Coluna
Laura Muller sociedade@oglobo.com.br

Quando o não-dito faz mal

Dificuldades sexuais têm as mais variadas causas; conversar sobre o assunto é o primeiro passo para virar o jogo

Deixar de falar algumas verdades para evitar conflitos com o parceiro ou a parceira costuma ser uma atitude madura e sábia. O problema é quando o não-dito vai minando sorrateiramente o relacionamento, em especial se a questão é sexo. A correria dos dias atuais, aliada à gigantesca lista de compromissos que vai além da vida a dois, na maioria das vezes acaba ajudando a encobrir o que poderia e precisaria ser conversado. “Não deu tempo para a gente tocar nesse assunto”, desculpam-se homens e mulheres. Ok. Mas até que ponto varrer a poeira para debaixo do tapete traz de fato sossego, conforto e, especialmente, satisfação?

Não dá para prever se os assuntos deixados de lado vão fazer bem ou mal à relação amorosa e erótica. No entanto, casais capazes de conversar mais abertamente sobre sexo saem ganhando no quesito bem-estar. Quanto ao desejo, por exemplo. É uma grande preocupação feminina e masculina manter o apetite sexual em alta, seja nas transas casuais ou em histórias de longa data. Porém, tudo o que se passa na vida como um todo pode influir na vontade e no pique para fazer sexo. Quem não conversa sobre seus humores, seus estresses, suas preocupações, a fase que está vivendo, os projetos que tem pela frente etc., acaba não mostrando à pessoa ao lado se o momento é propício ou não para a vivência do amor e do prazer.

E o desejo sexual? Se a vida anda complicada fora da cama, pode ser que isso caia naturalmente para segundo plano. E não há nada de errado em viver momentos assim. Esse é apenas o jeito como funcionamos na cama: nosso apetite sexual não combina com a cabeça cheia de problemas. É preciso entender e aceitar isso para respeitar a fase de cada um. Mais: para não ficar imaginando que não há mais atração entre o casal.

O mesmo se dá quanto à questão da ereção. Não conversar com calma quando ocorre um episódio de falha pode favorecer a instalação de um problema. O homem que se vê diante disso sente-se terrivelmente mal. “Melhor não tocar na ferida”, muitos costumam pensar. No entanto, é justamente o diálogo que vai ajudar no processo de cicatrização. Falar sobre o quê? Principalmente sobre como cada um está se sentindo: sobre os medos, as preocupações, as angústias, as dúvidas, os desconfortos e tudo o mais que uma dificuldade sexual pode trazer para a vida do casal.

Na maioria das vezes, o que passa pela cabeça de uma pessoa é completamente diferente do que sua parceira ou seu parceiro pensa sobre a mesma questão. Há muitos casos em que a mulher se sente culpada pela perda da ereção do homem. “Ele não gosta mais de mim”, “ele tem outra” ou “eu não desperto mais desejo nele” são ideias frequentes no universo feminino. Ao mesmo tempo, o homem pode estar justamente pensando: “Não estou sendo bom o suficiente para ela”, “ela vai procurar outro” ou “ela vai parar de gostar de mim”. Ou seja, ambos começam a saborear uma amarga dose de insegurança, que poderia ser rapidamente eliminada se houvesse uma conversa franca e acolhedora.

As dificuldades sexuais podem ter as mais variadas causas, que vão desde questões físicas a emocionais e culturais. Em geral, são desencadeadas ou reforçadas por temores, preocupações e ansiedades que todos nós podemos experimentar. Falar disso com o companheiro ou a companheira é o primeiro passo para virar o jogo, por mais difícil que a conversa pareça ser. Talvez uma dica seja apostar na sensibilidade para decidir quando é melhor encarar o desconforto de um bate-papo sobre sexo do que correr o risco de o silêncio trazer um mal-estar bem mais nocivo.

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