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ONU vai investigar se houve crimes de guerra de Israel em Gaza

Combates são brevemente suspensos na Faixa de Gaza para ajuda humanitária

Um menino palestino carrega sua bicicleta sobre escombros após um ataque militar israelense na Cidade de Gaza
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MAHMUD HAMS
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AFP
Um menino palestino carrega sua bicicleta sobre escombros após um ataque militar israelense na Cidade de Gaza Foto: MAHMUD HAMS / AFP

TEL AVIV — O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas decidiu nesta quarta-feira abrir uma investigação sobre a ofensiva militar israelense em Gaza, que em pouco mais de duas semanas provocou a morte de ao menos de 695 palestinos. Na reunião, 29 países votaram a favor da resolução (entre eles árabes e muçulmanos, latino-americanos e africanos, assim como Brasil, Rússia e China), os Estados Unidos votaram contra e a maioria dos europeus e Japão se abstiveram. Mais cedo, a Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay, havia pedido uma apuração sobre possíveis crimes de guerra israelenses em território palestino, ao mesmo tempo em que denunciara ataques indiscriminados do movimento islamista palestino Hamas contra zonas civis israelenses. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu condenou a decisão e disse que a ONU sinalizava ao Hamas que usar civis como "escudo humano" era uma boa estratégia.

“A última ofensiva militar israelense na Faixa de Gaza tem causado ataques desproporcionais e indiscriminados que podem constituir crimes internacionais”, afirmou a resolução aprovada pelo Conselho, após quase sete horas de debate.

O texto solicitou o envio urgente de uma comissão internacional independente de inquérito para estabelecer, entre outras coisas, uma lista de violações e crimes e identificar responsáveis. Além disso, pediu para colocar os palestinos sob proteção internacional e apelou para a suspensão imediata dos ataques militares israelenses e a civis. O Hamas, por sua vez, descartou um cessar-fogo a menos que Israel levante o bloqueio a Gaza.

- Todos queriam que aceitássemos um cessar-fogo e depois negociássemos nossos direitos. Nós rejeitamos isso no passado e rejeitamos hoje. Quando concordarem com o cumprimento de nossas demandas, decidiremos o momento para um cessar-fogo - disse Khaled Meshaal, que mora no Qatar.

Mais cedo, Pillay afirmou em um debate de emergência do Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra que a ofensiva militar israelense não tinha feito o suficiente para proteger civis. Ela também criticou o Hamas por “ataques indiscriminados” em Israel.

Os combates na região foram brevemente suspensos em duas áreas de Gaza nesta quarta-feira, para ajuda humanitária, informou a Cruz Vermelha, mas há registros de violência em outras localidades.

— Um comboio de sete ambulâncias e dois veículos da Cruz Vermelha entrou em Shajaya para retirar os feridos — indicou a porta-voz do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Cecilia Goin.

Segundo a CICV no Twitter, uma terceira área está incluída no acordo, no Norte da Faixa de Gaza, em Beit Hanun, perto da fronteira israelense.

UMA NOVA FASE DO CONFLITO

Apesar da suspensão, o secretário americano de Defesa, Chuck Hagel, afirmou que Israel pediu ajuda financeira aos Estados Unidos para compensar dificuldades na operação de seu sistema de defesa antiaérea, e o ministro israelense da Defesa, Moshe Ya'alon, alertou as tropas para se prepararem para uma nova fase da ofensiva contra Gaza.

Em Washington, Hagel afirmou que Israel pediu US$ 225 milhões para suprir carência relativas a “partes não especificadas” de seu mísseis Tamir, usado no sistema de defesa antiaérea. Segundo o secretário americano, o governo israelense afirma que não pode esperar pela próxima remessa de seu fornecedor americano, agendada para 2016.

O ministro israelense da Defesa, Moshe Ya'alon, ordenou que soldados das Brigadas de Golã se preparem para a próxima missão em Gaza, que visa localizar e destruir túneis da rede subterrânea utilizada pela resistência palestina.

