Boa Viagem Américas

Testamos roteiros simples e divertidos para pedalar em cidades da Europa, dos EUA e do Brasil

Nos Estados Unidos, andamos de bicicleta em Miami, Los Angeles, São Francisco e Nova York

Em Miami, as bikes Art Déco estarão em breve circulando no Design District e em Wynwood
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Foto de Fernanda Dutra
Em Miami, as bikes Art Déco estarão em breve circulando no Design District e em Wynwood Foto: / Foto de Fernanda Dutra

Perder-se em uma cidade estrangeira a pé, embora seja bom para descobrir novos lugares, muitas vezes tem custo, ou para o bolso, por conta do táxi, ou para as pernas. Mas se perder de bicicleta geralmente não custa nada. Em Amsterdã, Berlim e Londres, entrar na rua errada me levou a conhecer parques e praças, entre tantos que existem nessas cidades, e até bairros que nem imaginava serem interessantes. Depois, pedalava aleatoriamente até reencontrar o caminho do hotel. As bicicletas me convenceram de que podem completar a viagem, cobrindo áreas mais extensas, levando a mais lugares em menos tempo e revelando regiões de subúrbio charmosas.

Atualmente, milhares de turistas se aproveitam da comodidade dos sistemas de bicicletas públicas compartilhadas pelo mundo. Amsterdã foi precursora na ideia: em meados dos anos 1960, um grupo de ativistas espalhou pelos canais as chamadas Bicicletas Brancas. Qualquer um poderia usar o quanto quisesse. Em pouco tempo, elas foram roubadas. Várias experiências foram testadas, até que a França lançou um sistema eletrônico que rastreava cada bicicleta. Em 2007, quando o Vélib começou em Paris, menos de dez países no mundo tinham bicicletas públicas. Hoje, são quase 50 e mais de 500 cidades, segundo um relatório do instituto americano Earth Policy.

O Vélib ajudou a dobrar o número de deslocamentos diários em bicicletas por Paris. As estatísticas mostram que ao menos uma entre três bicicletas na rua é do sistema público. A adoção da bicicleta no dia a dia foi tão forte que, em 2012, todos os países europeus, com exceção da Bélgica e de Luxemburgo, venderam mais bicicletas que carros, informa o site de rádio NPR, baseada em Washington DC. Mais bicicletas na rua acabaram por estimular a expansão das ciclovias, o que vem acontecendo no Brasil também. Por aqui, o Rio foi a primeira capital a lançar as bicicletas públicas, em 2009.

As regras lá fora costumam ser mais rígidas do que no Brasil. Nos EUA e na Europa, ciclistas devem cumprir leis de trânsito semelhantes às dos motoristas de carro, como andar nas faixas indicadas, nunca em calçadas ou na contramão, respeitar os sinais de trânsito, estacionar nos locais indicados. Algumas cidades têm peculiaridades, como exigir o uso de capacete para todos os ciclistas (na Austrália) ou só para menores de 16 anos (na Suécia). Em geral, observando o comportamento de outros ciclistas , é fácil entender as regras.

DAS VIAS EXPRESSAS ÀS CICLOVIAS

Poucas cidades representam tão bem a cultura do carro nos Estados Unidos como Los Angeles. Quem não dirige ou paga caro nos táxis ou não vai muito longe. Mas mesmo a metrópole cortada por vias expressas vem se esforçando para expandir suas ciclovias e incentivar o turismo independente da gasolina. Nos calçadões à beira-mar, em Santa Monica ou Venice Beach, o ciclismo já é uma opção popular. Várias lojas alugam bicicletas e triciclos para rodar na ampla ciclovia de mão dupla.

Foi uma surpresa, porém, confirmar que também é tranquilo rodar em bairros de maior densidade urbana e tráfego. Escolhi explorar Silver Lake e Echo Park, onde a bicicleta é quase tão onipresente como em Portland — a capital hipster americana orgulha-se de ter o maior percentual no país de moradores que vão trabalhar de bicicleta, 6,4% — quase o dobro de São Francisco, com 3,4% — segundo o Censo nacional. Como LA ainda não tem sistema de bicicletas públicas, aluguei uma na loja e oficina Speed Works, em Silver Lake. Gostei mais de guiar uma bicicleta que não anunciasse minha condição de turista. Parada no sinal, recebi elogios de um rapaz pela cor prateada da bike; mais tarde, fui parabenizada por não furar o sinal de trânsito.

Planos, Silver Lake e Echo Park são ligados pela Sunset Boulevard num longo trecho de ciclovia. Os dois oferecem boas paradas, como os cafés Intelligentsia e Casbah; a loja de discos Origami, que também expõe gravuras, e a Time Travel Mart, com “itens indispensáveis a uma viagem no tempo”, como fitas VHS e bigodes postiços.

São Francisco não tem tantas áreas planas quanto Los Angeles. Mas é das mais amigáveis às bicicletas no país. Dados da organização não governamental local Bicycle Coalition indicam que as bicicletas compõem 67% do trânsito em dias de semana na Market Street, avenida que cruza a cidade — o equivalente a três mil viagens por dia. Por isso a Market St. não é recomendável aos ciclistas inexperientes.

