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Terror e covardia em Paris

Terror e covardia em Paris

Ataques simultâneos, tiroteios, explosões e fuzilamento a sangue-frio deixam a França em pânico. É o pior atentado já vivido pelo país

RODRIGO TURRER
14/11/2015 - 00h48 - Atualizado 14/11/2015 14h37

Os parisienses mal tiveram tempo de superar o luto pelo massacre no jornal satírico Charlie Hebdo, em janeiro deste ano. A Cidade Luz, berço dos ideais republicanos e iluministas foi, mais uma vez, palco de uma série de violentos atentados na sexta-feira, dia 13 de novembro. Para muitos, o 7 de janeiro de 2015, quando radicais islâmicos invadiram a redação do Charlie Hebdo, era o 11 de setembro da França. Mas o 13 de novembro se revelou um dia ainda mais negro. Ataques com tiros e explosões em ao menos cinco pontos diferentes da capital francesa deixaram ao menos 140 mortos. É o pior atentado da história da França.

As informações preliminares dão conta de uma série de ataques coordenados e preparados para acontecer bem no dia de um importante jogo de futebol, o amistoso entre Alemanha e França, no Stade de France, em Paris. Durante a partida, onde estavam presentes o presidente François Hollande e autoridades francesas foi possível ouvir explosões. Ao menos três estrondos ocorreram dentro do estádio, no bairro de Saint-Denis. Hollande e outras autoridades foram retirados às pressas do local. A polícia confirmou que as explosões vieram de dentro do estádio. O jogo prosseguiu, mas os acessos ao estádio foram fechados. Ao fim do jogo, os alto-falantes pediram calma na saída dos presentes. Muitas pessoas ocuparam o gramado, com medo da situação. Um espectador que estava no estádio disse ao jornal francês Le Figaro que a saída foi caótica. “Na saída, metade das portas do estádio estava bloqueada. Os espectadores gritaram ‘fuzilamento, fuzilamento’.” 

Revista ÉPOCA - capa da edição 910 - Por que Paris? (Foto: Revista ÉPOCA/Divulgação)


O fuzilamento não ocorreu no estádio, mas a alguns quilômetros dali, no 11º Distrito, dentro do famoso teatro Bataclan. Ali, centenas de pessoas estavam reunidas para assistir ao show da banda californiana Eagles of Heavy Metal. Na metade do show, segundo testemunhas, entre seis e oito atiradores, com os rostos cobertos e armados com fuzis kalashnikov e armas automáticas, começaram a atirar contra os espectadores. Um deles teria gritado “Allahu akbar” (Deus é grande, na tradução do árabe). A correria foi grande. E pelo menos 100 pessoas morreram, segundo divulgou a prefeitura de Paris na noite da sexta-feira. Uma testemunha que conseguiu escapar do Bataclan relatou a um jornal francês: “Conseguimos fugir. Havia sangue para todo lado. Eles atiraram a esmo contra a multidão”. Um jornalista da emissora Europa 1 que estava no local disse que os terroristas estavam calmos. E que tiveram tempo de recarregar as armas ao menos três vezes. Segundo a polícia, havia explosivos presos aos corpos de alguns dos reféns.

>> Os relatos de brasileiros em Paris em 13 de novembro

Perto dali, no 10º Distrito, 11 pessoas foram assassinadas por ao menos um atirador armado com um fuzil kalashnikov, no restaurante Le Petit Cambodge. A área do primeiro tiroteio é próxima à Praça da República, área muito movimentada de Paris. De acordo com testemunhas, os agressores fugiram depois de disparar mais de 100 vezes, e pessoas estavam sendo retiradas às pressas do local – também perto do Canal Saint-Martin, área muito frequentada às sextas-feiras à noite. Uma testemunha que estava perto da Rue de La Fontaine-au-Roi relatou as cenas de terror. “Passamos de scooter, e a polícia não havia chegado ainda. As pessoas gritavam: ‘Não vá para lá. Há tiros, rajadas’. Vi quatro ou cinco corpos no chão e um mar de sangue. Todos estavam fugindo ou se escondendo nos restaurantes.”

