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Segredos de Mou: provocação serve como arma para motivar jogadores

Dizer que o Chelsea já estava eliminado contra o PSG não é novidade para treinador: em 2004, português mandou time do Porto pedir autógrafos aos galácticos do Real

Por Milão, Itália

Depois de perder por 3 a 1 para o Paris Saint-Germain, fora de casa, e vencer por 2 a 0 em Londres, o Chelsea de José Mourinho conquistou a vaga nas semifinais da Liga dos Campeões e ganhou imediatamente o rótulo de favorito ao título. Não pelo elenco dos Blues, que é inferior ao dos badalados Bayern de Munique e Real Madrid, mas porque os ingleses têm o “Special One” no comando, e isso não é pouco. José Mourinho venceu duas Ligas dos Campeões e já disputou oito semifinais. O ex-zagueiro do Inter de Milão, Giuseppe Baresi, foi assistente do português na Itália e revelou alguns dos segredos do sucesso do treinador.

- Ele é um motivador nato, mas tem uma grande capacidade de entender o momento do time. Há momentos que os jogadores não precisam ser motivados, porque necessitam de tranquilidade. E ele sabe quando pressionar, quando aumentar a tensão e quando precisa deixar em paz. É um gestor de vestiário incrível e eu aprendi muito em dois anos com ele - disse Beppe Baresi ao GloboEsporte.com.

José Mourinho na coletiva do Chelsea (Foto: Reuters)José Mourinho busca a terceira final de Champions: técnico nunca perdeu uma decisão do torneio (Foto: Reuters)


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provocar na hora certa

Quando viu o seu time perder 3 a 1 em Paris no jogo da ida das quartas de final da Champions, Mourinho sabia que seus jogadores precisavam acreditar e dar tudo em campo para superar o PSG em Londres. Era momento de motivar e foi isso que o português fez. No vestiário, disse aos jogadores do Chelsea que eles estavam “eliminados” e pediu só para que se “divertissem em campo”. Com isso tirou a pressão e conseguiu alfinetar os seus homens que entraram em campo dispostos a tudo pelos dois gols que no final conseguiram. Um dos fieis seguidores de Mourinho no Porto era o volante Costinha, que recorda mensagens semelhantes do comandante para o time que venceu a Champions em 2004.

- Íamos jogar contra o Real Madrid de Figo, Zidane, Beckham e Roberto Carlos na fase de grupos. No vestiário ele perguntou se a gente não ia levar papel e caneta no calção para pedir autógrafos aos jogadores do Real. A gente ficou assim olhando para ele surpreendidos, mas ninguém se esqueceu dessa frase. Ele ainda virou e disse: “Acho que vocês devem pedir autógrafos a eles se acham que eles são mais do que vocês.” Ele fez isso porque havia alguns jogadores que só tinham visto a Champions pela televisão e agora iam enfrentar o Real Madrid. Nesse momento, ele nos deu a motivação necessária para confiarmos e nos unirmos porque o Real até podia ganhar, mas não ia ser fácil como eles pensavam - relembrou Costinha, que há pouco tempo realizou um estágio com Mourinho em Londres, para depois assumir o comando do Paços de Ferreira do Campeonato Português.

Chelsea x PSG (Foto: Reuters)Mourinho em cena histórica comemorando a vitória do Chelsea sobre o PSG com os jogadores (Foto: Reuters)


A tática de Mou não resultou no primeiro jogo que o Porto perdeu por 3 a 1 para os "galácticos", mas na volta valeu um empate precioso no Santiago Bernabéu. Nesse ano, Costinha protagonizou outro episódio marcante com o treinador. Nas oitavas de final, o Porto enfrentou o Manchester United e, depois de vencer por 2 a 1 em casa, estava perdendo por 1 a 0 no Old Trafford até os minutos finais. Antes do jogo, Mou havia avisado Costinha sobre o posicionamento do volante nas cobranças de falta diretas para tentar aproveitar um rebote da bola no goleiro. Foi isso que o volante fez e marcou o gol  do empate que qualificou os “Dragões” para as quartas. O “Special One” correu mais de 60 metros para festejar com os jogadores, uma celebração que ficou para a história. No jogo contra o PSG, o Chelsea de Mou fez quase o mesmo ao marcar o gol da qualificação nos minutos finais e o português repetiu a corrida, mas desta vez para dar indicações ao time que ficou eufórico. Costinha, no entanto, acredita que a intenção era outra.

- Em 2004, ele correu mais rápido, a idade também era outra também - brincou o ex-volante, revelando em seguida o motivo do sprint do Stamford Brigde.

