Rio

Gastos com manutenção de escolas tiveram queda de 72,9%, segundo TCE

Documento cita denúncias feitas por estudantes que ocupam colégios; entre as reivindicações, estão melhorias das condições físicas dos prédios
Primeira escola estadual a ser ocupada no Rio, a Mendes de Moraes, na Ilha do Governador, foi palco de embates entre estudantes contra e a favor do movimento. Na semana passada, após quase dois meses, os alunos decidiram liberar o colégio Foto: Márcio Menasce/16-5-2016
Primeira escola estadual a ser ocupada no Rio, a Mendes de Moraes, na Ilha do Governador, foi palco de embates entre estudantes contra e a favor do movimento. Na semana passada, após quase dois meses, os alunos decidiram liberar o colégio Foto: Márcio Menasce/16-5-2016

RIO - No meio da crise na rede estadual de ensino, que derrubou um secretário de Educação (Antonio Neto) e produziu cenas como a desocupação forçada da sede da pasta pela PM, no último sábado, mais uma notícia ruim: em 2015, despencaram os gastos com manutenção e obras nas escolas fluminenses. É o que revela um relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Segundo o documento, as despesas com investimentos em educação, que se referem principalmente a infraestrutura e melhorias nas instalações das unidades, caíram de R$ 340,9 milhões em 2014 para R$ 92,1 milhões no ano passado — um recuo de 72,98% (ou R$ 248,8 milhões). O relatório do TCE, sobre as contas do governo, cita inclusive denúncias feitas por estudantes que ocupam os colégios da rede: entre suas reivindicações, estão melhorias das condições físicas dos prédios.

O valor aplicado chega a níveis abaixo dos de cinco anos antes. Os investimentos tinham chegado a R$ 242 milhões em 2010 e cresceram até atingir R$ 417 milhões em 2013, antes de começar a cair, no ano retrasado. Diante desse quadro, informou a Secretaria estadual de Educação ao TCE, nenhum colégio foi reformado ou construído em 2015, embora 610 tivessem recebido recursos do programa Preservando Escolas, para pequenas manutenções.

O Colégio Estadual Gomes Freire de Andrade, na Penha, foi o segundo a aderir ao movimento de ocupações. Alunos reclamam do excesso de estudantes por sala de aula, de falta de papel até para as provas e do racionamento de merenda. A unidade também não tem porteiro Foto: Pablo Jacob/10-5-2016
O Colégio Estadual Gomes Freire de Andrade, na Penha, foi o segundo a aderir ao movimento de ocupações. Alunos reclamam do excesso de estudantes por sala de aula, de falta de papel até para as provas e do racionamento de merenda. A unidade também não tem porteiro Foto: Pablo Jacob/10-5-2016

— Essa falta de infraestrutura tem repercutido nas condições de estudo dos alunos e de trabalho dos professores. O que temos visto são escolas com goteiras, vazamentos, infiltrações... Em muitas, as instalações elétricas são antigas e, sem manutenção, aumentam os riscos de incêndios. Há colégios que não têm sequer cozinha. O que tem acontecido nas escolas são maquiagens, mas nenhuma reforma estruturante — afirma Armindo Lajas dos Santos, coordenador na capital do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio (Sepe-RJ). — Em cidades como São Gonçalo, até 70% da rede têm condições consideradas péssimas.

RECLAMAÇÕES DOS ESTUDANTES

Armindo lembra que, no Colégio Estadual Professor Mendes de Moraes, na Ilha do Governador, o primeiro ocupado por alunos este ano no Rio, os estudantes tinham se sentado nos corredores, em fevereiro, em protesto contra a retirada de aparelhos de ar-condicionado das salas de aula. Desde 21 de março, quando a unidade foi tomada, desencadeando outras ocupações, a infraestrutura das escolas sempre esteve na pauta do movimento.

No Colégio Gomes Freire, na Penha, os estudantes relatavam falta até de pilots para os professores escreverem nos quadros. No Visconde de Cairu, no Méier, as denúncias davam conta de banheiros sem vaso sanitário, infiltrações e fiação exposta nos corredores.

Na segunda-feira, a secretaria informou que não seria possível responder aos questionamentos sobre a redução dos investimentos, argumentando que o novo secretário Wagner Victer e seus subsecretários estavam em reunião ao longo do dia.

Ocupado desde 5 de abril, o Colégio Visconde de Cairu, no Méier, levou para dentro da escola a discussão sobre os problemas na educação. São promovidos debates com professores e especialistas, além de ações culturais com a presença de artistas. Teve até “viradão musical” Foto: Gabriel de Paiva/23-5-2016
Ocupado desde 5 de abril, o Colégio Visconde de Cairu, no Méier, levou para dentro da escola a discussão sobre os problemas na educação. São promovidos debates com professores e especialistas, além de ações culturais com a presença de artistas. Teve até “viradão musical” Foto: Gabriel de Paiva/23-5-2016

Na análise das contas do estado feita pelo TCE, o relator do processo, conselheiro José Gomes Graciosa, lembrou que o Indicador Geral de Estado do Imóvel (IGE, criado pela secretaria em 2011) apontava que 59% das escolas tinham situação considerada “ótima e boa” em 2014. Além disso, ressaltou que um estudo do órgão indicava um aumento, em 2015, na quantidade de laboratórios de informática, bibliotecas e quadras poliesportivas cobertas na rede. Graciosa rebate esses dados, lembrando as reivindicações atuais dos estudantes: “Os alunos relatam falta de manutenção nas unidades, sendo encontradas, em algumas escolas, condições insalubres. Relatam, também, falta de climatização, tornando as salas de aula verdadeiras saunas. Essas observações se coadunam com o baixo investimento empregado pelo estado no ano de 2015 com a reforma e conservação das edificações escolares”. Ele determinou inspeções extraordinárias nos colégios.

