Rio

Daqui a 50 anos, população de favelas terá menos idade que em outros pontos

Segundo projeções da prefeitura, percentual de idosos saltará dos atuais 16% para 36%

RIO — Daqui a meio século, a população carioca estará mais velha: o percentual de idosos saltará dos atuais 16% para 36%, segundo projeções divulgadas pela prefeitura. Em Copacabana, por exemplo, dois terços dos habitantes terão mais de 60 anos, enquanto apenas 4,1% serão crianças e adolescentes. A realidade nas favelas, no entanto, será diferente. Nas comunidades, estará a maior proporção de habitantes com menos de 15 anos. O estudo, feito por especialistas da Fundação Getulio Vargas e do IBGE, vai ajudar a prefeitura a elaborar um plano estratégico de longo prazo e mostra ainda que o número de habitantes encolherá, caindo de 6,5 milhões para 5,5 milhões.

INFOGRÁFICO: AS APROJEÇÕES DE COMO SERÁ A POPULAÇÃO

Para moradores e especialistas, o horizonte é preocupante nas favelas, porque nelas a infraestrutura de ensino, saúde, segurança e lazer é pior que nas demais áreas da cidade. Jorge Luís Santos Silva, de 18 anos, que vive na Rocinha, não conseguiu completar o ensino médio. E o que sabe sobre a realidade nas comunidades é suficiente para chegar à mesma conclusão que estudiosos.

— Se não houver políticas públicas que garantam uma melhor educação para crianças e jovens de comunidades carentes, o futuro será muito pior — diz Jorge.

Por problemas pessoais, ele parou de estudar no ano passado. Agora, não consegue nem vaga no ensino médio, nem emprego. Lutador de artes marciais desde os 5 anos, Jorge também não arranja patrocínio para sobreviver como esportista.


Pesquisa do IBGE mostra que daqui a 50 anos, dois terços dos moradores de Copacabana serão idosos e a maioria dos moradores das comunidades será jovem. Na foto, jovens secundaristas moradores da Rocinha. Foto de Marcia Foletto / Agência O Globo
Pesquisa do IBGE mostra que daqui a 50 anos, dois terços dos moradores de Copacabana serão idosos e a maioria dos moradores das comunidades será jovem. Na foto, jovens secundaristas moradores da Rocinha. Foto de Marcia Foletto / Agência O Globo

— As pessoas nos olham de forma diferente, não somos valorizados lá fora — afirma, acrescentando como vê a vida na Rocinha que tanto ama daqui a 50 anos. — Se continuar o descaso, eu vejo no futuro o que existe hoje: muita gente jovem no tráfico, muitas meninas jovens, de 13, 14 anos, engravidando. Então, daqui a 50 anos, se continuar do jeito que está, eu vejo mais mais confusão, mais guerra e menos paz.

A gravidez precoce que salta aos olhos do jovem é o que vai provocar o descompasso entre as taxas de fecundidade no asfalto e nas favelas. É o que revela o estudo “Projeção quinquenal da população residente no município do Rio”, desenvolvido pelos pesquisadores Kaizô Iwakami Beltrão, da Fundação Getulio Vargas, e Sonoe Sugahara, do IBGE, com base no Censo 2010 e nas taxas de mortalidade e fecundidade da cidade. De acordo com as projeções, seguindo uma tendência mundial, a população do país vai encolher a partir de 2040. No Rio, no entanto, onde a taxa de fecundidade hoje é a menor do Brasil, o encolhimento acontecerá dez anos antes, a partir de 2030. Além de nascerem menos, os cariocas vão viver mais tempo:

— Envelhecer não é ruim, é bom. O que precisamos nos preocupar é com envelhecer com qualidade — diz Kaizô.

Segundo ele, as projeções apontam tendências, que podem ser modificadas a partir de políticas públicas, por exemplo, que visem à melhoria da qualidade de vida da população:

— Algumas políticas públicas devem ser implantadas nos locais onde está a população-alvo. Por exemplo: os parques de ginástica para idosos não podem estar muito longe de onde eles moram. Já no caso de creches, instituições de ensino infantil e de atenção básica em saúde, elas não podem estar longe da moradia das crianças.

Presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos, o economista Sérgio Besserman Vianna também frisa que projeções são tendências que podem sofrer modificações. Segundo ele, o fato de mulheres de comunidades terem um maior número de filhos tem relação com a escolaridade.

— A taxa de fecundidade está relacionada com os anos de escolaridade. Se você, por exemplo, comparar a Rocinha com o Leblon, fazendo o corte da estatística pelos anos de escolaridade, verá que a taxa de fecundidade é idêntica. Ou seja, as mulheres da Rocinha têm muito mais filhos que as do Leblon. No entanto, aquelas com seis anos de escolaridade, por exemplo, têm o mesmo número de filhos, seja na Rocinha, seja no Leblon — diz Sérgio Besserman.

Para ele, o estudo é importante para a criação de políticas que possam transformar a realidade:

— São tendências demográficas que vão ser também influenciadas por políticas públicas, ou seja, há espaço para se trabalhar essa realidade. Copacabana é o melhor exemplo. Já é um bairro que sofreu transformações muito grandes em razão de sua população. Isso envolveu não só políticas públicas, como é o caso dos equipamentos de ginástica para idosos, mas também a própria sociedade. O comércio de Copacabana e a prestação de serviços se adaptaram para atender ao consumidor idoso. O bairro é o que tem a maior proporção de idosos. O Rio já é a cidade mais idosa do Brasil, e a tendência é que isso aumente. Copacabana é um excelente case, tanto para a reação da sociedade, quanto para as políticas públicas.

De acordo com o secretário-executivo de Coordenação de Governo da prefeitura, Pedro Paulo Carvalho Teixeira, o estudo faz parte do programa Visão Rio 500, que será lançado em março e tem por objetivo estabelecer metas de longo prazo para a cidade:

— As projeções revelam uma completa mudança geracional. Temos que fazer políticas públicas que compreendam esses fenômenos, aumentando o número de medidas para alcançar pessoas mais velhas, para as faixas de 80 e 90 anos. Temos que pensar em centros que façam não apenas o atendimento ao idoso incapacitado, mas que também tenham cursos profissionalizantes, para o idoso poder se reinserir no mercado, uma vez que essa população será muito mais ativa. Por outro lado, temos que investir mais na educação de crianças nas comunidades, melhorar cada vez mais as políticas públicas para os jovens.