 

- Além de ser um excelente treinador, Mourinho é também muito inteligente, acho que ali naquele momento, ele também quer distrair o adversário. Ele sabia que o jogo ainda não tinha terminado. O PSG tinha mais 3 ou 4 minutos para tentar fazer um gol e o Chelsea estava com três centroavantes em campo. Aproveitou para distrair os franceses, perder um pouco de tempo e dizer aos seus atacantes como se deveriam posicionar, porque alguém tinha de defender.

Para o ex-volante do Porto e Atlético de Madrid, a vitória do Chelsea sobre o PSG vai dar ainda mais força ao Blues para enfrentarem o time de Diego Simeone nas semifinais, assim como aconteceu com o Porto em 2004 depois de vencer o Manchester United. Para Costinha, o duelo vai ser uma batalha tática entre os dois treinadores que será decidida nos detalhes tal como aconteceu entre Porto e La Coruña nas semifinais de 2004.

- Era um jogo muito difícil, porque o La Coruña tinha um grande time esse ano (bateu o Milan por 4 a 0 nas quartas) e a gente entrou em campo com oito jogadores em risco de suspensão para a final caso vissem o amarelo. Mou preparou o time de forma a que ninguém fosse suspenso dando a sensação de que iríamos estar na final e nenhum desses oito recebeu cartão. Ele nos disse tudo o que tínhamos de fazer, desde o posicionamento, colocando um jogador sempre na cobertura do colega que estava defendendo a bola, até à agressividade no momento em que não tínhamos a bola. Não cedemos um centímetro de espaço ao La Coruña e vencemos com um gol do Deco. Correu tudo como ele havia planejado - explicou o ex-volante.

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planejamento em cada cenário


Ao estudar o adversário, Mourinho prevê o que é que pode acontecer em cada cenário. Os times guiados pelo português raramente são surpreendidos, porque são preparados para todas as situações em campo. Na semifinal de 2010, em que o Inter superou o Barcelona e venceu depois a competição, os italianos jogaram durante 60 minutos com 10 homens no Camp Nou devido à expulsão de Thiago Motta.

- É um treinador que intervém rapidamente. Sabe o que tem de fazer em todas as situações e já prepara o seu grupo para todas elas. No Camp Nou jogávamos 11 contra 11, mas ele mudou rapidamente toda a estratégia depois da expulsão do Thiago Motta e deu certo. Aí, ele teve de motivar um pouco mais o time impedindo que os jogadores se desanimassem, porque jogar contra aquele Barça só com 10 era uma batalha. Mas normalmente, ele deixa o time jogar sem colocar pressão em campo, porque sabe que os jogadores precisam dessa tranquilidade no gramado - lembrou Baresi.


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vestiário luta por mou


Outra das caraterística de Mou é ter o time do seu lado. Alguns jogadores não tiveram uma boa relação com o “Special One”, como os casos de Quaresma, Mario Balotelli e do goleiro Iker Casillas. Mas o português já teve grandes feras do futebol mundial do seu lado e que ainda hoje elogiam o técnico como Zlatan Ibrahimovic, Didier Drogba, Frank Lampard e Marco Materazzi.

Mourinho vibra com o título da liga dos campeões do Internazionale  (Foto: agência Getty Images)Mourinho vibra com o título da Liga dos Campeões do Internazionale (Foto: agência Getty Images)

Com o compatriota Cristiano Ronaldo, a relação foi muito boa no início, mas se esfriou no final por causa de uma feia discussão durante um jogo da Copa do Rei em Valência. No entanto, os dois se respeitam e admiram o trabalham um do outro. Os anos e os resultados mostraram que no Real Madrid, Mou não conseguiu ter todo o vestiário ao seu lado como nos outros clubes. No Chelsea, Mourinho voltou a ser Mourinho e o grupo está com o técnico. Beppe Baresi explica como é que isso acontece.

- Ele é fantástico na gestão humana, tem várias formas de motivar cada jogador individualmente seja com um torpedo à noite, como numa conversa individual no CT ou até mesmo dizendo coisas agressivas na cara e na frente de todo o mundo. Ele é muito sincero com os seus jogadores e no futebol isso é muito importante. Mesmo aqueles que jogam pouco gostam dele, porque nem que seja por dois ou três minutos em campo, o Mourinho consegue convencer o jogador que é muito importante - concluiu o assistente.

Com Mourinho, o Chelsea ainda pode conquistar o Campeonato Inglês caso vença todos os jogos e, na Liga dos Campeões, se superar Diego Simeone, o técnico português alcançaria a sua terceira final na competição. Mou nunca perdeu uma decisão da Champions e sempre repete a sua máxima:

- As finais não se jogam, só se vencem.