A cultura também deu o tom da ocupação do Colégio André Maurois, no Leblon. Em 2 de maio, Marisa Monte e Leoni deram uma canja para os estudantes que acampam na escola. O grupo também já recebeu a visita da atriz Fernanda Torres Foto: Daniel Marenco/2-5-2016
A cultura também deu o tom da ocupação do Colégio André Maurois, no Leblon. Em 2 de maio, Marisa Monte e Leoni deram uma canja para os estudantes que acampam na escola. O grupo também já recebeu a visita da atriz Fernanda Torres Foto: Daniel Marenco/2-5-2016

Presidente-executiva do movimento Todos Pela Educação, Priscila Cruz lamentou a redução dos investimentos. E ressaltou que, depois da formação do professor, a infraestrutura é um dos principais fatores para a qualidade do ensino:

— É fundamental que os alunos tenham ambientes claros e com temperatura tolerável, laboratórios, acesso a computadores, quadras cobertas, espaço para o ensino das artes... Além disso, estão incluídas na dimensão da infraestrutura questões como segurança, higiene e nutrição dos estudantes.

Com o agravamento da crise, a situação pode ser pior este ano. O deputado Comte Bittencourt (PPS), presidente da Comissão de Educação da Alerj, afirma que, na execução do orçamento, os investimentos nas instalações da rede de ensino e em programas como o Preservando Escolas se aproximam de zero.

Os alunos da Escola Estadual de Arte Dramática Martins Pena deixaram de fazer cena e ocuparam o prédio centenário do colégio, no Centro do Rio, em 9 de maio. Os estudantes querem transporte e alimentação gratuitos, além de reformas no imóvel e equipamentos Foto: Márcia Foletto/10-5-2016
Os alunos da Escola Estadual de Arte Dramática Martins Pena deixaram de fazer cena e ocuparam o prédio centenário do colégio, no Centro do Rio, em 9 de maio. Os estudantes querem transporte e alimentação gratuitos, além de reformas no imóvel e equipamentos Foto: Márcia Foletto/10-5-2016

— Muitas escolas são mais do que seculares e precisam de manutenção permanente. É um comprometimento que pode impactar o próprio projeto pedagógico — diz ele, ressaltando que os colégios da Baixada e de São Gonçalo são os mais afetados pela má conservação.

QUEDA NO NÚMERO DE MATRÍCULAS

Considerado a escola de elite do estado, o Colégio de Aplicação da Uerj foi um dos últimos a aderir ao movimento. Na semana passada, alunos tomaram o prédio. Eles reinvindicam alimentação, reformas e obras para deixar a unidade acessível a portadores de deficiência Foto: Gabriel de Paiva/23-5-2016
Considerado a escola de elite do estado, o Colégio de Aplicação da Uerj foi um dos últimos a aderir ao movimento. Na semana passada, alunos tomaram o prédio. Eles reinvindicam alimentação, reformas e obras para deixar a unidade acessível a portadores de deficiência Foto: Gabriel de Paiva/23-5-2016

Apesar da redução nos investimentos, o relatório do TCE indica que, na comparação entre 2014 e 2015, as despesas liquidadas com a função educação, como um todo, se mantiveram praticamente estáveis, variando de R$ 6,940 bilhões em 2014 para R$ 6,941 bilhões ano passado. Desse valor, as despesas com pessoal e encargos sociais subiu 4,9%, de R$ 4,81 bilhões para R$ 5,05 bilhões.

Esse aumento, disse a secretaria ao TCE, seria resultado de políticas como os programas de bonificação por resultados para os profissionais. de educação. Por outro lado, o relatório afirma que diminuiu o número de professores e de matrículas na rede estadual. No caso dos docentes, o total caiu de 72.214 em 2014 para 70.961 ano passado. Já a queda no número de alunos, com base em dados do EducaCenso, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), chegou a 4,78% — de 796.291 em 2014 para 758.231 ano passado.

Nesse caso, o relatório ressalta desde questões como a municipalização do ensino fundamental até uma mudança na pirâmide etária da população. No entanto, indica o documento, poderia ser resultado também de evasão escolar. No ensino médio, cujo número de matrículas caiu de 444,5 mil para 431,9 mil (um decréscimo de 2,83% entre 2014 e 2015), a taxa de abandono no ano retrasado, com reflexos no seguinte, chegou a 7,2% dos alunos, acima da média da Região Sudeste (6,3%).

Além disso, apontou o TCE, o Estado do Rio foi o único do país que não cumpriu a determinação de readequar seu Plano Estadual de Educação até o ano passado (o vigente é de 2009).

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