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Militantes LGBT comemoram escolha de 'Hoje eu quero voltar sozinho' como representante no Oscar

Além do filme de Daniel Ribeiro, pelo menos outros dois filmes com a temática integravam a seleção do Ministério da Cultura
Cena de 'Hoje eu quero voltar sozinho', de Daniel Ribeiro Foto: Divulgação
Cena de 'Hoje eu quero voltar sozinho', de Daniel Ribeiro Foto: Divulgação

RIO — Militantes do movimento LGBT comemoraram, nesta quinta-feira, a escolha do filme "Hoje eu quero voltar sozinho" para representar o Brasil no Oscar. Segundo especialistas, o longa de Daniel Ribeiro, sobre a descoberta sexual de um menino cego e seu envolvimento com um colega de escola, representa uma vitória não só do movimento, mas da sociedade em geral. Além disso, viram como positiva a presença de "Praia do Futuro", de Karim Aïmouz, e "Tatuagem", de Hilton Lacerda — ambos com temática LGBT —, na seleção de candidatos nacionais à disputa pela estatueta de filme estrangeiro. A última vez em que o país tentou uma vaga na premiação com uma produção sobre o assunto foi em 1985, com "O beijo da Mulher Aranha".

Coordenador da Coordenadoria Especial de Diversidade Sexual do Rio de Janeiro (Ceds), Carlos Tufvesson lembra que muita gente não compreende totalmente a natureza do relacionamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Para ele, "Hoje eu quero voltar sozinho" cumpre justamente a função de mostrar que não existe diferença entre os sentimentos dos gays e dos heterossexuais.

— O que há no filme é uma linda cumplicidade, que gera amor. Não importa se é gay ou não. Essa mensagem não é importante só para os direitos civis dos LGBT, mas para os de todos os cidadãos — disse Tufvesson, que havia acabado de participar de uma reunião e comemorou ao ser informado pelo GLOBO sobre a escolha de "Hoje...".

Tufvesson acredita ainda que o filme não enfrentará resistência em futuras projeções, já que, segundo ele, a trama é desenvolvida de forma natural. Em maio, "Praia do Futuro", de Karim Aïnouz, tornou-se o centro de uma polêmica quando um cinema de Aracaju foi acusado de carimbar nos ingressos do filme um alerta sobre cenas de sexo entre os personagens de Wagner Moura e Clemens Schick.

— Você viu alguém carimbando os ingressos de "Hoje eu quero voltar sozinho"? Nesse caso, trata-se de uma bela história de solidariedade. Poderia ser entre um menino e uma menina, não faz diferença. O amor não ofende — disse Tufvesson, citando o romance entre os personagens de Mateus Solano e Thiago Fragoso na novela "Amor à vida" como um caso parecido de aceitação. — Quem pediu aquele beijo não foi só público gay. Os héteros também queriam.

Alexander Mello, curador do Rio Festival Gay de Cinema, diz que a quantidade de filmes com temática LGBT na seleção do Ministério da Cultura indica a relevância da questão para a sociedade.

— O Oscar costuma escolher filmes que têm capacidade de agradar o grande público e que trazem informações importantes. "Hoje eu quero voltar sozinho" é, sem dúvida, o filme brasileiro atual que mais cumpre esse papel no cinema e tem grande chance de ser indicado. A escolha é perfeita, tanto pela questão LGBT que ainda é latente na política e na sociedade mundial, quanto pelo discurso rico e inovador do filme.

André Fischer, fundador do portal MixBrasil, faz uma diferenciação entre o movimento LGBT — essencial para as lutas políticas, mas pouco associado à cultura, diz — e a causa gay. Para ele, a escolha de "Hoje..." é extremamente significativa para o segundo caso, especialmente num ano em que a produção cinematográfica brasileira apostou nessa temática.

— É um tapa na cara dos conservadores. Temos uma grande produção cultural nessa área. O Daniel ( Ribeiro ), em particular, tem uma filmografia engajada com a causa — diz Fischer. — E essa escolha não deixa de ser política. É a opção por um Brasil mais moderno. Um dos méritos do filme é o de não mostrar a sexualidade do personagem como um dilema. É o retrato de um país bem resolvido.

(Colaborou Liv Brandão)