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Perfil: Janaína Paschoal e a ‘República da Cobra’ que tomou conta das redes

'Não sou pastora, nem estava possuída', diz advogada que assina pedido de impeachment

Veemência. Janaína Paschoal, no discurso que tomou as redes sociais
Foto: Edilson Dantas/4-4-2016
Veemência. Janaína Paschoal, no discurso que tomou as redes sociais Foto: Edilson Dantas/4-4-2016

SÃO PAULO — Os cabelos estavam presos e a camisa amarela alinhada, até que o discurso da jurista Janaína Paschoal começasse na noite de segunda-feira, na Faculdade de Direito da USP. A uma plateia de alunos que a chamavam de “Janalinda” e disputavam selfies com ela, a advogada, de 41 anos, defendeu exaltada a saída da presidente Dilma Rousseff. Girando no ar uma bandeira do Brasil, disse que o país não é uma “República de Cobras” , em referência ao discurso em que o ex-presidente Lula se comparou a uma jararaca. Os cabelos voavam, enquanto ela dava socos no ar, pontuando seu inflamado discurso.

— Foi uma exaltação cívica. Ela tem temperamento explosivo, mas é lúcida e não entra em canoa furada — definiu o jurista Hélio Bicudo, presente ao ato e que também assina o pedido de impeachment da presidente.

O discurso de Janaína foi convertido em piada e memes de internet. Mensagens que ironizavam sua fala levaram ontem o nome da advogada aos Trending Topics nacionais do Twitter. Parte do humor se concentrou na comparação da descabelada advogada com a protagonista do filme americano “O Exorcista”.

“Diz a lenda que se você puser a fala de Janaína Paschoal de trás para a frente, ouve o discurso de posse de Michel Temer”, dizia a mensagem colada a uma foto de Janaína compartilhada pelas redes sociais. Uma montagem também a colocou como vocalista do clássico do metal “The number of the beast”, da banda Iron Maiden.

As piadas e agressões foram postadas inclusive como comentários em mensagens publicadas pela própria advogada em sua página no Facebook.

O site de “notícias falsas” Sensacionalista publicou que Janaína era a “menina pastora”, referência a uma pregadora que ganhou fama em 2007.

— Não sou pastora, nem estava possuída, nem tinha bebido, também nunca usei droga. Só sou uma brasileira cansada de tanta hipocrisia. Nem sabia que essa criança existia — disse Janaína ao GLOBO ontem à noite.

Em sua página no Facebook, o escritor Fernando Morais, defensor do governo, disse que Janaína “está urgentemente precisada de um exorcista e um vidro de xampu. Não necessariamente nessa ordem”. Petistas sugeriram que, dado o tom político da advogada, Janaína será candidata a deputada federal em 2018.

— Esses petistas vão quebrar a cara, ela é forte, não se encanta com holofotes. Não é e nem vai ser uma personalidade pública. É apenas uma mulher movida por causas — disse o preocupado pai de Janaína, Ricardo Paschoal.

No fim do ano passado, Janaína, a mais velha dos quatro filhos de Paschoal, convocou uma reunião familiar para dizer que estava disposta a encabeçar o pedido de impedimento da presidente.

— Fomos contra, temos medo de retaliação. Mas, depois, ela me disse que era mesmo o que queria. O que posso fazer? Ela tem 41 anos — disse Paschoal, frisando que a advogada toma cuidado para não descer do carro quando leva os filhos de 12 e 8 anos à escola; a família teme que as crianças sejam alvo de agressão.

Com duas irmãs, Janaína comanda um bem-sucedido escritório de Direito Penal econômico nos Jardins, área nobre de São Paulo. Ela se recusa a atender estupradores e traficantes. No site do escritório, define sua atuação: “sua aflição será nossa aflição”.

— É a melhor advogada do Brasil, me defende há 15 anos e nunca perdemos. Quando entra numa história, é para ganhar — diz o socialite Chiquinho Scarpa.

Na terça-feira, porém, durante julgamento em Brasília, Janaína não salvou seu cliente, o procurador da República Douglas Kirchner, da demissão pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Kirchner é acusado de espancar a ex-mulher.

Além de advogar, Janaína é professora de Direito Penal na USP, faculdade onde obteve o doutorado, sob orientação do jurista tucano Miguel Reale Júnior, que também assina o pedido de impeachment.

Na USP, quando fazia a graduação, ajudou a organizar atos pelo impeachment do então presidente Fernando Collor, em 1992: pintou o rosto para sair às ruas. Como professora, é descrita como “boa e assídua, acima da média”.

— Ela nunca expressou nenhuma preferência política nem citava Deus nas aulas — diz uma ex-aluna.

Janaína, que afirma ser espírita, têm atribuído a forças superiores o fato de ter conhecido Bicudo. Em seu discurso, afirmou que “Deus manda uma legião para cortar as asas da cobra”, em referência a Lula. Ela submeteu o pedido de impeachment a um padre amigo da família.

— Demoniza-se tanto quem fala em Deus, mas estão matando Deus e colocando o dinheiro, o poder e um, ou alguns homens, no lugar — disse ao GLOBO, sobre a repercussão de seu discurso e completou: — Admitem que se acuse Dilma, mas Lula é intocável! O problema foi ousar questionar o Deus do petismo.

(Colaboraram Luíza Souto e André de Souza)