Edição do dia 19/10/2014

19/10/2014 08h45 - Atualizado em 20/10/2014 10h50

Degradação do solo causa perda de fontes de água de famílias de MG

Veredas são fontes de água em vários municípios do sertão de MG.
Óasis são áreas alagadas do cerrado, cercadas de vegetação nativa.

Cristina VieiraDo Globo Rural

 Algumas regiões do Brasil passam por uma crise de água por causa da seca. Mas uma região de Minas Gerais está enfrentando a falta de água no campo tanto em tempo de chuva como na seca.  As veredas estão secando no norte e no noroeste mineiro. Ano após ano, elas vem perdendo a capacidade de ser a caixa d'água do grande sertão de Minas.

As veredas são as fontes de água dos municípios de Januária, Bonito de Minas, Urucuia, Riachinho e Arinos, no sertão de Minas Gerais, uma região de clima semiárido. Veredas são áreas alagadas do cerrado, cercadas de vegetação nativa, principalmente o buriti. A presença da palmeira indica a existência de água, formando um oásis no meio do sertão. Mas a paisagem está desaparecendo.

Em busca de água, o agricultor Valdenísio Almeida cavou um poço no pé do buriti. Com menos de dois metros de profundidade, o poço dava água em abundância. Agora, tem apenas um restinho no fundo e as raízes da árvore. Mas a vereda secou e a barragem construída não enche há pelo menos sete anos. Hoje, a água que abastece a casa de 15 famílias sai da única vereda que ainda tem água nas proximidades. A bomba só é ligada de dois em dias.

Outra comunidade rural da região foi abandonada. Muitas pessoas deixaram a região. Os poucos moradores que ficaram se sacrificam para conseguir água. Evelin Guimarães, de nove anos, busca água na casa da agricultora Marlene Silva, uma das poucas moradoras que ainda têm água no bairro. A menina pegou emprestado um carrinho de mão para conseguir levar o galão.

A agricultora só tem água porque rebaixou o poço. “O meu tem 15 metros, mas foi furado com 12. Ele sempre tem que refundar. Acaba água e não tem água suficiente para jogar com a bomba”, diz Marlene.

Há dez anos, quando foi construído, o poço tinha 12 metros de profundidade. O lençol freático foi baixando e o poço secando. Por isso, foi preciso escavar várias vezes até alcançar novamente o lençol. Além de ajudar os vizinhos, dona Marlene divide a água entre a casa, os animais e a horta. A mineira que tentou a vida em São Paulo e há 24 anos voltou para a roça guarda as imagens de outra época. “Os quintais eram cheios de mandioca, cheio de tudo. Tinha flores na frente da casa. Eu aguava tudinho porque tinha água suficiente. Agora, não tem mais”, lamenta.

O biólogo Walter Neves, que faz doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais, quer entender a degradação das veredas. Ele escolheu como objeto de estudo a vereda que fica dentro de um parque estadual e que contribui para a formação do Rio Peruaçu, um dos mais importantes da região.

Walter Neves monitora o comportamento do lençol freático em nove poços espalhados pelos 80 quilômetros de parque. O biólogo usa uma trena e um sensor para medir a posição da água em relação à superfície. “De um total de 100 a 200 veredas que existem no município de Bonito de Minas, cerca de 60 já secaram nos últimos dez anos”, diz.

Em uma das poucas veredas conservadas na região tem água corrente e limpa em plena estiagem. O solo arenoso do cerrado facilita a passagem da água das chuvas, que escoaria rapidamente se não fosse a vereda. A água infiltra no solo até atingir o lençol freático, que abastece os rios na época da seca. A capacidade de reter a água é graças ao solo turfoso da vereda. O buriti tem um papel essencial nesse processo. “Quem mais contribui para essa matéria orgânica é o buriti. A quantidade enorme de palha que cai vai decompondo e formando essa esponja”, explica o biólogo.