Rio

Jornalistas denunciam violência contra a categoria em protestos

Na maioria dos casos, cerca de 80% dos registros e relatos, a violência foi praticada por policiais
Audiência pública na Câmara de Vereadores discute violência contra jornalistas Foto: Ana Branco / Agência O Globo
Audiência pública na Câmara de Vereadores discute violência contra jornalistas Foto: Ana Branco / Agência O Globo

RIO — Quarenta e nove jornalistas foram agredidos durante as manifestações ocorridas no Rio, entre os meses de junho e outubro deste ano. Na maioria dos casos, cerca de 80% dos registros e relatos, a violência foi praticada por policiais. Os dados fazem parte do relatório “Cultura, liberdade de imprensa e violência contra profissionais de mídia”, elaborado pelo Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio, e apresentado na manhã desta terça-feira, em audiência pública na Câmara de Vereadores. O material será encaminhado ao Ministério Público.

O relatório, feito a partir de dados coletados pelo próprio sindicato, mostra que dos 49 jornalistas agredidos, 25 relataram ter sofrido hostilidades por parte de manifestantes. O caso mais grave foi o de uma repórter da Rede Record, que teve a escápula deslocada por um soco nas costas durante uma manifestação contra o Leilão de Libra, em 21 de outubro.

A quantidade de profissionais agredidos por policiais militares, porém, foi bem maior: 30. Na lista há fotógrafos que foram agredidos mais de uma vez. Também há casos, como o da equipe da Globonews, que foi expulsa da Câmara Municipal do Rio, no dia da instalação da CPI dos ônibus, por servidores do estado.

— Esse número é subestimado. A falta de registro de ocorrências em delegacias e órgãos competentes dificulta a análise mais precisa dos casos — disse a presidente do sindicato, Paula Máiran.

Na Câmara, a discussão trouxe à tona casos de excessos praticados por policiais militares nos protestos e ressaltou a importância do papel da imprensa na democracia. Num relato breve e impressionante, o fotógrafo Edson Taciano, da FuturaPress, contou que foi ferido por bombas de efeito moral lançada propositadamente por policiais do Batalhão de Choque em cima dele e de outros dois colegas, também fotógrafos, na Cinelândia:

— Eu estava perto de um carro do Batalhão de Choque e fui avisado pelos policiais que deveria me afastar. Na mesma hora me afastei, mas mesmo assim fomos atingidos por balas de borracha e bombas de efeito moral sem qualquer motivo. Não havia manifestantes por perto. Fui atingido no abdômen e um colega meu, por estilhaços nas costas. Ao reclamar, o PM disse que eu deveria procurar o 13º BPM (Praça Tiradentes) — contou Edson.

O relações-públicas da Polícia Militar, o tenente-coronel Cláudio Costa, admitiu que ocorreram agressões de policiais, mas destacou que não foram de forma deliberada:

— Em momento algum a polícia quis agredir gratuitamente o profissional de imprensa, mas nós vimos isso em relação aos manifestantes. Acho que a imprensa tem que ser livre, isso é importante para a democracia. Todas as questões envolvendo arbitrariedades e excessos da PM serão apurados pela corporação,  como a Ouvidoria e o Ministério Público. No ano passado excluímos 317 policiais militares, não é um número que nós nos orgulhamos, mas isso mostra que a PM corta na própria pele se for preciso — disse Cláudio, ressaltando que 55 policiais ficaram feridos nas manifestações.

Brasil é o quarto país mais inseguro para jornalistas no mundo

As informações foram contestadas por profissionais que estiveram no plenário da Câmara. Alberto Jacob Filho, da Associação dos repórteres fotográficos e cinematrográficos do Rio de Janeiro, se disse “estarrecido” com a declarações:

— Fiquei estarrecido com as declarações do relações-públicas da PM. Como se as agressões fossem cometidas no meio de um tumulto, por acaso. Os profissionais da imprensa são completamente identificados. Não justifica essa truculência. A gente não quer uma nova legislação, ela já protege o jornalista. O Estado é que precisa assumir a responsabilidade de proteger o jornalista ao invés de espancá-lo.

Durante a audiência, o deputado estadual Robson Leite (PT) disse que trabalha na tramitação de um projeto que atribui à Polícia Federal a resolução de crimes contra jornalistas no Brasil. Essa também seria uma forma de tirar o poder da Polícia Militar nesses casos, já que ela é apontada como um dos principais obstáculos ao trabalho jornalístico. A violência contra jornalistas também foi lembrada por Gustavo Barreto, do Centro de Informação das Nações Unidas no Brasil.

— O Brasil ocupa a quarta posição entre os países mais inseguros para jornalistas do mundo, ficando atrás da Somália, Síria e Paquistão. É um dado grave — diz ele, ressaltando que não existe um ranking universal, mas um levantamento feito a partir de dados de associações e ONGs.