Vacina

Por G1


Governo entrega ao STF plano nacional de imunização contra a Covid

Governo entrega ao STF plano nacional de imunização contra a Covid

O Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 foi encaminhado pelo governo ao STF neste sábado (12). Ele prevê a disponibilização de 108,3 milhões de doses para mais de 51 milhões de pessoas de grupos prioritários, divididos em quatro fases.

Após o anúncio, pesquisadores que assessoram o Ministério da Saúde emitiram uma nota conjunta afirmando não terem sido consultados antes do envio do plano de vacinação ao STF. Em resposta a esta manifestação, a pasta informou neste domingo (13) que convidou especialistas, mas que eles "não tinham poder de decisão".

O G1 e a GloboNews ouviram especialistas para analisar o plano. Eles apontam problemas na definição do grupo prioritário e a falta de detalhes sobre insumos (como seringas e agulhas) e de um cronograma mais bem definido. Também dizem que a questão da politização da vacina é visível.

Veja, abaixo, a repercussão sobre a divulgação:

Ethel Maciel - epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e uma das especialistas que participaram da elaboração do plano de vacinação apresentado ao STF

Ethel disse que não teve acesso ao documento final, mas que participou de discussões como representante da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) junto aos técnicos do Programa Nacional de Imunização do Ministério da Saúde.

’A gente nunca viu nenhuma versão desse documento’, diz pesquisadora citada em plano

’A gente nunca viu nenhuma versão desse documento’, diz pesquisadora citada em plano

"É algo muito grave constar os nossos nomes como elaboradores e nós sequer termos visto esse documento", disse Maciel em entrevista à GloboNews. "Somos pesquisadores independentes e estamos trabalhando para a sociedade, e não para o governo, para construir o melhor plano."

Ela citou que, nas discussões, os especialistas apontaram para a atenção de grupos prioritários, uma vez que há escassez na oferta de vacinas. No entanto, ela disse que diverge da posição enviada ao STF que exclui a população carcerária das primeiras fases da vacinação.

"Não podemos fazer um plano ajustado ao número de doses que o governo tem", disse a pesquisadora. "Um plano ideal é aquele que você tem todos os grupos prioritários e o governo vai atrás das doses necessárias para que esses grupos sejam vacinados."

Ela citou a necessidade de se vacinar, neste primeiro momento, populações vulneráveis que foram deixadas de fora do documento, como os ribeirinhos, quilombolas e pessoas com deficiência, que muitas vezes não conseguem cumprir com as medidas de distanciamento.

"Uma coisa que nós já tínhamos discutido com o governo era necessidade de ampliação não só para professores, mas para todos os trabalhadores da educação", disse a epidemiologista. "Na escola temos vários outros profissionais que também estão numa situação de vulnerabilidade."

Carla Domingues - epidemiologista, ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunização e uma das especialistas consultadas pelo Ministério da Saúde para a construção do plano de imunização contra a Covid-19

Carla disse que a comunicação do governo federal não foi clara e que as reuniões eram apenas consultivas, e não deliberativas – que têm o poder de definir estratégias oficiais. Segundo ela, os consultores atuaram em dez eixos diferentes, e que apenas uma apresentação foi feita com as conclusões.

Epidemiologista fala sobre plano de vacinação apresentado pelo governo

Epidemiologista fala sobre plano de vacinação apresentado pelo governo

"O problema desse documento é ele ter colocado o nome das pessoas no geral", disse Domingues. "As pessoas participaram de pedaços desse plano, cada um em seu eixo de especialidade. O ideal era que fosse assinado somente pelo Ministério e que apenas dissesse que teve a colaboração de especialistas, sem citar nomes."

Ela disse também que alguns dos participantes das reuniões questionaram alterações naquilo que havia sido discutido, como o caso da definição dos grupos prioritários. Ela afirmou ainda que há uma limitação da proposta por conta da oferta de vacinas e que o documento considera apenas a vacina da AstraZeneca, que ainda segue em fase de estudos.

Pedro Hallal - epidemiologista e reitor da Universidade Federal de Pelotas

Sobre o plano de imunização, o reitor afirma que ele é "insuficiente e ideológico". Ele não está na lista de especialistas consultados pela pasta.

