“A Dona Aranha subiu pela parede, veio a chuva forte e a
derrubou”. Murilo se pega cantando mesmo
em um treino do Sesi-SP. O ponteiro, tão acostumado ao hino nacional nos jogos
da seleção brasileira, agora não tira da cabeça as cantigas para ninar o filho Arthur.
O paizão se desmancha em sorrisos e brincadeiras ao ver o pequeno se
espreguiçar nos braços da mãe Jaqueline. Os olhos da ponteira também brilham,
enquanto seus braços fazem um aconchegante balanço para fazer o menino dormir. Quase
quatro meses depois do nascimento do garoto, os pais de primeira viagem já
estão mais adaptados à nova fase, entre canções de ninar e fraldas.
- Ele já acorda com músicas, e eu fico com aquilo
na cabeça durante o treino. A bola vai para um canto, e eu penso na Dona Aranha.
Está sendo maravilhoso. Estamos curtindo bastante. Está passando muito rápido.
Ele já vai completar quatro meses e parece que ele nasceu ontem. A tendência é
passar mais rápido ainda, então temos de curtir cada dia, cada momento. Estamos
muito felizes - disse Murilo.
A mamãe também é só felicidade.
- É uma delícia. Sempre sonhamos ter
um filho e estamos realizando esse sonho. Agora eu sei qual é o sentimento de
uma mãe realizada. Eu não me arrependo de nada do que fiz e agradeço a Deus por
colocar mais uma vida em nossas vidas - disse Jaqueline, que abriu mão da
temporada à frente do Osasco e da seleção brasileira para realizar o sonho de
ser mãe.
Fruto de um relacionamento de 14 anos, Arthur é um
bebê tranquilo. Os pais contam que por vezes nem parece ter uma criança em
casa. Trocar fraldas, colocar o garoto para arrotar, dar banho são tarefas já
incorporadas à rotina dos dois. Se Murilo está treinando ou jogando, Jaqueline
cuida de tudo. Se a ponteira vai à academia, o marido assume o posto de paizão.
Nem mesmo à noite Arthur dá muito trabalho. Sempre que ele desperta, o carinho
e o cuidado dos pais logo o colocam para dormir novamente.
Nervosismo nos primeiros dias
A vida de pais de primeira viagem, porém, nem
sempre foi tão sossegada. Antes do parto, a curiosa Jaqueline parava mães
desconhecidas no meio da rua ou em shoppings para pegar dicas e entender como é
ser mãe, o quão difícil é. As conversas não adiantaram muito. Os dias que se
seguiram ao nascimento de Arthur, no dia 20 de dezembro, foram de nervosismo e
muito aprendizado para os dois jogadores.
- É tudo instinto. Quando o Arthur nasceu, não teve
jeito. A enfermeira o tirou da Jaque, enrolou em um pano e falou: “Toma papai”.
Não é que eu sabia ou tinha treinado, mas encaixou. Assim foi no dia a dia
também. Na maternidade aprendemos a fazer muita coisa. No dia que voltamos para
casa, falei: “Agora não vai ter mais jeito, é com a gente, não tem mais ninguém”
- disse Murilo.
- Eu fiquei nervosa. Lá no hospital tinha gente para
me ajudar, para trazê-lo para amamentar. Quando a médica falou “amanhã você
pode ir embora”, eu pensei: “Meu Deus, o que eu vou fazer com essa criança?” Eu
não dormi, mas as coisas foram se ajustando aos poucos. É tudo uma novidade. Eu
curto tudo: trocar fralda, colocar para dormir, dar de mamar. São momentos que
passam, então eu curto tudo da melhor maneira possível. Ainda mais agora que
estou sem jogar, estou curtindo mais que o Murilo - completou Jaqueline.
A mãe da ponteira foi de Recife para São Paulo para
ajudar nos primeiros dias. A mãe de Murilo também deu uma força, e a babá, que
Jaqueline considera uma mãezona para toda a família, é o braço direito do casal
agora. Mesmo assim, os ponteiros não escaparam das noites em claro.
- Todo mundo falava de acordar à noite. Isso
assustava muito, tendo que levantar no outro dia cedo para treinar. Houve umas
duas semanas que achamos que não iríamos aguentar (risos). Ele nos deu uma
canseira. Nossa senhora! Ele acordava o tempo todo. Ele tinha cólica, e não
sabíamos o que fazer. Ele desse tamanho derrubava nós dois. Foi na segunda ou
na terceira semana. Depois ele ficou mais comportado. Todo mundo falava:
“Aproveita para dormir agora” (antes do nascimento). É difícil no início. O sono
nunca mais é o mesmo. Tem momentos de pai e mãe que temos de vivenciar mesmo -
disse Murilo.
