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Após ouro, Bernardinho não garante permanência: "Está na hora de refletir"

Depois de ser campeão olímpico pela segunda vez, treinador prefere não antecipar sua decisão sobre a continuidade ou não no comando da seleção brasileira de vôlei

Por Rio de Janeiro

 


No  comando da seleção brasileira masculina de vôlei desde 2001, o técnico Bernardinho preferiu não antecipar se vai continuar no comando da equipe. Logo depois da conquista da medalha de ouro na Olimpíada de 2016, neste domingo no Maracanãzinho, o treinador foi questionado se a vitória serviria como combustível para os Jogos de Tóquio e respondeu.

- Eu tenho que agora respirar e pensar. Tem que servir para eles, servir para o voleibol brasileiro. Não é pessoal. Tenho que pensar um pouco, é muito tempo, é muita coisa, e rever. Agora é hora de refletir. Foi muito longo, foi duro, foi difícil. Eu não sou mais nenhum menino e tenho que pensar no que vou fazer - afirmou o treinador, após a vitória sobre a Itália na final, por 3 sets a 0.

Bernardinho Brasil x Rússia (Foto: Juan Mabromata / AFP)Bernardinho não confirmou se continua no comando da seleção (Foto: Juan Mabromata / AFP)

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Bernardinho já tinha sido campeã olímpico com o Brasil em Atenas 2004, mas depois perdeu na decisão em Pequim 2008 e Londres 2012, ficando com duas pratas. A derrota há quatro anos na final contra a Rússia foi dolorida, já que a seleção levou a virada depois de estar vencendo por 2 sets a 0. Apesar do baque, os jogadores conseguiram deixar aquele resultado para trás e conseguiram o título agora no Rio de Janeiro, mostrando força nos momentos decisivos após uma campanha instável na primeira fase.

Com atuações importantes na Rio 2016, o levantador Bruninho, filho do treinador, foi bastante elogiado pelo pai. Outros atletas também foram destacados pelo comandante brasileiro.

Bernardinho e Bruninho comemoram a conquista do ouro (Foto: Mark Kolbe/GettyImages)Bernardinho e Bruninho comemoram a conquista do ouro (Foto: Mark Kolbe/GettyImages)

- Quando eu pensava se a gente merece, eu não pensava em mim, pensava no Bruno, porque ele sofreu muito. Sentiu muito em Londres e sentiu muito em Pequim. Muito pelos rapazes de forma geral, e ele em especial, então pelo filho, mas pelo atleta também, por tudo que ele passou.  Acho que ele foi um guerreiro, um maestro e cérebro fantástico da equipe.Não perdeu a lucidez em momento algum. Bons e maus momentos, jogou de uma maneira, com algumas limitações que o time tinha, ele soube orquestrar de uma maneira impressionante. E na reta final o time sobrou. Ele certamente foi o grande mentor disso dentro da quadra. Wallace exuberante. Lucão  no ataque foi simplesmente sem palavras. Dupla Bruno e Lucão imparável.  É isso, sentiu o jogo como veterano. Já era um grande jogador (Bruninho), mas sai desse jogo no hall dos grandes jogadores da história. Serginho que vinha de altos e baixos fez uma Olimpíada fantástica. Foi um momento incrível com a torcida, sensação única. Para nós dá um certo alívio, para que esses meninos dessa geração, para que não fosse rotulada. Seis finais, quatro vices - disse Bernardinho.

Final - Brasil x Itália - Rio 2016 - Bernardinho  (Foto: Reuters/Dominic Ebenbichler)Bernardinho na final  olímpica contra Itália (Foto: Reuters/Dominic Ebenbichler)


Confira a entrevista do técnico Bernardinho na íntegra: 

Evolução da equipe

 - Foi uma partida tensa em que o Brasil Soube se impor. Conseguimos controlar bem o ataque da equipe italiana. A equipe mostrou força emocional, equilíbrio. Foi permanente, constante. A chave dessa história toda do ponto de vista psicológico foi quando nos encostaram na parede contra a França e crescemos. Quando duvidaram, fizemos. Quando achavam que era impossível, o Brasil foi lá e fez. Não li uma linha do que foi escrito porque não muda meu trabalho. Procuro manter o foco. O mais merecedor venceu, porque trabalhou muito. Endureceu o couro para merecer o ouro.

Atenas 2004 como inspiração

- Não é uma geração de tanto talento como 2004, mas trabalhou bastante. Nunca fiz comparação, somente usei como inspiração. Tenho que citar dois líderes, Bruno e Serginho. Wallace fez partidas sensacionais, o Lucão, mas esses dois foram os pilares de lideranças no time.

