Economia

Aeroportos: Com Galeão e Confins, metade dos passageiros fica sob gestão privada

Cerca de 60 terminais continuam com a Infraero
Galeão. O Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, cujos principais entraves são de gestão, deverá apresentar melhorias Foto: Genilson Araújo
Galeão. O Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, cujos principais entraves são de gestão, deverá apresentar melhorias Foto: Genilson Araújo

RIO E BRASÍLIA - O bom resultado do leilão dos aeroportos de Galeão e Confins (MG) — comprados na sexta-feira por alguns dos melhores operadores do planeta, o Changi, de Cingapura, e Zurique/Munique, respectivamente — deixará evidente uma divisão no setor aeroportuário brasileiro. De um lado terminais privados, mais eficientes, e de outro os cerca de 60 aeroportos da Infraero, às voltas com problemas que se repetem e irritam os passageiros.

A primeira leva de aeroportos privatizados — Guarulhos e Viracopos, em São Paulo, e o terminal de Brasília, que foram para a iniciativa privada em 2012 — começa a entregar as melhorias aos passageiros nos próximos meses. No Galeão, como os principais problemas são de gestão, as mudanças devem ser sentidas imediatamente. Assim, em 2014, o brasileiro viverá na prática o abismo que deve separar a qualidade dos serviços dos aeroportos privados da dos terminais estatais.

— Ficarão mais evidentes os problemas da Infraero. Em um único voo, o passageiro poderá sair de um terminal com qualidade de primeiro mundo e, então, pousar em um aeroporto que não é pensado para o conforto do usuário — afirma Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral.

O movimento de passageiros dos terminais privatizados (Galeão, Confins, Guarulhos, Viracopos e Brasília) somou 85,4 milhões de pessoas em 2012, o equivalente a 44,2% do total nacional. Levando em conta apenas a movimentação internacional, passaram por estes aeroportos 16,8 milhões de pessoas no ano passado, 88,7% do total.

Pressão por melhoria na Infraero

Especialistas do setor creem que isso poderá aumentar a pressão por novas privatizações e também por mudanças na Infraero, uma das estatais mais fechadas do país. Esses analistas preveem a repetição do fenômeno ocorrido na década de 1990, quando as privatizações de estradas federais geraram rodovias seguras e com investimentos, que contrastavam com estradas sob a gestão da União, esburacadas e com alto índice de acidentes. Outro exemplo citado é a comparação que os passageiros brasileiros passaram a fazer com terminais de outros países depois que as viagens internacionais se popularizaram.

O professor Paulo Resende diz que a percepção da diferença de qualidade em 2014 deve ser mais nítida por dois motivos: os aeroportos da primeira leva de concessões enfrentavam grandes gargalos, necessitavam expansões significativas e somente agora começam a apresentar bons resultados, ao passo que Galeão e Confins têm espaços ociosos. Além disso, os aeroportos privatizados na sexta-feira terão operadores que são a nata da indústria mundial, contra os pequenos operadores que venceram o leilão do ano passado, cuja experiência foi construída em terminais menores, na África e na Argentina. Assim, explica Resende, a Infraero será mais cobrada:

— A Infraero é uma das mais burocráticas estatais do país, tem uma cultura militar e nenhum compromisso com seus usuários. Imaginar que ela dará o salto de qualidade necessário é quase uma utopia. Ela teria de fazer mais do que foi feito na modernização do Banco do Brasil e da Petrobras, nos áureos tempos.

André Castellini, sócio da consultoria Bain & Company, acredita que a Infraero terá que repensar sua atividade após este leilão. Segundo ele, a empresa pode aprender com o processo e se tornar mais eficiente:

— A comparação entre os aeroportos privatizados e os terminais da Infraero pode fazer com que a estatal fique melhor, com mais foco — afirma o especialista, lembrando que ainda há aeroportos interessantes para a iniciativa privada.

Armando Castelar, economista da FGV, diz que a Infraero, que terá 49% de participação nos aeroportos privatizados, sofrerá maior pressão não só dos passageiros, mas dos órgãos reguladores:

— É mais fácil para a agência do setor multar empresas privadas e isso deve melhorar todo o sistema aeroportuário.

Brasília, Guarulhos e Viracopos, os primeiros aeroportos a serem privatizados, se transformaram em verdadeiros canteiros de obras. No caso da capital do país, um usuário resumiu a situação, afirmando que “estão construindo um aeroporto dentro de um aeroporto em funcionamento”, com becos e cercados improvisados, barulho e poeira. Por outro lado, apesar do desconforto, o índice de satisfação com os serviços dos três aeroportos privatizados em 2012, segundo pesquisa da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), está em sete, em uma escala de zero a dez.

Entre os itens avaliados na pesquisa estão: qualidade das informações prestadas, limpeza, disponibilidade de banheiros e de assentos, mais variedade e qualidade de lojas comerciais, aumento da quantidade de carrinhos de bagagem e mais vagas nos estacionamentos para veículos.

“No momento, a Anac avalia que o desempenho nos aeroportos concedidos tem sido muito satisfatório”, disse o órgão fiscalizador em nota.

Vagas de estacionamento e ‘Duty Free’

Segundo a agência, as obras estão dentro do cronograma, mesmo em Brasília, onde começaram com atraso. Incluindo o novo aeroporto de Natal (que está sendo construído pela iniciativa privada em São Gonçalo do Amarante), os concessionários já investiram R$ 3,2 bilhões. O valor representa 60% dos investimentos obrigatórios até os Jogos da Copa em junho de 2014.

Os concessionários assumiram o comando dos aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos em meados de novembro do ano passado. Um ano depois, o aeroporto da capital federal já tem mais 1.800 vagas para veículos e uma nova sala de embarque; em Guarulhos, foram construídas mais 3.500 vagas para estacionamento e em Viracopos, outras 1.500. Todos os sanitários foram reformados e novos foram construídos nos três aeroportos, segundo levantamento da Anac. Em Viracopos, por exemplo, passou a funcionar uma loja livre de alfândega ( duty free ), que não existia. Obras mais pesadas, como construção de terminais de passageiros, pátio e pontes de embarque, ainda estão em andamento.

— As obras estão dentro do cronograma. São visíveis e os serviços melhoram. Evidentemente que ainda não é uma qualidade excepcional, porque é difícil você prestar um serviço de qualidade num ambiente de obra, mas os traços de modernidade estão presentes — disse o ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Moreira Franco.

O servidor público Tiago Carneiro Rabelo percebeu algumas melhorias no aeroporto de Brasília, como pintura da fachada, polimento do piso e sinalização, mas admite que há desconforto devido às obras.

— As mudanças causam certo transtorno, mas a tendência é que o aeroporto fique melhor.