E no meio da reportagem...
- Ele acabou de fazer um "popô". Ele ficou caladinho,
e eu sentindo os rumores aqui no meu colo. Esquentou (risos). No início eu até
enjoava, mas agora já estou acostumado. O fedor está pior, porque ele está
começando a comer frutinha - contou Jaqueline, que ao trocar a fralda percebeu que foi um alarme falso.
O herdeiro no vôlei
Filho de uma bicampeã olímpica e de um bicampeão
mundial, Arthur carrega o vôlei em seu DNA. Seu quarto é todo decorado com
alusões à modalidade e ele até dorme em uma espécie de quadra de vôlei.
- Ele ganhou uma camisa com o número 8 (o número
dos pais). O quarto dele é puxado para o vôlei. Tem a girafa, que sou eu, tenho
um pescoção. O Murilo é o leão, na época ele estava com cabelo grande. E o
Arthur é o ursinho. O berço também é uma quadra de vôlei. Mas não vamos
pressionar em nada - disse Jaqueline.
- Vai ser livre e espontânea pressão - brincou Murilo.
Se herdar o talento do pai, Arthur tem tudo para ser mais
um grande ponteiro passador. A semelhança física é só o primeiro passo. Ele é
muito parecido com o bebê Murilo, só que pode superar o 1,90m de altura do pai.
- Ele se parece comigo. A cor do cabelo, da pele, é
todo meu. Não tem nada do Murilo aí, gente - brinca Jaqueline - Eu
o chamo de bolotinha, porque ele é muito grande e fofo. Acho que o osso dele
é pesado, não sei. Está pesando uns nove quilos. Ele está com 70cm só com três
meses, então está grande. O pediatra olha e fala: “Esse moleque vai crescer
para mais de 2m”. Que isso, filho? Já está desse tamanho? Está com tamanho de
criança de um ano de idade.
Com menos de quatro meses, Arthur foi ao seu primeiro jogo no último domingo e, mesmo diante
de um Mineirinho lotado, não deu trabalho à mãe Jaqueline. O garoto estreou
logo na final da Superliga Masculina de vôlei e viu o Sesi-SP de Murilo perder
diante do Cruzeiro. Mas acompanhou o pai no pódio.
- Eu fiquei preocupada, porque ele não estava indo
a um jogo normal. O barulho era três vezes acima do normal. Era torcida de
futebol. Ele, com três meses, conseguiu até dormir, deu umas assustadas, mas
ficamos em um lugar reservado. O problema foi quando o Murilo foi receber a
premiação, porque o barulho era intenso na quadra, mas ele foi muito tranquilo.
Foi a primeira viagem de avião também. A estreia de tudo. Ele foi para dar
alegria ao papai - disse Jaqueline.
Arthur tem dado força a Murilo antes mesmo de nascer. O
ponteiro passou por uma cirurgia no ombro direito, no início de maio, e o filho
o motivou a se recuperar.
- O melhor para mim é chegar em casa depois de
treino, depois de viagem, depois de jogo, e ver esse sorriso gostoso, banguelo.
Dá vontade de apertar, de abraçar, de beijar. Ele me ajuda bastante. Passei por
um momento de cirurgia. Nem todos os dias eram bons. Ele me ajudou a esquecer
isso e viver só para ele, para nossa família. Desde pequeno ele nos ajuda.
O ponteiro não desgruda do filho. Por
enquanto, as viagens junto com o Sesi-SP foram curtas, mas Murilo deve passar um
longo período no CT da seleção brasileira, em Saquarema, para se preparar para
o Mundial da Polônia, em setembro. Se depender do jogador, Arthur o acompanhará
pelo menos na casa do vôlei brasileiro.
- Vamos montar um berço em Saquarema. Se a Jaque
também for convocada, vamos levá-lo junto. Ele fica lá na quadra enquanto
estamos treinando, já fica catando bola - brincou Murilo.
O garoto cada vez mais será figurinha marcada nos
jogos dos pais. O casal curte ao máximo a nova vida. A felicidade é tanta que Jaqueline já pensa em ter outro
herdeiro, mas só depois das Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro.
- É gostoso, é lindo, mas passa um perrengue. A
satisfação é olhar o sorrisinho lindo dele. Tudo compensa. Eu já penso em ter
outro, mas só depois de 2016.