Relação com os jogadores

 - Antes dos jogos, conversei individualmente com cada um sobre o que esperava deles e o que eles esperavam de mim. Durante a competição, tivemos algumas conversas. Na situação de dificuldade, era mais conjunta. Tem um treinador americano, Coach Carter, que tem um livro que diz liderando com o coração. Em usa uma figura que sempre usei, que é o punho. São cinco valores fundamentais: disciplina, determinação, trabalho em equipe.. Enfim, temos que estar unidos, coesos, juntos. O mais merecedor vencia hoje, e merecemos por tudo que passamos ao longo de quatro anos.

Futuro

- Nos próximos 15 dias, não me liguem que não vão me encontrar. Se quiserem encontrar, peguem uma bicicleta porque vou pedalar. Não respirei até agora. Preciso respirar e olhar as coisas. O mais importante não é o Bernardinho pessoa, é que estamos prontos para o próximo ciclo. Estaremos na luta mais uma vez.

 Nos próximos 15 dias, não me  liguem que não vão me encontrar.  Se quiserem encontrar, peguem  uma bicicleta porque vou pedalar.
Bernardo Rezende

Há substituto capaz de assumir a Seleção?

- Absolutamente sim. Com certeza. Sou plenamente substituível. Temos pessoas prontas para assumir, com capacidade desenvolvida ao longos dos anos. Não estou falando de forma alguma que vou sair, não quero criar nada. Mas preciso pensar. Sou um devedor da vida, estou devendo muito para muitas pessoas. Tenho uma filha de seis anos, outra de 14. Preciso escolher. Passa por isso, decisões de vida efetivamente. Não vou largar o voleibol. Não conseguiria viver sem isso. O dia a dia me alimenta.

Mudanças pessoais no último ciclo

- Foi um ciclo difícil. Depois da derrota em 2012, pela maneira que foi, perdemos o ouro e não ganhamos a prata, mas é o esporte. Foi duro. Uma geração que substitui grandes jogadores tem que saber lidar com aquela derrota. Em 2014, estávamos quase fora da Liga Mundial e fomos vice-campeões. No Mundial, vice-campeões. Em 2015, nos tiraram da Copa do Mundo e ficamos fora das finais da Liga Mundial. Chegamos na final de novo esse ano e perdemos. Vice-campeões. Você olha de longe e diz que é duro. Pessoalmente, errei muito por ser tão intenso. Sou da emoção e me entrego. Quando as coisas acontecem como aconteceram na CBV, para mim é uma ofensa pessoal. Assumi o papel contrário e fui para dentro. Por não ter comparecido a uma coletiva, levei dez jogos de suspensão. Tive problema de saúde porque penso nisso e me revolto. Tentei ser um Bernardo diferente, mas não consigo.

Comparação com 2004

- Em 2004, a nossa luta era para conclusão de um ciclo vitorioso. Perdemos o Pan e depois não perdemos um jogo até a decisão olímpica. Precisávamos cumprir a missão de favoritos. Em 2014, a missão era se provar, acreditar. Alguns jovens podiam ter dúvidas ali dentro e era preciso acreditar sempre. A presença do Sérgio foi importante. O Wallace é um exemplo claro de como um jogador com qualidade excepcional e algumas limitações pode ser importante. Quando falo em geração pronta, é porque há autoestima e capacidade de digerir certos momentos como uma Olimpíada.

Vitória em casa

- A minha medalha de ouro é poder ver os rapazes e toda torcida gritando é campeão. Ver a bandeira nacional, o hino, e todos chorando... É tanta coisa presa ali dentro. O metal representa. Você olha para ali e pensa no que aquilo te traz. Momentos de sofrimento, a véspera do jogo com a França... O momento final dela é único. Tenho uma carreira longa no espaço, mas fotografia como essa na minha memória não existe. Na sua casa, bandeira subindo... Esse é o verdadeiro ouro. Uma experiência como essa, poucos tiveram a oportunidade de viver.

Motivação para o futuro

 - As pessoas se motivam por dois aspectos: necessidade e paixão. Eu, afortunadamente, por ter vindo de classe média alta, nunca me faltou nada. Não entrei no esporte por necessidade. Então, o que me movia era o desafio, paixão. Existe desafio maior do que seguir vencedor depois de uma vitória como essa? Estou pensando. Essa geração pode seguir muito bem, mas tem que ser fiel aos princípios. Esse tipo de coisa me motiva, me instiga. Se eu não pensar, abraço isso aí. Mas é um desafio enorme. O que posso experimentar mais do que experimentei aqui? Essa é uma fotografia especial, mas há novas e lindas fotografias pela frente. Sempre há.

 




*participaram desta cobertura Cahê Mota, Danielle Rocha, Edgard Maciel de Sá, João Gabriel Rodrigues, Richard Souza e Tiago Leme.