— Estamos nos preparando para os próximos estágios do combate depois de lidar com os túneis, e vocês devem estar prontos para qualquer missão. É preciso estar pronto para passos mais importantes em Gaza, e as unidades que estão de prontidão precisam se preparar para entrar em combate — declarou Ya'alon.

O anúncio da ajuda vem no mesmo dia em que o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, chegou a Israel, num esforço para tentar negociar um possível cessar-fogo que interrompa o mais mortal confronto em anos entre Israel e o Hamas. E no momento em que a violência explodiu na vila de Hazaa, no Sul de Gaza, com relatos de dezenas de mortos e feridos por um ataque pesado das forças israelenses.

De acordo com informações da mídia palestina, citando fontes locais, Hazaa está sitiada e em chamas. No 16º dia da operação militar israelense “Limite Protetor” contra o grupo militante islâmico, o número de mortes do lado palestino já chega a 655. Do lado de Israel, foram registradas a morte de 32 soldados e de dois civis.

O combate chegou também ao Hospital al-Wafa em Gaza, que foi atacado pelas Forças Armadas de Israel depois que militantes do Hamas disparam contra soldados israelenses de dentro da instalação. Segundo comunicado divulgado pelo porta-voz do Exército, Israel já havia advertido repetidamente sobre suas intenções de atacar o hospital. O diretor do centro informou ao jornal “Haaretz” que o local está vazio desde 17 de julho.

O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, conversa com o vice-chefe da embaixada americana Bill Grant ao desembarcar em Tel Aviv Foto: Charles Dharapak / REUTERS
O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, conversa com o vice-chefe da embaixada americana Bill Grant ao desembarcar em Tel Aviv Foto: Charles Dharapak / REUTERS

O secretário de Estado americano disse que “alguns passos” foram dados em direção a uma trégua, mas advertiu “que ainda há muito a ser feito”. O avião que trouxe Kerry aterrissou no Aeroporto Internacional Ben-Gurion, em Tel Aviv, um dia depois de a Administração de Aviação Federal (FAA, na sigla em inglês) dos EUA ter proibido as companhias áereas americanas de voarem para Israe l.

Kerry visitará ainda Jerusalém e Cisjordânia, e tem encontros agendados com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu; com o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas; e com o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon.

A decisão da FAA foi tomada de depois da queda de um foguete em Yehud, perto do aeroporto de Ben Gurion. Adotada na terça-feira, ela foi estendida por mais 24 horas nesta quarta.

TROCA DE ACUSAÇÕES NA REUNIÃO DA ONU

Durante a reunião extraordinária em Genebra, o ministro das Relações Exteriores palestino, Riad Maliki, também acusou Israel de cometer crimes contra a Humanidade em Gaza. E exigiu uma investigação internacional.

— Israel está cometendo crimes hediondos. Israel destrói completamente bairros residenciais. O que Israel faz é um crime contra a humanidade e viola as convenções de Genebra — declarou o chanceler. — Israel, força de ocupação, mira há 16 dias nas crianças, mulheres, idosos e os priva de seu direito à vida com bombardeios. Há uma incursão terrestre e isso vai trazer consigo crimes contra civis palestinos, assassinatos deliberados de civis.

Já o representante israelense no Conselho, Eviatar Manor, acusou o Hamas de cometer crimes de guerra quando dispara foguetes e mísseis contra civis, constrói túneis para atacar aldeias e oculta munições nas escolas.

— O Hamas carrega toda a responsabilidade pelas vítimas de Gaza e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, deveria dissolver seu governo para demonstrar sua vontade de paz — afirmou.

A reunião extraordinária desta quarta-feira foi convocada para estudo de um projeto de resolução apresentado pela ANP pedir proteção internacional para os palestinos e uma investigação internacional urgente sobre a ofensiva israelense. Também pedia à Suíça, como depositária das Convenções de Genebra, que organize uma conferência sobre a situação dos territórios ocupados.