Rio

Gasto com o BRT Transcarioca já é 46% maior que o previsto

Projeto de ponte estaiada na Ilha teve de ser mudado por não prever proximidade do aeroporto

A ponte estaiada que está sendo construída na Ilha do Governador: em vez de um mastro com 120 metros de altura, estrutura ganhou dois arcos de 60 metros
Foto: Marcelo Piu / Agência O Globo
A ponte estaiada que está sendo construída na Ilha do Governador: em vez de um mastro com 120 metros de altura, estrutura ganhou dois arcos de 60 metros Foto: Marcelo Piu / Agência O Globo

RIO — A menos de três meses da abertura da Copa do Mundo, no dia 12 de junho, a prefeitura do Rio tem que correr contra o relógio para inaugurar até o evento as obras do BRT Transcarioca (Barra-Aeroporto Tom Jobim) que integram o pacote de investimentos públicos em mobilidade urbana para o evento. Iniciada em março de 2011 com financiamento do BNDES, a obra convive com atrasos, paralisação de funcionários em algumas frentes e já teve várias alterações no projeto que contribuíram para elevar os custos em 46%, de R$ 1,3 bilhão para R$ 1,9 bilhão. Na conta, não estão incluídos os gastos com desapropriações, nos quais foram pagos mais de R$ 200 milhões entre 2010 e 2013.

Entre as razões que contribuíram para o aumento de custos, estão situações curiosas, como a mudança no projeto de uma ponte estaiada na Ilha para que o BRT chegue ao Aeroporto Tom Jobim. A licitação da obra tomou como base um projeto conceitual. A proposta original previa que a ponte teria um mastro de sustentação com 120 metros de altura nas imediações de uma das cabeceiras de pista do Galeão. Apenas quando os arquitetos foram desenvolver o projeto constataram que a altura do mastro interferiria no tráfego aéreo. A solução foi projetar e construir duas estruturas de 60 metros, exigindo remanejamentos no orçamento.

Os dados sobre custos das obras e atrasos do BRT constam de relatórios de acompanhamento do projeto pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Tribunal de Contas do Município (TCM), além de documentos internos da prefeitura aos quais O GLOBO teve acesso. Em muitas frentes, por exemplo, equipes trabalham 24 horas por dia para entregar a obra a tempo, aumentando despesas. Mesmo assim, no trecho entre Penha e Aeroporto, as obras só devem ser concluídas em setembro, de acordo com o cronograma atual. Na Barra, mudanças no projeto deixaram dois mergulhões R$ 60 milhões mais caros que o previsto. O projeto foi reformulado devido à proximidade do lençol freático com as pistas.

O prefeito Eduardo Paes, porém, se diz otimista e argumenta que os imprevistos são normais numa obra desse porte. Garante que todo o projeto será entregue em maio. Segundo ele, entre todos os projetos de mobilidade para a Copa em andamento nos estados, o Transcarioca é o que terá melhor custo-benefício.

— O que é preciso compreender é que o BRT Transcarioca é uma das obras mais complexas já realizadas na história da prefeitura do Rio. Na prática, não são apenas três anos de obras, mas muito mais. As negociações para desapropriações começaram em 2009. A execução, por exemplo, é mais difícil até mesmo que as obras do Porto Maravilha, porque não se limitaram a tentar minimizar problemas de trânsito numa única região da cidade. O BRT atravessa diversos bairros que contam como uma infraestrutura antiga, que exigiu muita negociação para o remanejamento de rede de concessionárias como Light e Cedae.

No chamado Lote I (Barra-Penha), o cronograma original previa que as obras seriam concluídas até o dia 28 de fevereiro deste ano. Baseada nessa informação, a Secretaria municipal de Transportes fechou, no dia 29 de dezembro de 2013, um plano operacional para o Transcarioca. O documento previa que o BRT seria inaugurado em três fases, entre os meses de março e maio deste ano. O objetivo era permitir uma absorção gradual de usuários, já que a expectativa é que o sistema receba em suas 46 estações cerca de 320 mil passageiros por dia. Isso é mais do que o dobro de usuários do Transoeste (130 mil passageiros/dia).

Pelo plano original, seriam inauguradas, em março, 19 estações entre o Terminal Alvorada, na Barra, e o Largo do Tanque, em Jacarepaguá, totalizando 15 quilômetros. Mas boa parte das estações ainda está em fase de acabamento. Na Barra, instalações elétricas precisaram ser refeitas em duas estações. Na Taquara e no Tanque, os acessos das futuras linhas alimentadoras do BRT ainda estão em obras. Nenhuma das estações, por exemplo, já teve sua rede elétrica ativada para permitir o funcionamento de bilheterias e portas de embarque.

No cronograma fechado em dezembro, a proposta era fazer, em cada uma das fases, testes operacionais por até três semanas, de modo a facilitar os ajustes, reduzindo o risco de imprevistos. Os coletivos circulariam inicialmente sem passageiros, para que os motoristas se acostumassem com o itinerário. Depois, o BRT operaria fora de horários de pico com passageiros, até rodar 24 horas por dia. Para cada uma das fases, previa-se também a redução gradual de itinerários de diversas linhas tradicionais, porque seus trajetos coincidem com o BRT.

— Precisamos de algum tempo para fazer testes, que chamamos de “dar carga“ nas estações. Isso inclui ajustar câmeras, checar equipamentos de bilhetagem eletrônica e de abertura automática de portas, entre outros itens. Além disso, dirigir um veículo de BRT é mais complexo que um ônibus comum. Nenhum motorista de BRT começa a receber passageiros sem passar por pelo menos uma semana de treinamento prático com ajuda de instrutores. Além das diferenças de tecnologia dos veículos, há outros detalhes. Ao parar nas estações, as portas dos ônibus têm de ser alinhadas com as entradas das plataformas — disse o gerente-geral do Consórcio Operacional BRT, Alexandre Castro.

Os empresários encomendaram mais de 20 ônibus novos para os testes de março. A frota chegou a tempo. Mas, sem ter como circular pelo Transcarioca, e para não ficarem ociosos, os veículos passaram a reforçar provisoriamente a frota do BRT Transoeste (Barra-Santa Cruz). Este mês, pelo cronograma original, mais seis estações, entre Tanque e Madureira, entrariam em operação. Finalmente em maio, seriam liberados para testes os 21 pontos de parada entre Madureira e o Aeroporto Internacional Tom Jobim. Os prazos estão sendo revistos, mas, no melhor dos cenários, acredita-se que o sistema possa finalmente começar a ser testado até meados deste mês. Ainda assim, num trecho (Alvorada-Taquara) bem menor que o previsto.

Os atrasos não se limitam às obras físicas. A exemplo do Transoeste, o Transcarioca atravessará vias de grande movimento. Para tentar reduzir os acidentes, o corredor expresso terá 30 pontos de monitoramento. Os pardais vão identificar casos de invasão dos corredores exclusivos por veículos particulares, além de excesso de velocidade e avanço de sinal. Esses aparelhos serão alugados por dois anos pela CET-Rio, mas ainda não chegaram.

Também houve atrasos do lado dos operadores. O Consórcio Operacional BRT — gerenciado pelas empresas de ônibus do Rio — ainda não concluiu a implantação da nova central de controle que acompanhará os veículos por meio de GPS e câmeras de vídeo. Em nota, o consórcio alegou que a conclusão da obra não era uma exigência para o início de operação, porque os testes operacionais podem ser feitos da central que hoje atende apenas ao Transoeste.

*Colaboraram Bruno Amorim e Tais Mendes