porque a coisa é aperfeiçoar o Ecad e não punir o Ecad, castrar o Ecad. Se castrar o Ecad, está castrando a gente mesmo. Vai botar no governo? O que o governo gerencia que a gente pode aplaudir? Nada. É absurdo querer botar no governo. E porque cargas d´água acreditar na honestidade maior do governo do que na honestidade de entidade privada? É absurdo", disse Lobão.

O cantor criticou o grupo que apoiou a nova lei e a entidade Procure Saber, que reúne artistas para debater questões relativas à área cultural e que foi favorável às novas regras.

"Pergunte a eles porque meia dúzia de 30 pessoas representaram uma classe de mais de 300 mil que discordam deles? Temos um abaixo assinado de pelo menos 3 mil que discordam em gênero, número e grau. Então, essas pessoas não nos representam. Eles podem dizer, o Procure Saber representa 30 artistas, vamos discutir. Queremos entrar na discussão. Temos a esmagadora maioria que não está de acordo. A gente não quer esse tipo de lei, tem todo direito de estar indignado com esse tipo de atitude. Que é uma coisa de moleque. Querer, botar a toque de caixa, ir ao Congresso Nacional, colocar o Roberto Carlos a tiracolo, e ficar tirando foto com a Dilma Rousseff e com o Renan Calheiros. Isso é uma falta de vergonha na cara, é o fim da picada."

O vocalista da banda Barão Vermelho, Frejat, participa de audiência pública no STF sobre direitos autorais (Foto: Mariana Oliveira / G1)O vocalista da banda Barão Vermelho, Frejat,
participa de audiência pública no STF sobre direitos
autorais (Foto: Mariana Oliveira / G1)

O cantor Frejat também falou na audiência pública e defendeu a nova lei. Para ele, o texto organiza o direito autoral no Brasil.

"Não existe nenhum risco de o Estado estar intervindo no direito autoral. Ele só está ali para vigiar para que excessos não sejam cometidos. Excessos esses que vem sendo cometidos desde que o Ecad ficou sem regulamentação. Ou seja, de 23 anos para cá, o Ecad se transformou num grande monstro arrecadador, numa sanha de arrecadação, que não está satisfazendo os dois pontos principais da cadeia do direito autoral, que é o autor, que está insatisfeito porque acha que recebe pouco, e o usuário, que acha que paga muito. Então, os dois lados principais não estão satisfeitos e essa lei vem justamente para tentar melhorar", destacou.

No intervalo da audiência, ao ser questionado sobre o motivo de Frejat apoiar a nova lei, o cantor Lobão disse "pergunte a ele".

Ao saber que Frejat considerava que ele, Lobão, era contra porque estava desinformado, o músico afirmou: "Mas ele não me deu a informação. Na verdade, eles se reuniram na casa de alguém, e ele, como pessoa próxima, custava dizer? Ele, que participou comigo da numeração de CDs, ele me substituiu por exigência das gravadoras que não queriam negociar comigo, virou meu amigo, colega, companheiro. Bastava me telefonar, pelo menos ele. Agora, achar que estou desinformado? E se estou, estou reclamando porque estou desinformado. Porque não fui informado devidamente pelo grupo deles. Dizer que estou boiando? Estou irado porque cometeram a molecagem de não me comunicar absolutamente nada."

Frejat não quis comentar as declarações de Lobão.

Contra a nova lei
A superintendente do Ecad, Glória Braga, afirmou durante o debate que a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o escritório e deu origem à lei tinha como objetivo "demonizar" a gestão coletiva de direitos. "É importante salientar que as associações são mandatárias dos titulares, praticando em nome deles a gestão do direito patrimonial sobre suas  criações", disse.

O maestro Luis Cobos, presidente da Federação Ibero-latinoamericana de Artistas, Intérpretes e Executantes, a nova lei não pode ferir a privacidade dos artistas. "A pronta disposição desses dados ao público será um perigo para os criadores e os gestores do Brasil e para os países do entorno." Segundo ele, a nova Lei de Direitos Autorais brasileira é objeto de preocupação na comunidade criativa internacional.

A favor da nova lei
Representante do Ministério da Cultura na audiência, o diretor de direitos intelectuais da Secretaria Executiva do ministério, Marcos Alves de Souza, defendeu a nova lei. "É o Estado quem tem condições de avaliar se as associações têm condições de funcionar e gerir direitos de terceiros. A chancela do Estado dá segurança jurídica a quem cobra e a quem é cobrado."

A cantora Paula Lavigne também defendeu, durante a audiência, as mudanças na lei.

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