Política Lava-Jato

MPF vai investigar documento que liga BTG a Cunha

Anotação apreendida pela PF diz que banco pagou R$ 45 milhões ao deputado e a outros parlamentares do PMDB. Ambos negam acusações

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha
Foto: Jorge William / Agência O Globo
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA — Um documento apreendido pela Polícia Federal (PF) na casa do chefe de gabinete do senador Delcídio Amaral (PT-MS), Diogo Ferreira, traz anotações sobre uma suposta transação entre o BTG Pactual e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O documento faz menções a habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, no verso, consta um texto sobre suposta compra de emenda numa medida provisória que favoreceria o BTG. Em troca, conforme a anotação, Cunha teria recebido R$ 45 milhões, dinheiro que também se destinaria a outros parlamentares do PMDB.

O conteúdo do documento foi reproduzido no pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de conversão da prisão temporária em preventiva do chefe de gabinete de Delcídio e do dono do BTG, André Esteves. O ministro do STF Teori Zavascki aceitou o pedido de Janot e determinou as prisões preventivas dos dois neste domingo.

O documento apreendido registra: “Em troca de uma emenda a medida provisória nº 608, o BTG Pactual, proprietário da massa falida do banco Bamerindus, o qual estava interessado em utilizar os créditos fiscais de tal massa, pagou ao deputado federal Eduardo Cunha a quantia de 45 milhões de reais.” Ainda conforme a anotação, "pelo BTG participaram da operação Carlos Fonseca, em conjunto com Milthon Lyra". "Esse valor também possuía como destinatário outros parlamentares do PMDB. Depois que tudo deu certo, Milton Lira fez um jantar para festejar. No encontro tínhamos as seguintes pessoas: Eduardo Cunha, Milton Lira, Ricardo Fonseca e André Esteves."

Procurado para comentar as acusações contidas em manuscrito apreendido da casa de Diogo Ferreira, chefe de gabinete do senador Delcídio Amaral (PT-MS), o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reagiu com indignação. Disse que nunca viu o assessor na vida e que a história é absurda.

— Isso é absurdo. É manuscrito de um assessor do Delcídio. Tem de perguntar a esse assessor que manuscrito é esse. Isso é absurdo, não é documento. É uma anotação de um cara que não sei quem é, que nunca vi na vida que não é do banco, e que escreve isso  — respondeu Cunha ao GLOBO.

O presidente da Câmara disse que a história parece "meio armação" e que não pode ser levada a sério.

— Me parece meio armação. Não dá para eu levar a sério . Você anota algo sobre terceiros e aí expõe?- questionou.
Perguntado sobre o jantar onde teria comemorado com André Esteves e outras duas pessoas que teriam participado da negociação da medida provisória, Milton Lira e Ricardo Fonseca, Cunha também negou. Disse que só conhece o banqueiro:

— Não sei quem são, não tive jantar com ninguém. Só conheço o Esteves, os outros, não.

O presidente da Câmara postou uma série de mensagens no twitter se defendendo das anotações encontradas na casa do assessor do senador Delcídio Amaral. Ele desafiou a provarem que participou de negociações relacionadas à MP 608, que permitiu o pagamento de crédito a instituições bancárias falimentares:

— Desminto o fato é coloco sob suspeição essa anotação.E incrível transformar uma anotação em acusação contra mim (...) Desafio a provarem qualquer emenda minha que tenha sido aprovada nessa MP. Desafio a encontrarem qualquer participação minha em discussão dessa MP — afirmou em alguns trechos dos textos que divulgou nas redes sociais.

Em nota à imprensa, o BTG Pactual nega "veementemente" a realização de qualquer tipo de pagamento para suposto benefício referente a Medida Provisória 608, criada em março de 2013 e informa que está à disposição das autoridades para prestar todos os esclarecimentos necessários.

A MP 608 permitiu ao Banco Central determinar a extinção de dívidas dos bancos. A intenção do governo, com a medida, era impedir que a deterioração iminente da situação econômica de algumas instituições financeiras atingisse um ponto de não viabilidade.

A anotação principal, sobre os habeas corpus no STF e no STJ, trazia um "verdadeiro roteiro sobre a conversa gravada" por Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, conforme o pedido feito pela PGR. Foi essa gravação que levou à prisão de Delcídio, Diogo, Esteves e do advogado Edson Ribeiro. Todos, agora, estão em prisão preventiva. "André Esteves está disposto ao que for necessário para evitar que o complexo investigatório cognominado Operação Lava-Jato se mova na direção do Banco BTG Pactual", registra o procurador-geral.

No dia 5 de novembro, o relator do HC no STF citado no documento, ministro Edson Fachin, negou o habeas corpus 130.915. Nele, a defesa do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró questiona a decisão do ministro Teori Zavascki de homologar o acordo de colaboração premiada do também ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Em depoimentos, Paulo Roberto incriminou Cerveró. Se o acordo fosse anulado, também seria anulada parte das provas contra Cerveró. Na justificativa da decisão, Fachin alegou um motivo técnico: não é possível questionar em habeas corpus decisão tomada por outro ministro do STF.

Em 29 de setembro, o ministro Teori Zavascki negou o habeas corpus 130196, outro HC citado no documento apreendido. Nele, a defesa de Cerveró pedia que seu cliente fosse libertado. Zavascki argumentou que continuavam presentes os argumentos que justificaram a prisão do investigado.

No dia 13 de outubro, o ministro Ribeiro Dantas, do STJ, negou o recurso em habeas corpus 59.834, em que ele pedia também a revogação da prisão preventiva determinada pela Justiça Federal no Paraná. O benefício foi negado diante de fortes indícios de participação de Cerveró nos desvios da Petrobras.