Cultura Artes visuais

Cildo Meireles recria com crianças o ‘Desvio para o vermelho’

Ação no Parque Lage é inspirada em livro sobre arte para público infantil

“Desvio para o vermelho” no Instituto Inhotim (MG): objetos começam a ser recebidos nesta segunda-feira na EAV Parque Lage
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“Desvio para o vermelho” no Instituto Inhotim (MG): objetos começam a ser recebidos nesta segunda-feira na EAV Parque Lage Foto: Divulgação

RIO — Uma das mais icônicas obras da arte brasileira contemporânea, “Desvio para o vermelho”, de Cildo Meireles, será recriada no próximo domingo, dia 30, a partir do meio-dia, nas Cavalariças da Escola de Artes Visuais (EAV) do Parque Lage, com objetos doados por crianças. O próprio artista se encarregará de montar, com ajuda delas, o trabalho “Impregnação: em torno do Desvio”. “Impregnação” é o nome do primeiro ambiente da instalação, em que se acumulam móveis, obras de arte e objetos corriqueiros, todos na mesma cor (o trabalho tem ainda os ambientes “Entorno” e “Desvio”). Na última sexta-feira, a diretora da EAV, Lisette Lagnado, lançou a convocatória no site da escola. Os objetos podem ser entregues de segunda, dia 24, a sexta-feira, dia 28, das 10h às 16h, na secretaria da EAV.

É a primeira vez que Cildo trabalhará com crianças. Ele se diz animado com a ação, mas principalmente com a possibilidade de, através dela, poder ajudar a escola:

— Do meu ponto de vista, recriar o “Desvio” é uma tentativa de colaborar com o Parque Lage nesse momento. O local sempre foi uma coisa muito complicada, minha decisão obedeceu a essa necessidade de ser solidário com a EAV — diz ele.

A atividade encerra as Jornadas de Outubro, programa criado por Lisette para celebrar o Dia das Crianças e, como diz, “olhar para elas como uma potência”. Desde a rescisão (em março deste ano) do contrato do governo com a Oca Lage, organização social que administrava a EAV e a área verde do parque, o local tem sofrido as consequências da precária situação financeira do estado. A EAV ainda ficou desalojada durante a Olimpíada, quando o espaço foi alugado à Casa da Grã-Bretanha. Com a retomada do palacete, a diretora decidiu “dar um gás nos cursos” e mais atenção ao público jovem.

O livro que inspirou a ação no Parque Lage Foto: Reprodução
O livro que inspirou a ação no Parque Lage Foto: Reprodução

A esse desejo somou-se o lançamento na escola, no dia 12 de outubro, do livro “Arte brasileira para crianças” (ed. Cobogó). A publicação de Isabel Diegues, Marcia Fortes, Mini Kerti e Priscila Lopes lista cem artistas, sempre destacando uma obra e propondo atividades a partir de algumas delas. Foi quando Lisette, conversando com Isabel, vislumbrou a oportunidade de recriar o “Desvio”, uma das ações sugeridas pelas autoras aos pequenos leitores: “Tudo que é vermelho em sua casa pode estar morrendo de vontade de ficar junto. Ajude essas coisas a se encontrarem!”, diz um trecho do verbete.

— Essa questão do educativo é um problema que as instituições enfrentam para acolher um público leigo, despreparado. Mas aqui, na escola, temos a possibilidade de propor as atividades como um programa mesmo de ensino — diz a diretora.

Cildo começou a pensar no “Desvio” em 1967, mas acabou se envolvendo com outros projetos e só no início dos anos 1980 voltou a ele. A instalação, que além do ambiente “Impregnação” tem também os ambientes “Entorno” e “Desvio”, foi montada pela primeira vez no Museu de Arte Moderna do Rio, em 1984, depois de uma convocatória em jornais para obter os objetos — além de móveis, tapetes e eletrodomésticos, há obras doadas por artistas como Luiz Alphonsus e Tunga. Esta versão, que foi também mostrada no MAC de São Paulo em 1986 e, a convite do curador Paulo Herkenhoff, na Bienal de SP de 1998, está desmontada, em seu ateliê. O Instituto Inhotim tem uma segunda versão, permanente, realizada em 2006 com objetos e obras doados por amigos, como Vicente de Mello.

— Digo que essa primeira sala do “Desvio” é uma coleção de coleções — observa Cildo. — O armário é uma coleção de sapatos, blusas, roupas. A geladeira, de comidas, garrafas, embalagens. A escrivaninha, de itens de papelaria.

Também no próximo domingo, às 14h, será recriado, na Oca do Parque Lage, o “Labirinto” que Carlos Vergara apresentou em 1971 nos Domingos da Criação do MAM. A obra, na ocasião, foi efêmera. Agora, Lisette pretende mantê-la por algum tempo no espaço, para propor atividades no local.