"Ele é insuficiente porque ele prevê uma vacinação de apenas uma parcela da população brasileira e deveria prever uma vacinação de todos. O grupos mais pobres também deveriam estar no grupo prioritário. [...] Ele é ideológico também porque, quando o plano deixa de incluir a Coronavac, e inclui outras vacinas que também ainda não foram aprovadas pela Anvisa, ele mostra infelizmente que tem um caráter ideológico", disse o epidemiologista em entrevista à GloboNews.

‘Insuficiente e ideológico’, diz epidemiologista sobre plano de vacinação do governo

‘Insuficiente e ideológico’, diz epidemiologista sobre plano de vacinação do governo

Ele concordou com a epidemiologista Carla Domingues sobre a falha do ministério em divulgar os nomes dos especialistas consultados.

"A divulgação dos nomes fere o preceito básico no mundo da ciência, eu não posso ter o meu nome divulgado em um documento em que eu sequer conheço. Então essa é uma falha gravíssima e que não está resolvida com a nota publicada pelo ministério", disse Hallal.

"Os consultores precisam tem acesso ao documento antes da divulgação para saber se vão manter o seu nome ou não. Então é uma falha ética."

Marco Aurélio Sáfadi - médico infectologista da Santa Casa de São Paulo e um dos especialistas consultados pela pasta para a elaboração do documento

"O ministério se valeu de alguns experts, que foram consultores, e construiu um documento, que, claro, se valeu do conselho e assessoria dos consultores, mas nada obriga que eles nos tenham dado acesso ao documento", disse Sáfadi.

Ele disse em entrevista ao G1 que não teve acesso ao documento enviado pelo Ministério da Saúde ao STF.

O especialista comentou que conversou com colegas que também não tiveram acesso antecipado ao documento, mas argumentou que "é compreensível" que ele tenha sido enviado diretamente ao STF por conta da "celeridade do processo".

"Essa é uma polêmica que não leva a nada", disse o infectologista. "O ministério tinha que esclarecer e enviar o documento com presteza. Não houve nem tempo de compartilhar com os experts, mas é compreensível."

Sobre o plano em si, Sáfadi disse que não conseguiu ler completamente, mas apontou que, em uma rápida leitura, encontrou algumas informações que precisariam ser corrigidas.

"Nós cientistas temos algumas exigências, alguns preciosismos próprios nossos, quando a gente escreve um documento, a gente vai nos detalhes. Vi uma ou outra coisa que talvez precise ser corrigida", disse o infectologista.

Renato Kfouri - médico infectologista e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBI) e um dos médicos consultados pelo ministério.

Sobre o plano, as lacunas apontadas pelo médico são: falta de inclusão dos mais vulneráveis e a garantiria dos insumos, como seringas e agulhas, por exemplo.

Ele disse em entrevista ao G1 que também discorda da exclusão da ConoraVac e que espera que o imunizante entre na redação final.

"O plano precisa incluir na sua redação as populações mais vulneráveis, os ribeirinhos, as pessoas privadas de liberdade. Eles precisam saber quantos são e em que fase eles serão vacinados. É sensato colocar um cronograma."

‘Não podemos prometer uma data sem ter o registro de uma vacina’, diz Renato Kfouri

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"Também é preciso estar mais claro como vão ser distribuídos, onde vamos comprar as seringas e agulhas, por exemplo. Precisa organizar essa distribuição. E importante: é essencial deixar claro que todas as vacinas farão parte do plano e isso inclui a Coronavac, esse é um produto que tem que ser considerado", disse.

“Essa redação é provisória, não é a final. Na semana que vem temos uma reunião pra finalizar. A divulgação foi um equívoco que gerou esse ruído. Foi um equivoco não pedir um adiamento de prazo pro STF, por exemplo”, contou Kfouri.

Para o infectologista um dos grandes desafios do plano é a interferência política. "A politização da vacina é o grande desafio para o nosso plano dar certo."

"Temos uma boa estrutura, o nosso PNI aplica 70 milhões em 3 meses, temos 36 mil salas de vacinas, sabemos como fazer esse transporte, é um desafio, mas não é o maior obstáculo. A politização da vacina é o grande desafio para o nosso plano dar certo", afirmou Kfouri.

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