O governo francês decretou estado de urgência no país. Com as medidas de exceção, a polícia terá direito de vasculhar locais privados. As fronteiras do país serão fechadas. Ninguém poderá entrar ou sair. As linhas de metrô foram interrompidas. O presidente francês François Hollande afirmou que “um ataque terrorista sem precedentes está em curso no país” e recomendou que as pessoas não saiam de casa. Universidades, escolas e estabelecimentos municipais ficarão fechados no fim de semana.
 

Polícia em Paris ao lado de corpos nas ruas. (Foto: Christian Hartmann/Reuters)

O terrível atentado ocorre em um momento em que a França intensificou sua participação na Guerra Civil da Síria. Em setembro, o país ordenou seus primeiros ataques contra o Estado Islâmico em território sírio. Analistas acreditam que seja grande a possibilidade de os atentados terem sido cometidos por “lobos solitários”, radicais islâmicos que moram em países europeus e dispostos a cometer atrocidades.

O surpreendente, no entanto, é o nível de coordenação dos ataques. Algo similar foi visto na Europa pela última vez em 7 de julho de 2005, quando quatro atentados suicidas coordenados em três estações de metrô e ônibus em Londres deixaram 56 mortos e 700 feridos. Na ocasião, os ataques foram reivindicados pela al-Qaeda. Essa seria uma mudança radical no estilo do Estado Islâmico. Até o momento, o EI promoveu, principalmente, ataques a mesquitas, prédios de instituições e vários ataques a bala em países árabes, além de incursões como a do Charlie Hebdo. Há pelos menos dois meses, no entanto, o alto escalão da inteligência americana alertava para o perigo de o Estado Islâmico estar se preparando para possíveis ataques em massa. O grupo estaria estudando a mudança de foco em ataques de lobos solitários em outros países para organizar atentados de grande impacto, a exemplo da al-­Qaeda. “Acredito que estejam usando muitos dos recrutas que não têm tempo para treinar para criar um tipo de atentado em massa que produza atenção midiática”, afirmou em agosto o tenente-general Mark Hertling, da CIA. Estima-se que 20 mil a 30 mil estrangeiros combatem na Síria e no Iraque pelo EI. Muitos deles, com cidadania europeia, têm facilidade para entrar e sair do continente. Os atentados em Paris também acontecem no momento em que a França aumentou as medidas de segurança para a Conferência do Clima, a COP21, organizada pela ONU, prevista para começar na capital francesa no dia 30 de novembro. A Conferência reúne representantes de 190 países, inclusive diplomatas e chefes de Estado. Mesmo com todos os preparativos para evitar atentados às vésperas da Conferência, a inteligência francesa não conseguiu evitar os ataques.

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Líderes de vários países declararam solidariedade. O presidente americano Barack Obama disse que daria todo o apoio à França, “o mais antigo aliado dos Estados Unidos”, e afirmou que o atentado era um “ataque a toda a humanidade”, e que a França “representa os valores eternos do progresso humano”. A chanceler alemã Angela Merkel disse estar em “choque” e horrorizada com os ataques. “Neste momento, meus pensamentos vão para as famílias da vítimas desse terrível atentado.” Os franceses também se demonstraram solidários. Diante da tragédia na capital francesa os parisienses estão usando a hashtag ‪#‎PorteOuverte (Porta Aberta) para receber quem está longe de casa e precisa de um lugar seguro. A hashtag se tornou uma das expressões mais usadas no Twitter, entrando nos trending topics mundiais. Muitos dos que pediram auxílio são pessoas que ficaram retidas no Stade de France, no jogo entre França e Alemanha. As luzes da Torre Eiffel foram apagadas em sinal de luto. Solidariedade talvez seja a única arma capaz de aliviar a dor causada pelo mais terrível ataque terrorista na história da França.

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