17/10/2014 11h01 - Atualizado em 17/10/2014 15h46

Atores filhos de Mano Brown têm 'presença', diz diretor de 'Na quebrada'

Jorge e Domênica Dias interpretam histórias de jovens da periferia de SP.
Fernando Grostein Andrade, de 'Quebrando o tabu', lança sua 1ª ficção.

Letícia MendesDo G1, em São Paulo

Na Quebrada terá avant-première em Santos, com presença do diretor Fernando Grostein Andrade (Foto: Divulgação)Jorge Dias e Felipe Simas em 'Na quebrada'
(Foto: Divulgação)

O diretor Fernando Grostein Andrade, responsável pelo documentário "Quebrando o tabu" (2011) – sobre a descriminalização das drogas –, escolheu mais um tema complicado para o seu primeiro longa de ficção. "Na quebrada", que estreou na quinta (16), é inspirado em histórias reais de jovens da periferia de SP. (Assista ao trailer acima)

Em entrevista ao G1, Fernando conta que fez várias entrevistas com alunos do Instituto Criar, idealizado pelo seu irmão, o apresentador Luciano Huck. Para um dos testes, o diretor convidou Jorge e Domênica Dias, filhos de Mano Brown com Eliane. "Eles vieram e brilharam na tela. Eles têm presença, uma força na câmera que é absurda".

Para dar mais autenticidade para o "Na quebrada", o diretor diz que reativou o grupo teatral da penitenciária Des. Adriano Marrey, de Guarulhos. "Alguns detentos tiveram receio pra se inscrever no grupo porque iam ter que fazer papel de mulher ou até mesmo de policial. Mas os que ficaram no grupo já tinham superado essa barreira do preconceito". Leia a entrevista abaixo:

G1 - Além de dirigir, você co-escreve o roteiro. Como surgiu sua relação com as histórias dos alunos do Instituto Criar de TV, Cinema e Novas Mídias?
Fernando Grostein Andrade - Em 2012, fui convidado pela revista italiana "Colors" para participar de um projeto de arte com várias iniciativas globais que buscavam desafiar a injustiça social em zonas de conflito armado. Decidi fazer um curta-metragem que contasse a história de alguém que tivesse sobrevivido a um tiro de arma de fogo. Foi então que eu descobri o Paulo Eduardo, que tinha sobrevivido a uma chacina e tomado um tiro no peito e que tinha utilizado o cinema como ferramenta de transformação social. O Paulo Eduardo foi aluno da primeira turma do Instituto Criar.

Da pesquisa até a realização do curta "Cine Rincão", passando pelo roteiro, produção e filmagem, foram apenas 10 dias. Foi uma surpresa muito bacana porque o curta foi exibido em Veneza e único representante brasileiro na final do Your Film Festival, que teve mais de 15 mil inscrições do mundo todo. Anos após o curta, o Criar completou 10 anos. E, a partir de uma ampla pesquisa entre seus alunos, surgiu o "Na quebrada".

G1 - Como você selecionou o elenco?
Fernando -
Por conta da experiência com o "Cine Rincão", foi feita uma série de entrevistas com vários alunos e levantados vários perfis. A partir desses perfis, foi traçado um mosaico sobre a periferia de São Paulo e o poder de transformação das pessoas a partir do empoderamento, da tomada de decisão individual de cada um.

G1 - O Jorge e a Domênica Dias, filhos do Mano Brown, participaram desses testes? Como você os conheceu?
Fernando -
Conheci o Mano Brown quando lancei o documentário “Quebrando o tabu” e fui chamado para dar uma palestra na Cooperifa (Cooperativa Cultural da Periferia), dentro do projeto Cinema na Laje, a convite do Sérgio Vaz, que nos apresentou. Em seguida conheci a Eliane, mulher do Brown e mãe do Jorge e da Domênica. Em uma conversa, comentei sobre o projeto do filme e os convidei para participarem do teste. Foram muitos testes de elenco, não me lembro de cabeça quantos, mas foram mais de 300 pessoas. O Jorge e a Domênica vieram e brilharam na tela. Eles têm presença, uma força na câmera que é absurda, que vai desde a beleza até o convencimento de que aquilo ali é de verdade, a autenticidade.

