Economia

Justiça de São Paulo determina quebra de sigilo de grupos de mensagens no WhatsApp

Decisão do TJ-SP manda Facebook, dono do app, revelar dados sobre os autores de mensagens com montagens pornográficas de uma jovem universitária
Aplicativo WhatsApp: na mira da Justiça de São Paulo Foto: Divulgação
Aplicativo WhatsApp: na mira da Justiça de São Paulo Foto: Divulgação

RIO — A Justiça de São Paulo determinou em decisão divulgada nesta quarta-feira que o Facebook quebre o sigilo das informações a respeito de dois grupos de troca de mensagens no aplicativo WhatsApp, adquirido pela empresa em fevereiro deste ano, com o objetivo de identificar os envolvidos na criação e na disseminação de montagens pornográficas com fotos de uma estudante universitária paulista.

As fotomontagens mencionadas no processo são de uma estudante de engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie e foram criadas a partir de fotos dela publicadas em seu perfil no Facebook. Espalhadas pelos grupos de troca de mensagens “Atlética Chorume” (sic) e “Lixo Mackenzista” entre os dias 26 e 31 de maio deste ano, as imagens colocavam o rosto da jovem de 21 anos em fotos com posições pornográficas.

Em seu voto na turma julgadora do caso, o relator do processo, juiz Salles Rossi, da 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, menciona a obrigação do Facebook de manter os registros do WhatsApp no país, conforme determina o artigo 13 do Marco Civil da Internet, propiciando meios para a identificação de usuários e o teor de conversas quando solicitados pela Justiça.

“O serviço do WhatsApp é amplamente difundido no Brasil e, uma vez adquirido pelo Facebook e somente este possuindo representação no País, deve guardar e manter os registros respectivos, propiciando meios para identificação dos usuários e teor de conversas ali inseridas – determinação, aliás, que encontra amparo na regra do artigo 13 da Lei 12.965/2014 (conhecida como Marco Civil da Internet)”, afirmou.

Em sua defesa, o Facebook alegou que não poderia ceder os dados do aplicativo de troca de mensagens porque a sua aquisição ainda não estaria concluída do ponto de vista legal nos EUA, e que os dados ainda seriam de responsabilidade da companhia WhatsApp Inc, sem sede no Brasil. No entanto, o argumento foi rejeitado pelo juiz Salles Rossi, que determinou que a rede social deve divulgar à Justiça todas as informações requeridas, relativas aos IP’s dos perfis indiciados no processo, no prazo de cinco dias.

Questionado sobre a decisão do TJ-SP, o Facebook reiterou a sua posição:

"O Facebook Brasil não comenta casos específicos, mas esclarece que a aquisição do WhatsApp ainda não foi concluída e que ambas empresas atuam de forma independente", afirmou a empresa por e-mail.

Vítima cogitou suicídio

A ação pela quebra do sigilo das informações do WhatsApp foi movida pela mãe da estudante, a advogada Adriana Serrano Cavassani, há cerca de dois meses, tão logo ela foi informada pela filha sobre o caso. De acordo com Cavassani, além das montagens, as mensagens ainda divulgavam o telefone celular da filha, que passou a receber ligações de homens desconhecidos propondo encontros sexuais.

— Meu objetivo é identificar os responsáveis pela criação e disseminação das imagens e mensagens, para que possam ser responsabilizados civil e criminalmente. Todo o caso tem sido muito desgastante pra minha filha. É muito difícil para uma jovem lidar com esse tipo de situação hoje em dia na sua própria universidade — afirma ela.

Segundo a advogada, o transtorno causado pelo caso fez com que a filha mostrasse sinais de depressão e cogitasse suicídio. Diante do transtorno, a advogada diz que cogitou interromper os estudos da filha na faculdade:

— Em um momento como esse, tudo com o que você se preocupa é em fazer com que a sua filha pare de sofrer. Assim, pensamos em mandá-la estudar fora do país. No entanto, como ela é boa aluna e já está quase no final do curso, decidimos que não seria justo com ela interrompermos a sua trajetória profissional por causa de um grupo de inconsequentes. São eles que precisam pagar, não ela.

Além da ação, a advogada também pediu a abertura de um inquérito policial para apurar a identidades dos envolvidos nas mensagens, e que já estaria próximo de ser concluído. Os principais suspeitos seriam outros estudantes da universidade da filha.

— Agora aguardaremos a conclusão da investigação e o cumprimento da decisão judicial. Pretendemos abrir um processo criminal por calúnia e difamação contra os envolvidos, que não se resumem apenas a quem criou as mensagens. Aqueles que ajudaram a espalhá-las também serão responsabilizados — afirma a advogada.

Aumento de ações judiciais

Especialista em Direito Digital e sócio diretor do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, Márcio Mello Chaves explica que, de acordo com o Marco Civil da Internet, as empresas de tecnologia que operam por aqui devem manter os seus dados armazenados no país, mesmo que não tenham sede no Brasil:

— O Marco Civil da Internet agora deixa claro que mesmo quando falamos de empresas sediadas no exterior, se elas operam no país, é preciso respeitar a legislação nacional, inclusive quanto à preservação dos dados no Brasil, sob o risco de terem o seu serviço suspenso caso não acatem à legislação.

Para o advogado, com o início da vigência do Marco Civil, ações judiciais envolvendo empresas de tecnologia e solicitações sobre a retirada de conteúdos do ar, ou a divulgação de informações à Justiça, devem se multiplicar:

— Toda a discussão em torno do Marco Civil trouxe à tona diversas questões que passaram a ser melhor divulgadas pela mídia, proporcionando uma conscientização sobre elas que antes não existia. É o caso dos pedidos de remoção de conteúdos em casos de difamação ou divulgação de fotos íntimas, por exemplo — afirma. — Se antes esses procedimentos não ficavam totalmente claros à população, agora eles já estão melhor definidos na legislação.