Brasil Conte algo que não sei

Stephanie Burgess, designer: 'Realidade virtual não é só game e pornografia'

Artista especializada em realidade virtual como ferramenta voltada para meditação, está no Rio para mostrar a performance 'Aqui', no Museu do Amanhã
"Parte do meu trabalho é tratar a tecnologia com respeito e compreensão", diz a designer Stephanie Burgess Foto: Leo Martins / Agência O Globo
"Parte do meu trabalho é tratar a tecnologia com respeito e compreensão", diz a designer Stephanie Burgess Foto: Leo Martins / Agência O Globo

"Tenho 25 anos e nasci na Inglaterra, onde estudei Filosofia e Fotografia e fiz mestrado em Design e Tecnologia. Hoje moro em Nova York. Faço meditação e desenvolvo projetos em realidade virtual, como o que trouxe ao Rio, de pintura 3D em ambiente virtual. Uso a tecnologia para suprir os espaços da minha alma"

Conte algo que não sei.

Realidade virtual não é um jogo. Se trata de uma visão de futuro. Quaisquer que sejam seus maiores sonhos, eles podem se tornar realidade ali, você só tem que acreditar.

Como começou sua relação com a tecnologia? E como ela se tornou seu objeto de pesquisa?

Depende de como você define a tecnologia. Pode ser caneta e papel. Meu primeiro interesse vem de pintar, criar com as minhas mãos. Mas a fotografia é o caminho principal da minha carreira. Eu lembro que eu estudava filosofia e peguei uma eletiva em fotografia digital. E descobri o glitch , você pegar uma imagem e quebrá-la, distorcê-la. O que acontece muitas vezes espontaneamente, quando você manda uma imagem pra alguém e dá errado.

Como o fato de ter descoberto o glitch influenciou seu trabalho?

Comecei a forçar esse efeito, pensando em como isso poderia dialogar com algo pessoal pra mim. Criei um projeto associando glitch à ideia de memórias se apagando. Peguei cinco fotos de pessoas que eram importantes pra mim e as distorci com esse efeito. Por exemplo, meu pai, sinto falta dele, então ele está. Representei assim diversos aspectos da minha vida pessoal.

Como você liga seus estudos de filosofia e seu trabalho com realidade virtual?

Tem a ver com o mito da caverna, de Platão, que estudei muito. Porque na realidade virtual você cria o que quer, o que é ao mesmo tempo inspirador e assustador. Estudei muita filosofia, mas uma das mais poderosas transformações que experimentei foi quando descobri a meditação. Descobri como podemos reduzir o sofrimento, aprender a seguir o fluxo. Nós inventamos um mundo tão concreto, com construções e mais construções, e vi que temos que dar um passo atrás pra viver uma outra realidade mais fluida. A realidade virtual pode mudar a experiência das pessoas, atuar em seus sentimentos nesse sentido. Aí a meditação, a filosofia e a realidade virtual se encontraram pra mim.

Seu trabalho aproxima os conceitos de corpo e alma. Mas muita gente vê a tecnologia como algo oposto ao campo espiritual. Uma ideia que pode ser sintetizada como "a tecnologia mata Deus". Por que você pensa diferente?

Acredito que o pensamento é algo muito poderoso. Se você crê que a tecnologia vai matar o homem, provavelmente é isso que vai ocorrer. Eu prefiro acreditar que não. Parte do meu trabalho é tratar a tecnologia com respeito e compreensão, sabendo que ela pode causar muito mal. Mas eu vejo o potencial de bem que existe ali, e é com isso que eu quero trabalhar.

Seu projeto Harmony trata exatamente disso, não?

Sim, queria que as pessoas percebessem que realidade virtual não é só sobre games e pornografia. Nesse projeto, quis usá-la para ajudar as pessoas a realinhar seus chakras, através de estímulos visuais, cores, sons.

Você acha que a realidade virtual hoje pode cumprir o papel que as drogas tiveram nos anos 1960?

Sim, exato. Tenho um amigo que trabalha exatamente com o uso psicodélico da realidade virtual. Você não precisa tomar drogas para viajar.