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Estado do Rio suspenderá pagamentos a fornecedores

Governo também ficará proibido de contrair empréstimos e de nomear novos funcionários

RIO - Com o descumprimento do limite para endividamento previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o estado anunciou nesta segunda-feira que não vai pagar a fornecedores em algumas áreas da administração — uma espécie de “moratória temporária”. A medida está prevista num decreto com uma série de ações para cortar despesas, que será publicado esta semana. O objetivo é tentar voltar ao patamar de gastos previsto na legislação. Entre as providências, o governo não vai autorizar novos pagamentos, por 30 dias, a prestadores de serviços em todas as secretarias, com a exceção das de Saúde, Educação e Segurança. Gestores de cada pasta, de acordo com a Secretaria de Fazenda, terão que fazer negociações com fornecedores para evitar a suspensão de serviços (na prática, ambas já vêm acontecendo).

O empresariado não reagiu bem ao pacote. Há um temor de calote do estado e de um aumento da carga tributária.

O governo pretende ainda devolver servidores cedidos pela União ou por prefeituras. Com isso, não precisará mais reembolsar os salários aos seus órgãos de origem.

O Rio também ficará proibido de contrair empréstimos e de nomear novos funcionários para cargos vagos.

Segundo o secretário de Fazenda, Gustavo Barbosa, as medidas serão reavaliadas em até 30 dias, quando poderão ser decididas novas ações para conter despesas e aumentar a arrecadação.

— Temos aí quatro quadrimestres para trazer esse índice para o normal — afirmou.

Barbosa admitiu que o estado já vem deixando de pagar a fornecedores e diz que a medida anunciada é inevitável:

“A gente já tem enfrentado um pouco de dificuldade para pagar aos fornecedores. Por isso, ficamos 30 dias. Temos que adotar um caminho de restrição orçamentária ”

Gustavo Barbosa
Secretário estadual de Fazenda

— Neste primeiro momento, a gente colocou essas medidas. Agora, o estado está limitando seus empenhos somente para o custeio de saúde, educação e segurança. A gente já tem enfrentado um pouco de dificuldade para pagar aos fornecedores. Por isso, fixamos 30 dias. Temos que adotar um caminho de restrição orçamentária.

CONTRATAÇÕES PROIBIDAS

Nesta segunda-feira, O GLOBO revelou que o Rio tem se endividado acima do limite de 200% da receita corrente líquida previsto na LRF. Os dados foram publicados num relatório das finanças do estado referente ao segundo quadrimestre de 2016. O documento também informa que as despesas com pagamento de salários, aposentadorias e pensões chegaram a R$ 23,426 bilhões, 48,01% de toda a arrecadação acumulada no período de setembro de 2015 a agosto de 2016 (R$ 48,793 bilhões). Com isso, aproximaram-se do limite máximo permitido pela LRF (49%) para gastos com pessoal no Poder Executivo.

Por causa disso, a LRF estabelece que, a partir de agora, o Palácio Guanabara está proibido de conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, salvo por determinação judicial, legal ou prevista em contrato. Também não podem ser criados novos cargos e aprovados planos de carreiras que aumentem despesas. O estado não poderá ainda contratar, exceto se for para reposição de servidores nas áreas de educação, saúde e segurança.

As medidas que serão regulamentadas em decreto já constavam de um anexo publicado no relatório fiscal desta segunda-feira. O objetivo do texto era “indicar medidas corretivas”. Mas citava como soluções encontradas pelo Executivo, nos últimos anos, um projeto de lei que o próprio governo retirou da Alerj (o nº 18/2016, conhecido como Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual, duramente criticado até pela base do Executivo na Casa), além de uma proposta de criação da Taxa Única de Serviços Estaduais, que foi revogada.

Entre outras medidas, o projeto de Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual transferiria para cada um dos poderes a responsabilidade previdenciária sobre seus inativos. As dificuldades financeiras se agravaram no estado, entre outros motivos, porque o Tesouro tem que cobrir o déficit do fundo Rioprevidência, responsável pelo pagamento de aposentadorias e pensões não apenas do Executivo, mas também da Alerj, do Tribunal de Justiça (TJ), do Ministério Público (MP) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

De acordo com o último relatório de governança do Rioprevidência (relativo ao segundo trimestre deste ano), apenas entre abril e junho, o estado teve que fazer um aporte de R$ R$ 2,6 bilhões para cobrir a folha do período (R$ 3,7 bilhões). Isso porque a arrecadação com a chamada contribuição patronal para as aposentadorias foi de apenas R$ 1,1 bilhão — o equivalente a 29,61% dos recursos necessários.

O agravamento da crise no estado provocou reação do empresariado. O presidente da Associação das Empresas de Engenharia do Rio de Janeiro (Aeerj), Luiz Fernando Santos Reis, disse que a situação, que era preocupante, agora é apavorante. Segundo ele, por falta de pagamento das faturas, quase todas as obras do governo estão paralisadas.

— Só estão sendo tocadas obras da Cedae, que têm recursos próprios, e algumas de contenção de encostas, por questão de segurança. O resto parou. São centenas de obras de manutenção de estradas, de escolas e de saneamento básico (exceto Cedae), por exemplo. O estado tem uma dívida com os empreiteiros que gira entre R$ 150 milhões e R$ 200 milhões — contou Reis.

Ainda de acordo com o presidente da Aeerj, empresas que tinham cem empregados hoje contam com cinco a dez:

— Nunca tivemos um nível tão alto de desemprego no setor. Com o término das obras da Linha 4 do metrô e da Olimpíada, de 25 mil a 35 mil pessoas ficaram desempregadas.

Por nota, a Fecomércio-RJ manifestou preocupação com a possibilidade de aumento da carga tributária. A entidade diz que “acredita na relevância dos princípios gerais que norteiam o relatório gerencial do governo”. No entanto, ressalta que “uma parte dessas diretrizes tem um viés arrecadador, onerando ainda mais a carga dos impostos sobre o setor do comércio de bens, serviços e turismo”. O segmento é hoje responsável por 40% do PIB do estado e tem mais de 1,9 milhão de trabalhadores.

MP DIZ QUE ESTÁ DENTRO DO LIMITE

Os outros poderes e órgãos do estado garantem que funcionam dentro dos limites de gastos com pessoal e que estão fora das medidas do novo decreto. O Ministério Público disse que “realiza seu exercício orçamentário considerando a crise existente no estado e já faz os contingenciamentos necessários”. Informou ainda que gasta com pessoal 1,65% da receita líquida do estado, segundo o último balanço, percentual inferior ao máximo de 2% fixado pela LRF.

Por e-mail, o presidente do TCE, Jonas Lopes, disse que, “como órgão autônomo, o Tribunal de Contas do Estado não é atingido por essas medidas. Além disso, ao longo dos últimos dois anos, o TCE-RJ vem tomando várias medidas de contenção de despesas, como, por exemplo, a não realização de concurso público e a não concessão do reajuste anual do funcionalismo em 2015 e 2016”.

O presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani (PMDB), afirmou que a Casa está muito abaixo do limite prudencial fixado pela LRF (1,684% das receitas correntes líquidas do estado). Segundo o último relatório quadrimestral da Assembleia, gastou-se 1,394% entre setembro de 2015 e agosto de 2016. O TJ, por sua vez, alegou que só hoje poderá fornecer as informações solicitadas.