Mais fácil percorrer a margem da Baía de São Francisco. É possível rodar um longo trecho com raros desvios na ciclovia, desde o Píer 39, onde reinam os famosos leões-marinhos, até a área recém-revitalizada de Dogpatch. Entre os dois, está Embarcadero, região repleta de armazéns renovados. Ali fica o Exploratorium, mais novo museu da cidade, com exposições interativas sobre ciências. A poucas pedaladas, topamos com o Ferry Building, prédio histórico tomado por lojas gourmet. Mais adiante, a escultura de arco e flecha gigante de Claes Oldenburg e Coosje van Bruggen.

O extenso Golden Gate Park oferece uma pedalada ainda mais tranquila, que pode ser combinada com a visita ao museu de arte De Young e à Academia de Ciências da Califórnia. Desde agosto de 2013, é possível fazer tudo isso com o sistema de bicicletas públicas, o Bay Area Bike Share. O cadastro é feito nas estações de rua; a diária custa US$ 9. O único porém é que as bikes não têm cestinha, só um elástico para prender as bolsas.

Miami Beach tem seu bike share , a DecoBike, desde 2011, com mais de três milhões de aluguéis registrados até hoje. As diárias custam US$ 14. Pedalar de North a South Beach é simples. Há ciclovias nas principais vias, largas o suficiente para dar uma sensação de segurança. Dê-se um tempo para conhecer a bike no trecho à beira-mar do Lummus Park, com a vista das fachadas art déco de South Beach. É fácil atravessar a ponte Venetian até Downtown Miami, mas acrescente mais 5 km à jornada. Se preferir, alugue outra bike por lá. Mas não deixe de percorrer os bairros de Midtown, Wynwood e Design District. Essas áreas têm ruas menos movimentadas, com ciclovias, e são repletas de grafites e galerias. A DecoBike deve instalar suas estações por ali ainda este ano.

NOVA YORK: DO CENTRAL PARK AO BROOKLYN OU QUEENS

Em Nova York, ciclistas devem estar atentos às leis de trânsito, seguidas com rigor
Foto: Foto de ANGEL FRANCO/The New York Times
Em Nova York, ciclistas devem estar atentos às leis de trânsito, seguidas com rigor Foto: Foto de ANGEL FRANCO/The New York Times

Pode-se dizer que o sistema de aluguel de bicicletas de Nova York, inaugurado há cerca de um ano, é um sucesso: o serviço anual já tem quase cem mil assinantes e, ao contrário do que se previa numa cidade conhecida pelo trânsito caótico de carros, táxis e pedestres, nenhum acidente grave foi registrado. São seis mil bicicletas azuis espalhadas por 332 estações no sul de Manhattan e em alguns pontos do Brooklyn.

Devido a problemas de financiamento, porém, o CitiBike — batizado para honrar um patrocínio de US$ 41 milhões — busca novos investidores para bancar uma aguardada expansão. Em Manhattan, o serviço, que custa US$ 9,95 por dia, é encontrado da Rua 59 para baixo. Mas o ciclista deve se aventurar com atenção: a cidade é rigorosa na punição de ciclistas que violam as leis de trânsito. Ficou famosa a prisão do ator Alec Baldwin, no mês passado, por pedalar na contramão.

Um dos roteiros mais simpáticos — e menos complicados — é explorar o Central Park. O parque, que disponibiliza mapas nas principais entradas, também aluga bicicletas (US$ 15 por hora) e oferece passeios guiados (US$ 53, em média). Não faltam atrações durante a viagem de 8 quilômetros, como o Strawberry Fields — o lendário campo em homenagem a John Lennon —, o Castelo Belvedere, o Terraço Bethesda, o Reservatório Jacqueline Kennedy Onassis e o Jardim de Shakespeare.

Para os mais audaciosos, há passeios como uma ida a Fort Tilden, no Queens, numa das praias mais selvagens da região. O percurso — de 21,5 kms — é plano e ainda conta com uma série de atrações no meio do caminho. De Manhattan, a dica é atravessar a Williamsburg Bridge em direção ao Brooklyn, pegar a Wythe Avenue para o sul e seguir pela Franklin Avenue. Virar à esquerda na Nostrand Avenue e imediatamente à direita na Bedford Avenue. Seguir a Bedford Avenue para o sul — passando pelo Brooklyn College e o prédio art déco da Sears — até o fim, à beira-mar. Dali, dobrar à esquerda na Emmons Ave., continuar por 800 metros e entrar na Belt Parkway Greenway, por 3,2 kms. Pegar a Flatbush Ave. — onde fica o Floyd Bennett Field, o primeiro aeroporto de Nova York —, cruzar a Gil Hodges, virar à direita na Rockaway Point Boulevard e pronto: a entrada da praia de Fort Tilden estará à esquerda. (Isabel de Luca, correspondente)