Política

Juízes e MP criticam declaração de Gilmar, que acusou as categorias de chantagear políticos

Órgão afirma que ministro tem que apresentar provas de denúncias ou pediu desculpas

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, recebe o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (PMDB-RJ)
Foto: Ailton de Freitas/Agência O Globo
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, recebe o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (PMDB-RJ) Foto: Ailton de Freitas/Agência O Globo

BRASÍLIA – Associações de juízes e membros do Ministério Público protestaram nesta quarta-feira contra declaração do ministro Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), que acusou as categorias de chantagear políticos com ações de improbidade . A condenação nesse tipo de ação causa a inelegibilidade, como prevê a Lei da Ficha Limpa. Gilmar também disse que os profissionais praticam abuso de autoridade “às escâncaras”. Os comentários foram feitos durante um julgamento no TSE na noite de terça-feira.

Em nota, a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), que contabiliza cerca de 40 mil juízes, promotores e procuradores da República em todo o Brasil, disse que as declarações foram alardeadas “descompromissada e despersonalizadamente, manchando o nome das instituições representadas”.

No texto, as categorias argumentam que, se Gilmar tem elementos para sustentar essas acusações, precisa formalizá-las na Justiça. E, se não tem, “deve desculpas públicas à magistratura e ao Ministério Público, porque formulou imputações ofensivas a autoridades indeterminadas, sinalizando ao grande público que as ações de improbidade manejadas em detrimento de pessoas ligadas a determinado partido político foram necessariamente aventureiras, abusivas e – consequentemente – criminosas”.

A Frentas reúne entidades importantes, como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). As associações declararam “solidariedade aos juízes, promotores e procuradores de todo o país, cuja dignidade restou atingida, direta ou indiretamente, por tais afirmações despropositadas”.

Na sessão de terça-feira, Gilmar disse ainda que, se a interpretação da Lei da Ficha Limpa fosse mudada para ficar ainda mais rígida, como queriam alguns ministros, “gente do melhor quilate” estaria inelegível. O elogio foi usado para designar os tucanos José Serra, Pedro Malan e Pedro Parente. Enquanto isso, “ladravazes” continuariam soltos. As entidades também não gostaram do comentário.

“Uma vez mais, o ministro vale-se de ataques e afrontas, clivadas de frases de efeito, para criticar publicamente atos de ofício de outras autoridades públicas, imputar-lhes a prática de fatos definidos como crimes, promover sub-repticiamente o interesse de figuras públicas da cena político-partidária com quem tem estrita afinidade e, nesse ensejo, desrespeitar e desacreditar justamente as duas instituições da República que mais têm contribuído para desbaratar a corrupção endêmica disseminada por todo o país”, diz a nota.

Por fim, a Frentas recomenda que futuras manifestações do ministro sejam “mais serenas e responsáveis”. E lembra que os magistrados, especialmente se presidem um tribunal, têm o dever ético da urbanidade, da cortesia, da prudência, da dignidade, do decoro e do comedimento. A entidade também disse que, se Gilmar não tem acusação formal contra juízes e membros do Ministério Público, “poderá ser instado a responder pelos seus excessos verbais”

Em outra nota divulgada hoje, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) também repudiou as declarações de Gilmar . “Os juízes federais jamais se utilizam de suas prerrogativas para chantagear quem quer que seja, especialmente os integrantes do Poder Legislativo, com o qual baseiam suas relações no mais profundo respeito, tratando dos interesses institucionais com zelo, honestidade e seriedade”, diz o texto, que leva a assinatura do presidente, o juiz federal Roberto Veloso. A Ajufe também recomendou que, se Gilmar tiver alguma acusação contra um juiz, que especifique, sem críticas generalizadas.

Na nota, a Ajufe aproveita para elogiar a Lei de Ficha Limpa, lembrando que ela é fruto de uma intensa campanha popular em prol de maior rigor para as candidaturas e do combate à corrupção. Em declarações recentes, Gilmar disse que a lei é mal formulada e parece ter sido feita por “bêbados” e por “analfabetos”.