A minha confiança em receitas impressas nasceu com o lançamento da revista Marie Claire no Brasil.Eu tinha 14 anos quando decidi executar a batata gratinada dourada e suculenta que estampava uma página inteira na seção de receitas de uma de suas primeiras edições. Segui fielmente as indicações de quantidades e preparo e o resultado foi um sucesso. As batatas ficaram deliciosas.
Foi reconfortante descobrir que qualquer prato poderia sair da cozinha dos meus pais, contanto que eu seguisse as instruções. Muito tempo passou sem que eu tentasse executar outra receita impressa. Chamo de receitas impressas essas até então desconhecidas que vêm em livros ou revistas. As receitas passadas de boca em boca, ou de boca em papel, nos cadernos pessoais, são outra categoria de manual. Já chegam com algum histórico de ajustes necessários para dar certo, feitos por amadores como eu.
Meu interesse por receitas reviveu com a valorização dos livros de cozinha. No tempo da minha batata gratinada, não havia a profusão de livros de receitas que temos hoje. Os que existiam, eram bem diferentes dos de agora. Eram guardados em prateleiras nas livrarias, apenas com as lombadas à mostra. Quando começaram a ganhar formato e status de livros de arte, com capas duras e fotos maravilhosas, impressas em papel de primeira qualidade, voltei a querer descobrir com estranhos o que normalmente perguntava para amigos ou parentes. As suculentas ilhas exclusivas de livros de gastronomia, colocadas em áreas de destaque, passaram a ser um dos meus locais favoritos dentro das livrarias.
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As decepções foram tantas quanto foram os livros que comprei. Houve vitórias também, mas, depois de colocar muito ingrediente bom em pratos somente razoáveis, fiquei ressabiada. Ao contrário da certeza que adquiri com as batatas gratinadas da Marie Claire, passei a achar que, mesmo seguindo as receitas à risca, o resultado seria imprevisível.
Minha amizade com a prática de cozinhar com novas receitas foi restabelecida com os blogs de receita. Com eles, consegui identificar o momento em que o cozido desandava. A experiência com os livros de receita já me mostrara que era nos detalhes que eu me perdia. Num dia, por preguiça, resolvia pular um pedaço do processo. Noutro, substituía, de forma desastrada, um ingrediente por outro - ou me distraía em relação ao ponto de cozimento. Ocorre que nos blogs, diferentemente dos livros, encontro um botãozinho de mensagem ou contato para postar as minhas dúvidas ou confessar as ideias que tenho para simplificar algum processo. E, para a minha grata surpresa, descobri que eles funcionam! Os blogueiros respondem! Brasileiros, americanos ou franceses, essas boas almas estão lá, por hobby ou por profissão, dispostos a nos orientar na cozinha. Secos ou bem humorados, o que importa é que, de fato, eles nos contam por que uma substituição de ingrediente pode ou não dar certo. Explicam como driblar algum processo mais complicado, que não temos tempo ou paciência para finalizar, ou nos mandam tomar vergonha na cara por alguma etapa que queremos pular.
Há muitos blogueiros que não respondem em tempo hábil para que você continue empolgado com a receita. Ou mesmo que não responderão nunca. Mas, mesmo quando isso ocorre, a página de comentários pode conter dicas valiosas.
Os blogs não substituem os livros de receita. Eles os complementam. Ao recebermos as pitadas de sabedoria (que fazem toda a diferença) dos blogueiros, nos tornamos aptos a usar nossos amados livros de receitas sem tantas surpresas frustrantes. Sempre adorei livros de receita. E, com a ajuda de blogueiros solidários, pude voltar a adorar usá-los. A única coisa que realmente me aborrece a respeito deles é que não tenho prateleiras o suficiente para guardar todos que quero ter.
Flávia Yuri Oshima escreve às sextas-feiras.