Esporte

Roma diz “não” à Olimpíada – mais uma cidade recusa o abusivo custo do evento

Roma diz “não” à Olimpíada – mais uma cidade recusa o abusivo custo do evento

Virginia Raggi, nova prefeita romana, contrariou dirigentes esportivos e políticos locais e anunciou a desistência da candidatura. Os Jogos de 2024 consumiriam pelo menos R$ 20 bilhões da capital da Itália

RODRIGO CAPELO
21/09/2016 - 18h27 - Atualizado 31/10/2016 20h14
Virginia Raggi, prefeita de Roma. A política desmontou a candidatura da cidade a sediar a Olimpíada de 2024 (Foto: AFP)

“Especulação, lobbies empresariais, instalações nunca terminadas, estruturas abandonadas, dívidas e sacrifícios para o povo. Somos contra a candidatura de Roma para os Jogos Olímpicos de 2024 porque não vamos hipotecar o futuro dos romanos.” O texto, publicado no blog do partido do Movimento 5 Estrelas, é da nova prefeita de Roma, Virginia Raggi. Agora com a caneta da cidade nas mãos, a italiana anunciou o fim da candidatura pela Olimpíada.

A capital da Itália engrossa uma lista já considerável de cidades que se recusam a sediar os Jogos Olímpicos. Antes dela, Boston (Estados Unidos) e Hamburgo (Alemanha) desistiram da concorrência pela edição de 2024. Continuam na disputa Los Angeles (Estados Unidos), Paris (França) e Budapeste (Hungria). Isso acende – ou deveria acender – o sinal de alerta no Comitê Olímpico Internacional (COI): as pessoas começaram a descobrir o abusivo modelo olímpico.

Os responsáveis pela candidatura olímpica partiram para o ataque à prefeita após o anúncio da desistência. O perfil oficial da candidatura no Twitter passou a veicular imagens de ruas esburacadas, estações de metrô lotadas, italianos atrás dos classificados nos jornais à procura de empregos. Acompanhados da hashtag #RomaSemFuturo, os tuítes pregam o pessimismo: nenhum desses problemas será resolvido pelos Jogos Olímpicos.

#RomaSemFuturo: os entusiastas da candidatura de Roma para 2024 começaram a atacar a prefeita (Foto: Reprodução / Twitter)

Supor que a Olimpíada resolva problemas públicos tem o populismo rasteiro do qual brasileiros ouviram à exaustão até 2016.

A candidatura romana prevê um custo de € 5,3 bilhões. No câmbio atual seriam quase R$ 20 bilhões. É um erro – e agora as pessoas se dão conta – supor que esse será o valor final. Um estudo feito na Universidade de Oxford, em 2012, mostra que todos os Jogos Olímpicos desde 1960 sofreram com sobrepreços em relação às estimativas iniciais. Em média o aumento é de 250% após a inflação. O Rio de Janeiro, que gastou mais de R$ 40 bilhões, sabe disso por experiência. A estimativa na candidatura era de R$ 28,8 bilhões.

As contrapartidas aventadas por defensores da Olimpíada – políticos, dirigentes esportivos e empreiteiros – são questionáveis. As experiências olímpicas mais recentes de cidades como Sochi 2014 (Rússia), Londres 2012 (Reino Unido) e Pequim 2008 (China) mostram que o turismo desandou, os empregos gerados pela construção saíram caro e os custos, antes e depois do evento, extrapolaram e foram bancados com dinheiro público. O raciocínio de que o evento destrava investimentos em áreas como mobilidade urbana não para em pé: se uma cidade tem R$ 40 bilhões para gastar em infraestrutura, por que ela precisaria de um evento como pretexto para usá-los?

A desistência de Roma é uma reação natural a um modelo de negócio à beira do colapso. O COI, como faz a Fifa com a Copa do Mundo, absorve todos os ganhos financeiros dos Jogos e os usa para alimentar uma cadeia de dirigentes no mundo todo. Os custos ficam para as populações das cidades sedes. Conforme mais informações sobre prós e contras olímpicos foram disseminadas, essas pessoas começaram a questionar por que, num momento de economia bamba no mundo todo, precisam gastar tanto dinheiro com os luxos de dirigentes esportivos. Ou o COI encontra um novo modelo, no qual assuma algum gasto, ou passará por mais constrangimentos toda vez que algum prefeito atender o povo e disser: aqui, não.

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