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Análise: Bota se desapega à trinca de volantes, se reinventa e lidera returno

Com dedo de Jair Ventura, Alvinegro apresenta futebol vistoso e eficiente, supera seu ponto forte e ganha formação mais ousada para sequência do Campeonato Brasileiro

Por Belo Horizonte

tabela, classificação returno (Foto: Arte Esporte)

Queira o torcedor ou não, a força do Botafogo em 2016 sempre esteve em sua consistência defensiva com base em uma trinca de volantes desde o Campeonato Carioca. Antes dela, o time sofria muita pressão, vencia, mas não convencia. Só na segunda fase da competição que Ricardo Gomes achou no trio marcador uma maneira de sofrer menos sustos, encontrou uma forma de jogar, formou uma base e foi vice-campeão estadual. Quando o então treinador tentou ser mais ofensivo com um 4-2-2-2 na Série A, a coisa desandou. Logo o esquema tático voltou, os botafoguenses aceitaram a "volantedependência", e lá se foram quase oito meses assim.

Mas não é que há vida sem a trinca?

No último domingo, Jair Ventura conseguiu o que seu antecessor tanto procurou: uma outra formação que encaixasse e oferecesse outra forma de jogar. Claro que o técnico se viu forçado a mudar devido às muitas lesões, principalmente no meio de campo. Mas teve o mérito inteiro de improvisar com as peças que tinha e fazer dar liga. O resultado? Com dois volantes, dois pontas, um meia e um atacante, a equipe teve sua melhor atuação na temporada: foi consistente na defesa e fatal nos contra-ataques, obteve uma vitória maiúscula por 2 a 0 sobre o Cruzeiro dentro do Mineirão e se tornou líder do returno com 12 pontos em cinco jogos, à frente do Flamengo no saldo (veja na tabela).

Como funcionou o 4-2-3-1 de Jair por setor:

PRIMEIRA LINHA (Emerson, Carli, Emerson Silva e Victor Luis)
O time perdeu força no apoio pelo lado direito, mas ganhou um terceiro zagueiro com Emerson improvisado na lateral. Do lado oposto, Victor Luis entrou e também aumentou a marcação por ser um lateral mais defensivo que Diogo Barbosa. Ou seja, independentemente da quantidade de volantes, a meta de Sidão já estava mais protegida com a linha à sua frente. Principalmente pela boa fase e entrosamento da dupla Carli e Emerson Silva, que está invicta no Botafogo.

SEGUNDA LINHA (Bruno Silva e Dudu Cearense)
Sem Airton e Lindoso, que também costuma fazer a função, o time ficou sem um primeiro volante, aquele famoso cabeça de área, especialista no combate direto. Tanto Bruno Silva quanto Dudu Cearense são volantes que saem para o jogo, mas fecharam a casinha e jogaram mais tranquilos com uma retaguarda mais fortalecida. Assim como fez com Diego contra o Fluminense, Bruno Silva dobrou a marcação pela direita com Emerson; Dudu, por sua vez, ficou um pouco mais solto, mas fechava os espaços quando Victor Luis e Diogo Barbosa subiam juntos.

TERCEIRA LINHA (Neilton, Camilo e Diogo Barbosa)
Esta foi a mudança mais radical desta formação. A começar por Diogo Barbosa, que virou um ponta-esquerda com a bola nos pés, e sem ela voltava para dobrar a marcação com Victor Luis. Neilton, que gosta e costuma jogar pelo lado esquerdo do ataque, teve que ser deslocado para a direita. E também virou uma espécie de ponta, fechando as subidas do lateral adversário até o meio de campo. Se dedicou mais a marcar e apareceu menos como atacante de ofício, um sacrifício que teve que fazer em prol do esquema tático. E Camilo, centralizado, dava o primeiro combate na saída de bola adversário, só que com mais liberdade para atacar.

QUARTA LINHA (Sassá / Canales)
Nesta formação, Sassá ficou mais isolado e menos participativo. Fazer o papel de pivô não é o seu forte, e consequentemente o atacante que é um dos artilheiros do Campeonato Brasileiro teve uma atuação apagada. Precisará se adaptar à essa nova função se o esquema for mantido nos próximos jogos. Canales, que entrou em seu lugar e marcou o primeiro gol do jogo, tem mais esse perfil de prender a bola e esperar quem vem de trás. Ou seja, esquentou a briga no ataque.

Arrascaeta disputada jogada contra Bruno Silva durante Cruzeiro x Botafogo (Foto: ANDRÉ YANCKOUS/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO)Ferrolho: com nova formação, Bota pouco levou sustos no jogo (Foto: ANDRÉ YANCKOUS/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO)

Além dos dois gols em contra-ataques fulminantes – ambos em jogadas da dupla Victor Luis e Diogo Barbosa pela esquerda –, os números defensivos comprovam a eficiência da formação: foram nove roubadas de bola e 54 desarmes contra cinco e 10 do Cruzeiro, respectivamente.

Em entrevista coletiva após a vitória no Mineirão, Jair explicou que Victor Luis e Emerson pediram passagem durante os treinos da semana, e ele teve que achar uma forma de todos jogarem. Quando Airton, um dos destaques do time na temporada, se recuperar de um problema físico e voltar a ficar à disposição, vai ser mais um quebra-cabeça para o técnico montar.

O grande segredo do treinador é não ficar engessado a um sistema de jogo, não posso jogar só no losango, ou no 4-2-3-1, ou no 4-4-2... Eu tenho que fazer os jogadores entenderem vários sistemas de jogar. (...) A gente perdeu um pouquinho no meio de campo, mas ganhamos com dois externos"
Jair Ventura, técnico do Botafogo

– Com três volantes o time vinha muito bem, mas se perder não adianta. O grande segredo do treinador é não ficar engessado a um sistema de jogo, não posso jogar só no losango, ou no 4-2-3-1, ou no 4-4-2... Eu tenho que fazer os jogadores entenderem vários sistemas de jogar. Por que essa opção de adiantar o Diogo? O Victor vinha muito bem e pediu espaço no time, então consegui um jeito de colocá-lo. A minha zaga está invicta, não posso mexer, mas o Emerson estava voltando de suspensão e arrumei um lugar para ele também. A gente perdeu um pouquinho no meio de campo, mas ganhamos com dois externos. E o Cruzeiro usa muito os dois lados do campo, conseguimos neutralizar isso. O Neilton saiu até cansado. Falei: "Nei, vai no sei limite. Cansou a gente troca". A gente tem que ir 100% ou mais. Dentro do sacrifício para conseguir os objetivos – exaltou o treinador, que tem 71,4% de aproveitamento em sete jogos.

Com 35 pontos, o Botafogo subiu para o oitavo lugar do Campeonato Brasileiro e está a cinco pontos do Corinthians, último do G-4, e oito à frente do Figueirense, que abre o Z-4. Os jogadores retornaram ao Rio de Janeiro ainda na noite de domingo e se reapresentam na tarde desta segunda-feira, em General Severiano. O Alvinegro volta a campo na próxima quarta, às 19h30 (de Brasília), contra o Santos na Arena Botafogo.