Pôster de 'Na quebrada' (Foto: Divulgação)Pôster de 'Na quebrada' (Foto: Divulgação)

G1 - E como foi dirigir os garotos presidiários?
Fernando -
Era importante e necessário fazer esse filme ter autenticidade. Como umas das histórias do filme, a do Gerson, é de um filho de um detento, achei importante ter esse intercâmbio e troca de informação com o mundo do cárcere. Busquei um grupo de teatro no presídio e descobri que tinha um que estava desativado e contribuí para reativá-lo. Essa experiência foi muito importante porque foi uma troca na qual houve muito aprendizado de ambas as partes. Fiquei muito honrado de participar disso e foram momentos muito bacanas na penitenciária.

G1 - Eles logo toparam participar ou houve uma resistência para aparecer no filme?
Fernando -
Alguns detentos tiveram receio em se inscrever no grupo de teatro porque iam ter que fazer papel de mulher ou até mesmo de policial. Mas os que ficaram no grupo já tinham superado essa barreira do preconceito no teatro. Então, quando entraram para fazer o filme já estavam dispostos para o que der e vier.

G1 - Qual a importância desse filme para os jovens da periferia?
Fernando -
Acho que esse filme mostra histórias da periferia, de como é possível o jovem transformar e mudar seu destino, e a importância de cuidar e fomentar a autoestima dos jovens, o empoderamento do jovem da periferia. Acho que isso é importante.

Alguns detentos tiveram receio em se inscrever no grupo de teatro porque iam ter que fazer papel de mulher ou até mesmo de policial"
Fernando Grostein Andrade, cineasta

G1 - E para os jovens que não são da periferia? Acha que o 'Na quebrada' pode mudar a visão dessas pessoas?
Fernando -
Acho que esse filme tem mensagens importantes para quem não é da periferia e para quem é da periferia. Então, não importa o lado da ponte que a pessoa mora, o filme traz novidades, desde como é ser filho de um bandido, que não é todo mundo de um lado da ponte sabe, até como um jovem pode transformar seu destino através das suas escolhas. E isso é uma coisa muito poderosa e que às vezes nem todos os jovens de um outro lado da ponte sabem mas seria importante conhecerem.

G1 - Você considera o "Na quebrada" uma continuação do "Quebrando o tabu"?
Fernando -
Sim. No "Quebrando o tabu", a gente mostrava que era impossível erradicar as drogas pela via da oferta, que era necessário reduzir a demanda, seja por medida de saúde pública para aquelas pessoas que  já usam droga ou como educação e cultura pra atuar no trabalho de prevenção com aqueles que não usam droga. E essa prevenção não é só do abuso de drogas, ela também é da marginalização. Então, o "Na Quebrada" mostra como a arte e a cultura podem fomentar o poder de escolha do jovem pra poder superar e transcender heranças de vidas difíceis e tranformar isso em coisas positivas não so para as pessoas, mas para a sociedade.

G1 - Você se identificou mais com o trabalho de ficção?
Fernando -
Eu gosto de fazer filmes, não importa o tipo. Mas eu precisava fazer um longa de ficção porque era o meu objetivo inicial.

G1 - Pretende continuar levando aos cinemas questões sociais?
Fernando -
Eu gosto de levar ao filme questões sociais, questões humanas. E em um próximo filme quero abordar uma história inspiradora.

O rapper Mano Brown ao lado dos filhos Jorge Dias e Domênica Dias, atores revelados em 'Na quebrada' (Foto: Reprodução/Facebook/Paris Filmes)O rapper Mano Brown ao lado dos filhos Jorge Dias e Domênica Dias, atores revelados em 'Na quebrada' (Foto: Reprodução/Facebook/Paris Filmes)
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