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Morre, aos 99 anos, o tradutor Boris Schnaiderman

Responsável por principais versões da literatura russa, autor influenciou gerações
Boris Schnaiderman ao lado da máquina de escrever que usou até o fim da vida Foto: Fernando Donasci / Agência O Globo
Boris Schnaiderman ao lado da máquina de escrever que usou até o fim da vida Foto: Fernando Donasci / Agência O Globo

RIO — Um dos maiores nomes da tradução no Brasil, Boris Schnaiderman morreu nesta quarta-feira, em São Paulo, aos 99 anos, em decorrência de uma pneumonia contraída depois de uma operação. Pioneiro na difusão da literatura e da cultura russas no país, ele foi o responsável pelas traduções diretas no Brasil de uma série de autores como Dostoiveski, Púchkin, Tolstói e Tchékhov.

Em 1942, Schnaiderman publicou sua primeira tradução: “Os irmãos Karamázov”. Era a primeira vez no Brasil que o clássico de Dostoiévski ganhava uma versão feita a partir do idioma russo. Quando viu o livro pronto, porém, Schnaiderman se decepcionou. Ele tinha procurado recriar em português o estilo solto do mestre russo, mas o revisor mudou tudo para um português empolado.

Nos anos seguintes, Schnaiderman faria outras versões de “Os irmãos Karamázov” e de vários outros clássicos russos, sempre diretamente do original. Seu trabalho pioneiro, numa época em que esses autores costumavam ser traduzidos a partir do francês ou do espanhol, fez dele um nome central na difusão da literatura russa no Brasil. Em sete décadas de carreira, ele se firmou como um dos maiores nomes da tradução no país, inspirando gerações de outros tradutores, pesquisadores e leitores.

Nascido em Úman, na Ucrânia, em 1917, ano da Revolução Russa, Schnaiderman veio com a família para o Brasil em 1925. Além de dezenas de traduções, publicou livros de ensaios, ficção e memórias. Entre os mais recentes estão “Tradução, ato desmedido” (2011), o romance “Guerra em surdina” (2004) e o livro de memórias “Caderno italiano” (2015). Os dois últimos partem de uma experiência decisiva na vida de Schnaiderman: sua participação na Força Expedicionária Brasileira (FEB) e na campanha de Monte Castelo, na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial.

De volta ao Brasil, foi um dos fundadores do curso de língua e literatura russas na Universidade de São Paulo (USP), onde passou a dar aulas. Nos anos de 1960, durante a ditadura, sua origem e seu trabalho com a literatura russa fizeram com fosse preso sob acusação de "comunismo".

Apesar disso, continou a trabalhar com a cultura russa durante o regime militar, publicando, em parceria com os poetas concretos Augusto e Haroldo de Campos, traduções de Maiakovski, por exemplo. E nunca deixou de dar aulas na USP, onde se tornou professor emérito em 2001.